Retomada dos treinos durante a pandemia não é consenso no meio do futebol

Embora o governo federal tenha sinalizado que pretende liberar o retorno do futebol brasileiro em breve, clubes, dirigentes, entidades e federações estaduais não estão em consenso sobre essa ideia. Se para alguns a pandemia do novo coronavírus deve ser deixada para trás e é o momento de voltar aos treinos nos próximos dias, para outros ainda é preciso ter um pouco mais de paciência. Os times estão de férias coletivas até o fim de abril e devem se reapresentar no início de maio.

Na segunda-feira o secretário de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério da Economia, Carlos da Costa, disse que jogos de futebol poderão ser retomados com portões fechados "em breve". A declaração aumentou a expectativa de federações estaduais que já se movimentavam para conseguirem retomar o calendário dos campeonatos locais. Santa Catarina e Paraná, por exemplo, enviaram aos respectivos governadores o pedido para os clubes serem autorizados a voltar aos treinos.

A CBF tem realizado reuniões com clubes, federações e médicos para elaborar uma cartilha de cuidados. A postura da entidade é mais de cautela e o objetivo é se ter uma validação de saúde pública antes de retomar competições. A CBF já até entrou em contato com o Ministro da Saúde, Nelson Teich, sobre o tema. "Existe um pedido para avaliar o retorno de jogos sem público, da CBF. Isso é uma coisa que estamos avaliando", disse Teich. A preocupação das equipes é principalmente com o prejuízo causado pela paralisação do calendário.

Mas pelo Brasil vários dirigentes têm mostrado posições firmes de que o futebol deve voltar o quanto antes. O Goiás divulgou até o detalhamento do formato dos treinos. As atividades voltam em maio, com os jogadores divididos em grupos pequenos. O rival, Atlético-GO, também quer promover a volta do elenco na sexta-feira. "Vamos parar de sensacionalismo e de achar que não se pode fazer nada. É preciso entender que o futebol é um meio de pessoas saudáveis, então vamos ter condições de enfrentar essa pandemia", disse ao Estado o presidente do clube, Adson Batista.

Uma outra equipe com posição favorável à retomada é o Flamengo. "Certamente nós vamos voltar. Estamos chegando perto desse momento, que todos aguardam. Estamos tomando todas as medidas de segurança para preservar os atletas. Brevemente, vamos retomar os treinos, jogos com portões fechados e jogos com torcida", afirmou o vice-presidente geral e jurídico Rodrigo Dunshee.

No Paraná, a federação local é uma das articuladoras do retorno. "O futebol precisa ganhar fôlego com o retorno dos Estaduais em maio. Isso é importante para ajudar o calendário da CBF. Vamos tomar as precauções necessárias. Esperamos que nos próximos dias o governo estadual nos libere", disse o presidente da Federação Paranaense de Futebol, Hélio Cury.

Nos bastidores, dirigentes e clubes consideram que a troca recente no Ministério da Saúde vai mudar o entendimento sobre os protocolos médico para o retorno dos times aos treinos. Há um entendimento de que a chegada de Teich vai significar em normas mais maleáveis do que as aplicadas pelo antecessor, Luiz Henrique Mandetta.

CAUTELA – A Federação Paulista de Futebol (FPF) analisa o cenário de forma diferente. A entidade tem produzido o protocolo médico com a ajuda dos clubes e avisa que só vai permitir o retorno dos times aos treinos quando tiver a total liberação de autoridades municipais, estaduais e federais.

No Ceará, a federação estadual prefere esperar mais um pouco do que pagar o preço pela ansiedade. "É melhor ficarmos mais uns dias em casa do que voltar a treinar, ter mais casos de coronavírus e depois ter uma nova quarentena", afirmou o presidente da Federação Cearense, Mauro Carmélio. "Eu tenho certeza que a CBF e os clubes vão tentar um retorno responsável, seguro e pautado em orientações do Ministério da Saúde", comentou o presidente do Fortaleza, Marcelo Paz.

Em Pernambuco, o Sport defende ser necessário voltar a jogar apenas quando várias autoridades estiverem de acordo sobre essa questão. "É uma decisão que um presidente de clube não pode tomar individualmente e sim aguardar que haja um indicativo do Ministério da Saúde e em consonância com as secretarias de saúdes dos Estados", afirmou o presidente do clube, Milton Bivar.

Segundo médicos infectologistas consultados pelo Estado, o melhor é não se pensar em futebol agora, mesmo que seja apenas para se voltar aos treinos e fazer jogos com os portões fechados. "Não sabemos ainda se atingimos ou não o pico de transmissão. Os números são crescentes, a cada dia aumenta a quantidade o casos novos e óbitos. Se a pandemia continuar mostrando números ascendentes, seria irresponsável uma retomada do futebol", explicou o professor da Unesp Alexandre Naime.

Outro infectologista, Marcelo Otsuka, afirma que promover qualquer retorno do futebol neste momento é precoce. "É difícil dizer se o Brasil está preparado para a retomada do futebol. Hoje, a quantidade de envolvidos para a realização de uma partida, é muito maior que 22 jogadores e isso pode representar um risco para as pessoas", explicou o médico, que atua como coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

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