Economia

PREVIDÊNCIA TOTAL – Os caminhos para a desaposentação

O sonho de poder desfrutar do momento da chegada da aposentadoria é uma das metas da maioria da população brasileira.
Porém, grande parte dos trabalhadores brasileiros não consegue se aposentar com um benefício que tenha o valor necessário para manter o padrão de vida e a renda familiar. Esse é um dos motivos pelos quais muitos aposentados estão lutando na Justiça pela desaposentação, que é a renúncia da aposentadoria atual para a troca por uma nova aposentadoria, com um benefício de renda mensal maior.
 
A desaposentação pode ser requisitada pelo segurado da Previdência Social que se aposenta, continua trabalhando e contribuindo para a Previdência Social.
 
Os especialistas em Direito Previdenciário ressaltam que a desaposentação não é uma lei e sim uma tese jurídica. “É uma tese, que pode ser requerida através de uma ação judicial. Trata-se da possibilidade de renunciar à aposentadoria que o segurado atualmente recebe para que possa computar o tempo de trabalho e de contribuição realizados após a aposentadoria, para obter um novo benefício mais vantajoso”, define a mestre em Direito Previdenciário e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBPD), Adriane Bramante.
 
A advogada de Direito Previdenciário da Advocacia Marcatto, Anna Toledo, defende que as regras atuais que regem os benefícios dos aposentados pelo Instituto Nacional do Seguro Social são demasiadamente injustas e, por isso, surgiu a tese da desaposentação.
 
“As sistemáticas atuais de cálculos dos benefícios do INSS prejudicam os segurados, obrigando deste modo os trabalhadores a permanecerem no mercado de trabalho, mesmo depois da aposentadoria, como forma de garantir o seu sustento, bem como o de sua família, de forma digna. E essa permanência no emprego faz com que o trabalhador continue suportando os descontos previdenciários. Portanto, nada mais justo, que obtenham uma vantagem futura, pelas regras da contrapartida, pois quem financia a Seguridade Social tem de ter direitos a benefícios. A desaposentação vem resolver isso”, afirma.
 
Trocar o benefício vale a pena?
 
A única maneira de solicitar a desaposentação é através de uma ação judicial e, segundo os especialistas, é preciso analisar caso a caso para verificar se vale a pena a troca do benefício.
 
“Vale a pena quando o segurado trabalhou após a aposentadoria e continuou contribuindo com a mesma média que antes. O mais comum é que o segurado tenha trabalhado mais tempo após a aposentadoria e, com esse tempo a mais, a nova aposentadoria será de valor maior, porque o fator previdenciário será maior.  De nada adianta ter contribuído mais tempo, se a contribuição diminuiu”, explica a presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBPD), Jane Berwanger. 
 
De acordo com o advogado Danilo Pieri Pereira, do Baraldi-Mélega Advogados, a desaposentação vale mais à pena para os beneficiários mais idosos, com maior tempo de aposentadoria e maior tempo de contribuição. “O cálculo é um pouco complexo e deve ser solicitado quando o segurado manteve ou elevou as contribuições à Previdência Social, depois de se aposentar”, pontua.
 
Para Caio Ferrer, advogado da Associação Brasileira de Benefícios aos Aposentados, Pensionistas e Servidores Públicos (ASBAP), os segurados que iniciaram a aposentadoria antes de 1999 não terão bons resultados no cálculo. “Nesse ano foi criado o fator previdenciário, que é um cálculo aritmético que reduz a aposentadoria daqueles que se aposentam mais jovens. O cálculo leva em conta o dado do IBGE sobre a expectativa de vida, reduzindo o benefício dos que em tese viverão por muito mais tempo”, diz.
 
Segundo os especialistas, não existe o risco de o segurado perder ou deixar de receber a sua aposentadoria ao requisitar judicialmente a desaposentação. “Esta renúncia não gera nenhuma perda. Pelo contrário, só é finalizado o recebimento da antiga para iniciar uma nova, com valores mais vantajosos. O segurado não deixa em nenhum momento de receber seu benefício previdenciário, ou seja, não há nenhuma interrupção”, alerta Leandro Vicente,  advogado da Associação dos Beneficiários da Previdência Social do Rio de Janeiro (ABEPREV).
 
Divergência 
 
Existe uma divergência entre os juristas sobre a possibilidade dos segurados do Regime Geral da Previdência Social requisitarem judicialmente a troca da aposentadoria. Alguns apontam que todos os segurados (aposentados por idade, por tempo de contribuição, por invalidez e aposentadoria especial) podem requisitar a desaposentação. Já outros defendem que os aposentados por invalidez, por não poderem voltar a trabalhar e, consequentemente, contribuir com INSS, não podem pensar em se desaposentar. 
 
“Podem se desaposentar todos aqueles que estão aposentados. Geralmente a maioria que busca desaposentar é aquele por tempo de contribuição ou por aposentadoria especial. Tudo dependerá de um cálculo prévio e deve ser feito com muito cuidado e responsabilidade”, crava a mestre em Direito Previdenciário, Adriana Bramante.  
 
O professor de Direito Previdenciário, Rodrigo Sodero, alerta que o segurado em gozo de aposentadoria especial é proibido pela legislação de continuar trabalhando em atividade especial após a aposentadoria, sob pena de cancelamento do benefício e devolução dos valores indevidamente recebidos. “Este segurado precisa ter muito cuidado em requisitar a desaposentação”, afirma. 
 
Já o professor e autor do livro “Desaposentação – Novas Perspectivas Teóricas e Práticas", Marco Aurélio Serau Junior, avalia que o aposentado por invalidez não tem o direito. “O aposentado por invalidez não pode voltar ao trabalho, então não poderá realizar novas contribuições previdenciárias. Assim, não poderá requisitar a desaposentação”, analisa. 
 
Troca de regime 
 
Adriana Bramante revela que há também a possibilidade de se desaposentar de um regime para se aposentar por outro regime. “É o caso, por exemplo, de um segurado do INSS que se aposentou e prestou um concurso, vinculado ao Regime Próprio de Previdência Social, com renda bem maior. Ele pode renunciar à aposentadoria do INSS para levar todo esse tempo do regime geral para o regime próprio, onde atualmente está vinculado, e se aposentar por ele”.
 
 Milhares de segurados aguardam decisão do STF
 
A desaposentação não possui lei que a regule e foi, como já dito anteriormente, uma tese criada a partir de um entendimento de juristas. A sua aplicação prática vem sendo consolidada por algumas decisões de tribunais federais e Cortes superiores brasileiras. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recente decisão, confirmou o direito do aposentado de renunciar ao benefício para requerer uma nova aposentadoria sem devolver o dinheiro que recebeu da Previdência Social. Porém, esse entendimento não é vinculante, ou seja, apenas orienta os tribunais a julgarem dessa forma.
 
Por esse motivo, milhares de segurados que possuem casos tramitando na Justiça aguardam uma decisão do Superior Tribunal Federal (STF).  O que está em discussão é a inconstitucionalidade do artigo 18, parágrafo 2, da Lei 8.213/91 – Lei da Previdência Social -, que prevê ser apenas devido ao segurado aposentado que volta a contribuir salário-família e reabilitação profissional. A expectativa é que o julgamento, que será o divisor de águas do tema, seja realizado ainda este ano. O julgamento pelo STF pacificará (ou não) o direito à desaposentação. 
 
“Esperamos que a decisão do STF aconteça em breve porque muitos processos estão no aguardo da posição. E esperamos também que o Supremo siga na mesma linha dos Tribunais Regionais e do STJ, já que é muito injusto o segurado continuar contribuindo e não ter nenhuma retribuição”, observa a presidente do IBPD, Jane Berwanger. 
 
Os ministros do Supremo irão decidir no caso concreto, ou seja, diante do Recurso Extraordinário 661256, sobre a possibilidade de o segurado do INSS ter direito a eleger, com fundamento no direito adquirido, benefício mais vantajoso, desde quando preenchidos os requisitos mínimos para a aposentação.
 
“Sou intensamente otimista quanto a essa decisão da nossa Suprema Corte. A decisão era originalmente de relatoria do ministro Carlos Ayres Britto, que se aposentou. E deixou para o ministro Luís Roberto Barroso. Considerando a linha de pensamento do ministro Barroso, temos mesmo de estar otimistas, pois tudo indica que seu relatório será favorável”, aposta Caio Ferrer, advogado da ASBAP.
 
O relator do recurso no Supremo, Luís Roberto Barroso, sinalizou que “em relação aos aposentados, é preciso dimensionar o proveito almejado, a possibilidade de melhoria nas condições de vida de parcela vulnerável da população e a possibilidade de caracterização da desaposentação como um direito social fundamental”.  
 
A advogada Anna Toledo também estima que a decisão seja favorável aos aposentados. “A Corte Suprema deverá caminhar no mesmo sentido da decisão do STJ que reconheceu o direito a renúncia da aposentadoria por uma mais vantajosa. A decisão proferida pelos Ministros do STJ é irretocável”, aposta.  
 
Impacto 
 
No Congresso, o assunto foi enterrado após a rejeição do projeto de lei (PLS 91/10), de autoria do senador Paulo Paim, que regulamentaria o tema. Na visão de Paim, o direito à desaposentação “é um instituto forte no combate ao famigerado fator previdenciário”. 
 
Já o Poder Executivo teme o impacto da medida nos cofres da Previdência Social. A alegação do Palácio do Planalto é que permitir a troca de benefício causaria um rombo de R$ 70 bilhões, em 20 anos. Agora, basta aguardar o retorno do tema à pauta do STF para a definição dos caminhos da desaposentação.
 
Mais informações www.previdenciatotal.com.br
 
 

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