O sargento Fábio Henrique Neves buscava um suspeito na zona rural de Cruzeiro, cidade a 230 quilômetros da capital paulista, em direção ao Rio, quando foi baleado. Aos 48 anos, 27 deles dedicados à Polícia Militar, o policial e pai de cinco filhos recebeu atendimento na Santa Casa da cidade, mas não resistiu e morreu. O autor do disparo, contra quem já havia um mandado de prisão a ser cumprido por um crime anterior, foi perseguido e morto em confronto na mesma ocorrência, segundo a PM.
A morte do sargento Neves aconteceu em 13 de junho de 2020 e foi um dos crimes que mais chamaram a atenção em uma região do Estado onde os indicadores de violência se destacam negativamente. A cidade de Cruzeiro, de 82 mil habitantes, tem os maiores indicadores de homicídio do Estado, em números proporcionais. E a região de São José dos Campos representa a área onde esses crimes ocorrem com mais frequência, em casos não raramente relacionados à presença do tráfico de drogas e do crime organizado.
Uma análise feita pelo Instituto Sou da Paz, e divulgada com exclusividade pelo <b>Estadão</b>, mostra que a quantidade de assassinatos registrados em 2020 cresceu em seis das 12 grandes regiões de São Paulo. O aumento foi sentido em quase metade (48,2%) das médias e grandes cidades paulistas. Em outras duas grandes áreas, o indicador permaneceu estável e em quatro regiões os registros de crimes de homicídio doloso e latrocínio (roubo seguido de morte) tiveram queda.
A análise identifica com maior clareza as áreas mais problemáticas do Estado, cujo indicador geral de homicídios em 2020 teve a primeira alta (4,1%) após sete anos seguidos de queda. O Sou da Paz, por meio do Índice de Exposição à Criminalidade Violenta (IECV), observa os indicadores registrados em cidades com mais de 50 mil habitantes, assim como nas chamadas grandes regiões por meio dos Departamentos de Polícia do Interior (Deinter). O crescimento nos registros chama a atenção em um ano marcado pelos efeitos da pandemia de covid-19.
O mais recente dado do IECV Vida, que leva em consideração registros proporcionais de homicídios e latrocínios, mostra aumento desses crimes em metade dos Deinter. A alta mais acentuada (28,5%) ocorreu no Deinter 4, com sede em Bauru. Na sede, por exemplo, os 27 homicídios do ano passado fizeram com que a cidade retornasse a um patamar de violência que não era visto desde 2015. Em 2019, aconteceram 16 casos.
A alta nas mortes nas grandes regiões se repetiu nas áreas de Piracicaba (23,3%), Araçatuba (11,5%), São José dos Campos (10,7%), São José do Rio Preto (6,8%) e na área policial da Grande São Paulo (12%). Os registros permaneceram estáveis ou com leve alta na capital e em Sorocaba. Os números caíram nas regiões de Presidente Prudente, Ribeirão Preto, Santos e Campinas. A área de São José dos Campos, que já era considerada a mais violenta, manteve o posto em 2020 e viu os números piorarem.
<b>Motivação</b>
A diretora executiva do Sou da Paz, Carolina Ricardo, cobra uma análise mais aprofundada do governo paulista sobre a motivação dos homicídios. "O que a gente consegue dizer é que é possível que tenha havido um aumento da violência interpessoal (conflitos que não decorrem do crime organizado nem da disputa pelo tráfico, por exemplo), a partir dos tensionamentos gerados pela pandemia, que pode ter sido um catalisador desses conflitos."
Ela afirma que não dá para deixar de observar as dinâmicas do crime organizado, no ano em que o prejuízo econômico foi generalizado. "Logo, o uso de força para acertar contas pode estar presente. É preciso um chamamento às autoridades para que cada um dos homicídios tenha a resposta devida e se entenda o que estava por trás", disse.
"Não podemos permitir que a tendência de alta se consolide", acrescentou Carolina. Procurada, a Secretaria da Segurança Pública disse reforçar a atuação nas áreas mais críticas.
Os pesquisadores identificaram uma recorrência nos municípios mais expostos à violência, ou seja, locais onde ano após ano os indicadores continuam a apontar registros elevados. A diretora executiva destaca duas medidas para atacar o problema: controle de armas e investigação dos casos. "O fácil acesso a armas e baixa resposta do Estado criando impunidade são dois fatores importantes no aumento de mortes. Observar os municípios onde essa estatística tem mais crescido pode levar a um trabalho específico."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>