Depois da abertura de uma investigação contra o presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro, integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF) avaliam haver espaço para uma "manobra" interna, com o objetivo de impedir que o caso seja herdado pelo sucessor do ministro Celso de Mello, decano da Corte, destaca o jornal <b>O Estado de S. Paulo</b>. Relator do inquérito sobre as acusações de interferência política de Bolsonaro na Polícia Federal, Celso deixa o Supremo em novembro, abrindo a primeira vaga para indicação do presidente da República. Tanto Bolsonaro quanto Moro são investigados no caso.
Em uma decisão de 17 páginas – mesmo número usado por Bolsonaro na eleição de 2018 -, o decano observou que o presidente "também é súdito das leis" e apontou a possibilidade de "responsabilizá-lo, penal e politicamente, pelos atos ilícitos que eventualmente tenha praticado no desempenho de suas magnas funções". Uma das vozes mais contundentes do STF em defesa da Constituição e contra os excessos cometidos pelo Palácio do Planalto, Celso completa 75 anos em 1º de novembro, quando se aposenta compulsoriamente.
Bolsonaro já manifestou a vontade de indicar um nome "terrivelmente evangélico" para a vaga de Celso, que se tornou alvo de pedido de impeachment e foi bombardeado por setores conservadores pelo voto de 155 páginas no qual defendeu a criminalização da homofobia. Um dos favoritos para a vaga do decano é André Mendonça, que acaba de assumir o Ministério da Justiça.
Após Celso autorizar a abertura de inquérito para investigar as acusações de Moro, a Polícia Federal terá um prazo de até 60 dias para ouvir o ex-juiz federal da Lava Jato. Na prática, o caso terá seis meses para ser conduzido sob a batuta do magistrado, antes que ele deixe o tribunal. Se o inquérito não for concluído até lá, porém, o sucessor de Celso pode herdar a apuração e os demais processos do gabinete. Dessa forma, um ministro escolhido por Bolsonaro deve acabar assumindo um inquérito que investiga justamente o atual ocupante do Planalto.
<b>Mudança</b>
Segundo o <b>Estado</b> apurou, ao menos três ministros do STF avaliam que, para impedir uma situação dessas, há margem para redistribuição do inquérito, ou seja, eventual mudança de relatoria, antes que o indicado de Bolsonaro assuma uma vaga na Corte.
Para um integrante do Supremo, "logo, de início, tem-se campo para a redistribuição" do caso para um novo relator. Outro ministro viu semelhança com a situação enfrentada pelo Supremo em 2017, quando o então presidente Michel Temer escolheu Alexandre de Moraes para ocupar a cadeira de Teori Zavascki, morto em acidente aéreo.
Na época, os processos da Lava Jato, que estavam com Teori, não foram herdados por Moraes, mas, sim, encaminhados para o gabinete de Edson Fachin após sorteio eletrônico.
Essa manobra foi feita internamente pelo STF como sinalização de que as investigações do bilionário esquema de corrupção na Petrobrás ficariam preservadas e blindadas de qualquer interferência política. Só depois que Fachin foi definido como novo relator da Lava Jato é que Temer oficializou a indicação de Moraes para a vaga de Teori.
Na avaliação de um integrante da cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR), o Supremo poderia repetir as movimentações agora, "com elegância".
A estratégia talvez não seja necessária, caso as investigações terminem antes da saída de Celso. Para o ministro Gilmar Mendes, a apuração pode ser concluída em três ou quatro meses, ou seja, ainda sob a relatoria do decano. "São depoimentos que podem ser colhidos rapidamente. Não me parece algo que exija perícias, extremamente complicado, de modo que pode ser que em 90, 120 dias isso já esteja concluído", disse o ministro, ao participar de transmissão ao vivo.
"É preciso esperar essa investigação para qualquer juízo e oxalá que ultrapassemos essa crise sem maiores consequências", afirmou Gilmar.
Integrantes do STF ouvidos pelo jornal apontam que as acusações fragilizam o presidente da República, mas minimizam as chances de a investigação levar à abertura de uma ação penal, por não identificarem até agora elementos robustos contra Bolsonaro. Aalém de troca de mensagens, o ex-ministro da Justiça possui áudios que devem ser entregues aos investigadores.
Caso as acusações de Moro contra o presidente sejam confirmadas, e a Procuradoria-Geral da República (PGR) denuncie o presidente da República, o Supremo dependerá de um aval da Câmara dos Deputados para dar prosseguimento ao caso.
Durante o mandato de Temer, os deputados federais barraram, por duas vezes, denúncias apresentadas contra o emedebista pelo então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>