Milhares de trabalhadores brasileiros estão utilizando sua própria casa como escritório ou uma extensão da empresa. Conhecido como "home office", ou trabalho à distância, esse tipo de atividade é cada vez mais recorrente no cotidiano dos brasileiros e das empresas nacionais e estrangeiras no país. É importante ressaltar que, mesmo trabalhando em casa, o empregado tem garantindo todos os direitos trabalhista e previdenciários.
E essa garantia está destacada no artigo 6º da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), lei que regula os direitos dos trabalhadores, que deixa claro que não existe distinção entre o trabalho dentro da empresa e o realizado em casa, desde que as relações de emprego sejam caracterizadas. Os direitos trabalhistas do empregado que trabalha em casa são salário; férias + 1/3 constitucional; anotação na carteira de trabalho; recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS); e 13º salário, entre outros previstos em normas coletivas e internas.
A especialista em Direito do Trabalho do escritório Baraldi Mélega Advogados Karla Guimarães da Rocha Louro afirma que não há diferenciação para as regras aplicadas no trabalho presencial àqueles prestados no sistema "home office". "A principal peculiaridade do home office é que o empregado realiza suas tarefas em domicílio; logo, em local distinto do seu empregador. A fiscalização deste empregado será concretizada por mecanismos informatizados, os quais são efetivos no mundo moderno e se equiparam aos meios pessoais e diretos de comando".
Apesar de ser uma modalidade de contratação reconhecida pela CLT, ainda não há legislação específica que regulamente o trabalho em home office. "Apesar disso, a empresa não poderá fazer distinção de funcionários que exerçam a mesma função, especialmente com relação ao salário. Por outro lado, o 'home office' obsta a concessão de alguns benefícios, tais como o vale-transporte, pois o funcionário não se locomove de sua casa para o trabalho", observa aadvogada Juliana de Oliveira Afonso, do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados.
E para que fique caracterizada a relação de trabalho entre o empregado e a empresa, de acordo com o advogado Diego Carvalho, sócio do Lapa Góes e Góes Advogados, é essencial que estejam presentes os seguintes elementos: o trabalhador ser pessoa física; a pessoalidade; a subordinação (responder a ordens da empresa e superiores); a onerosidade (remuneração); e não-eventualidade (o trabalho ser diário e contínuo). "A CLT estabelece que os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio", aponta o especialista.
O advogado também explica que o artigo 83º da CLT estabelece que é devido o salário mínimo ao trabalhador em domicílio, considerado este como o executado na habitação do empregado ou em oficina de família, por conta de empregador que o remunere.
"Mesmo em 'home office', a empresa tem o dever de disponibilizar condições adequadas de trabalho, sendo ainda responsável pelas normas de medicina e segurança do trabalho. Normalmente, neste sistema 'home office'", o trabalhador recebe celular, computador, mensalidade de internet paga, além da montagem de escritório. A doutrina entende que as despesas em decorrência da realização do labor devem ser arcadas pela empresa, pois os riscos do negócio devem ser suportados pelo empregador", orienta Diego Carvalho.
Previdência
E os trabalhadores em home office também garantem os mesmos direitos previdenciários decorrentes da relação de trabalho. A advogada Letícia Loures, do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, alerta que se "a relação de trabalho for nos moldes da CLT, com o devido registro em carteira, os direitos previdenciários serão os mesmos".
E nesse caso a empresa deve recolher a contribuição previdenciária e o empregado tem direito aos benefícios de auxílio-acidente, auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, por tempo de contribuição, idade, entre outros.
Letícia Loures informa que todos que trabalham em casa também podem se socorrer da Previdência em caso de acidente de trabalho. "O que vale é a prova de que o acidente aconteceu durante o desempenho das atividades, independentemente do local executado, e que ocasione a redução temporária da capacidade do empregado. Havendo a prova do acidente, o trabalhador ficará afastado até a alta dada pelo INSS".
A advogada destaca que o artigo 19º da 8.213/91 considera que o acidente de trabalho é aquele que ocorre pelo exercício do trabalho, independentemente onde ele é executado. "E, caso não tenha o registro em carteira, mas estão preenchidos todos os requisitos que configurem a relação empregatícia, haverá a necessidade inicial do reconhecimento do vínculo empregatício por meio de processo trabalhista e a consequente caracterização do acidente de trabalho", revela a especialista.
Controle e Justiça
Os especialistas destacam que os meios tecnológicos hoje permitem que empresa e empregados estejam conectados mesmo à distância e que o controle efetivo do trabalho, gastos e eventuais acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais são totalmente passíveis de monitoramento e controle de ambas as partes. "Por meio de acesso remoto e programas específicos, as empresas podem controlar a jornada do empregado, incluindo o horário de intervalo para descanso e refeição, por exemplo", aponta o advogado Diego Carvalho.
O advogado informa também a Justiça brasileira vem considerando a possibilidade de indenização empresarial pelos gastos pessoais e residenciais efetivados pelo empregado no exercício de suas funções empregatícias no interior de seu "home office". "Entretanto, é necessária a comprovação da existência de despesas adicionais realizadas em estrito benefício do cumprimento do contrato. E, havendo pagamento pelo empregador de valores realmente dirigidos a subsidiar despesas com telefonemas, gastos com informática e similares, no contexto efetivo do 'home office', esses valores não têm pagamentos natureza salarial, mas meramente instrumental e indenizatória", explica.
A advogada Karla Louro ressalta que as empresas que têm funcionários em "home office" contam com plataformas informatizadas de comando para possibilitar o controle de jornada de trabalho, como por exemplo acesso aos sistemas internos e reuniões online.
"Porém, o fato de o trabalhador prestar serviços em domicílio, por si só não gera o dever da empresa de custear gastos com energia elétrica, internet, telefone etc., pois tais custos não são considerados de uso exclusivo das atividades comerciais do empregador e inviável distinguir os custos com o serviço prestado e a própria habitação do trabalhador".
"Entretanto, a jurisprudência admite o ressarcimento de despesas ao empregado na medida em que restar demonstrada a existência de determinado custo apenas em razão do trabalho", diz Karla Louro.
A especialista observa que uma discussão polêmica é a relativa ao pagamento de horas extras. "Não há diferenciação para as regras aplicadas no trabalho presencial àqueles prestados no sistema 'home office'. Logo, caso seja extrapolada a jornada de trabalho, o empregador tem o dever de remunerar o empregado à respectiva hora extra".
"Importante ressaltar que a exceção legal quanto aos empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho também se aplica aos empregados em 'home office'. Logo, caso este empregado não sofra controle de jornada ou ela seja livremente organizada pelo trabalhador, não haverá direito ao recebimento de horas extras".
E advogada Juliana de Oliveira Afonso reforça que as principais discussões referentes ao "home office" na Justiça brasileira englobam o pagamento de horas extras, ante a existência ou não do controle de jornada. "Além disso, há diversas discussões quanto a compensação dos custos domésticos extras e pela modificação do contrato de trabalho interno para externo", finaliza ela.
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