Dois meses após massacres no Amazonas e em Roraima, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou um grupo de trabalho para apurar as condições dos presídios da região Norte do País, que terá 30 dias para apresentar um relatório final com recomendações a serem adotadas pelo CNJ.
No decreto de criação do grupo Grupo Especial de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Prisional da Região Norte do Brasil (GEMF), publicado nesta terça-feira, 7, a ministra Cármen Lúcia, presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal, afirmou que as “atrocidades cometidas” em janeiro “impõem inspeções, apuração de responsabilidades e adoção de medidas preventivas e repressoras para evitar novas práticas”.
Ela assinalou “ser imperativo e urgente a apuração das responsabilidades daqueles que, por ação ou omissão, ensejaram, permitiram ou contribuíram para os crimes praticados nas unidades prisionais”. “O GEMF poderá propor ao Conselho Nacional de Justiça a adoção de providências necessárias ao perfeito esclarecimento dos crimes apurados nas unidades prisionais da Região Norte do Brasil nos últimos 90 dias e à responsabilização das autoridades e agentes públicos envolvidos nos atos delituosos, incluídos os particulares que, de forma direta ou indireta, permitiram ou induziram tais práticas, encaminhando aos órgãos competentes os dados chegados a seu conhecimento para a adoção das providências legais cabíveis”, diz Cármen Lúcia no decreto.
O grupo terá a atribuição de acompanhar as inspeções das unidades prisionais dos Estados, feitas por juízes, “em especial nas unidades do Norte do Brasil indicadas pelos Tribunais de Justiça como dotadas de problemas maiores”. E deverá propor “providências relativas ao cumprimento das penas dos condenados ou os julgamentos de réus presos, dando suporte aos juízes competentes para melhor condição dos que dependam de providências especiais, materiais ou administrativas, estabelecendo fluxograma em conjunto com os juízes para o pronto julgamento dos casos pendentes”.
Entre problemas apontados pela ministra, já no decreto, estão o fato de que alguns Estados delegaram a empresas particulares as atividades internas em unidades prisionais sem dar “conhecimento destes contratos ao Conselho Nacional de Justiça ou aos Juízes e Tribunais competentes”.
Outro ponto é que, em 2010 e 2013, após mutirões carcerários na região, o conselho determinou providências, mas o cumprimento não foi informado ao CNJ para avaliação de resultados. Integram o grupo Maria de Fátima Alves da Silva, juíza auxiliar da Presidência do CNJ e coordenadora do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, Rogério José Bento Soares do Nascimento, conselheiro do CNJ, Renato De Vitto, assessor-chefe do DMF/CNJ, Tatiane da Costa Almeida, secretária de Segurança do CNJ, além de Valdetário Andrade Monteiro, representante da Ordem dos Advogados do Brasil no CNJ.
Cármen Lúcia ressalvou que o GEMF irá “atuar nos limites das competências constitucionais do Conselho Nacional de Justiça”. O CNJ é responsável por fiscalizar a atuação de juízes, mas não pode interferir diretamente no Executivo. Segundo o CNJ, a ideia de criação do GEMF nasceu em 5 de janeiro, quando Cármen Lúcia voltou da visita que fez a Manaus para uma reunião de emergência com sete presidentes dos Tribunais de Justiça da Região Norte – Amazonas, Pará, Acre, Rondônia, Tocantins, Roraima e Amapá – além do presidente do Tribunal do Maranhão, logo após a rebelião no maior presídio de Manaus. Mais de 100 pessoas morreram em janeiro em presídios do Brasil.
Dados
No fim de fevereiro, o CNJ divulgou números sobre o sistema prisional nacional, com base nos dados enviados pelos presidentes dos Tribunais de Justiça de todo o Brasil. Segundo o balanço do CNJ, existem 654.372 presos no Brasil, dos quais 221.054 – um terço do total – são provisórios.
O levantamento mostrou que o tempo médio da prisão provisória no Brasil é de um ano e três dias. O balanço aponta também que a proporção de presos provisórios nos Estados oscila entre 13%, caso do Amazonas, e 82%, caso do Sergipe. São Paulo tem o terceiro índice mais baixo: 15%.
A iniciativa do levantamento partiu do CNJ, dias após as mortes no Amazonas e em Roraima, em janeiro, diante da constatação de que não haviam números atualizados da quantidade de presos no Brasil. O último balanço, do fim de 2014, feito pelo Departamento Nacional Penitenciário (Depen), do Ministério da Justiça, apontava um total de 607.731 presos no Brasil – 7% a menos do que o agora divulgado pelo CNJ.
O levantamento é uma espécie de base para a futura realização do Censo penitenciário nacional, que o CNJ planeja executar com o apoio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, do Exército Nacional e da Pastoral Carcerária.