A Assembleia Legislativa de Alagoas declarou em 2010 o triplo de servidores do que realmente possuía para manter um esquema de desvio de verbas por meio de funcionários fantasmas e até 220 beneficiários do Bolsa Família. As informações foram reveladas pela Operação Sururugate, que fez buscas e apreensões na Diretoria Financeira e de Recursos Humanos da Assembleia Legislativa de Alagoas.
Naquele ano, o Legislativo estadual mantinha junto à Caixa Econômica Federal, que gere as contas dos servidores da AL, o número de 2400 funcionários. Perante o Ministério do Trabalho, contudo, foi constatado que a assembleia possuía, de fato, 800 servidores em sua folha de pagamento.
As disparidades, segundo o superintendente regional da Polícia Federal em Alagoas Bernardo Gonçalves de Torres se mantiveram durante todo o período investigado, de 2010 a 2013. Neste tempo, afirma, a folha de pagamento da AL ficou em torno de R$ 100 milhões.
“De acordo com as informações prestadas pela assembleia ao Ministério do Trabalho essa folha era bem menor, de R$ 40 milhões, por exemplo”, afirma o delegado, explicando que foi a partir destas disparidades que as investigações avançaram e a CGU realizou uma auditoria com os bancos de dados do governo federal sobre beneficiários do Bolsa Família e outros programas sociais.
A operação deflagrada nesta quinta-feira, 30, foi autorizada pelo Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL) e envolve nove deputados estaduais e um ex-deputado que teriam se beneficiado do esquema. O processo, contudo, tramita em sigilo e os nomes não foram divulgados.
De 2010 a 2013 foi constatado, por exemplo, pagamentos da Assembleia a pessoas cadastradas em programas sociais do governo federal, como o Bolsa Família, somaram R$ 15 milhões.
Ao todo, de acordo com o delegado Torres, foram constatados 220 beneficiários do Bolsa Família vinculados à Assembleia neste período. “Se a pessoa recebe benefícios do Bolsa Família, obviamente não pode ser funcionário da Assembleia, onde eles recebem salários altos, de R$ 10 mil até R$ 17 mil”, disse.
Deste número, foi feita uma auditoria em 80 casos em que foram constatadas diferentes situações. Havia desde pessoas que trabalhavam na assembleia e recebiam indevidamente o benefício, até “laranjas” que emprestavam o nome e em troca recebiam uma quantia simbólica, de até R$ 300 sem trabalhar na Assembleia.
A PF identificou ainda casos de mais de 30 pessoas que moram em outros Estados e sequer sabiam que eram “funcionários” da Casa legislativa.
Dos 80 investigados, 41 afirmaram que sequer tinham conhecimento que seus nomes constavam na folha de pagamento da Assembleia. Outros 39 admitiram que emprestaram o nome para o esquema mas, na prática, eram funcionários fantasmas. “Tivemos um caso de uma agricultora em condições de vulnerabilidade, que recebia Bolsa Família e teria recebido no período um salário mensal de R$ 24 mil da assembleia, mas só recebia, de fato, R$ 700 em seu trabalho no campo e não trabalhava na Assembleia”, contou o delegado Torres.
A reportagem tentou contato reiteradas vezes com a assessoria da Assembleia nesta quinta durante todo o dia, mas não obteve retorno. Também foi encaminhado e-mail para a assessoria da Casa, mas sem resposta até o momento.
Após a operação, a Assembleia divulgou uma nota em seu site: “A Assembleia Legislativa foi alvo, nesta manhã, de ação de cumprimento de mandado judicial, referente a uma investigação circunscrita ao período de 2010-2013”.
“Preliminarmente, o Poder assim se manifesta: Sobre a acusação de suposta presença de beneficiários do Bolsa Família na folha de pessoal, causa espécie a constatação da falta de integração e de acesso das demais esferas de poder ao cadastro do mencionado Programa, que é de responsabilidade federal. A restrição é tanta que o próprio Congresso Nacional já discute projeto de lei pelo qual garante ao cidadão o acesso a essa listagem.”
“A atual Mesa Diretora desconhece que tenha havido qualquer requisição administrativa, visando um confronto sistemático da folha de pessoal com o cadastro do Bolsa Família. Nos últimos tempos, vem atendendo, de pronto, diversos pedidos pontuais efetuados por órgãos de investigação.”
“Ao recomendar prudência em relação às informações extraídas de contexto, a atuai mesa Diretora, por fim, vê com naturalidade a ação investigativa. Afirma encontrar-se aberta à criação de novos mecanismos de controle interno e reitera o compromisso de colaborar com o esclarecimento da verdade.”