Nesta terça-feira, 2, M.J. vai dar um passo importante para arrancar as marcas que ficaram das sessões de tortura que sofreu. Por causa das agressões com alicate, a menina tem queloides espalhadas pelo corpo. Após consultas com vários especialistas, a intervenção cirúrgica mostrou-se a melhor alternativa para eliminá-las.
Desde que saiu do hospital em agosto de 2016, M.J. e os irmãos, de 6 anos e 4 anos, foram encaminhados para um abrigo na Lapa, na zona oeste de São Paulo. O local é assistido pela Organização Não Governamental (ONG) Ciranda para o Amanhã, que ajuda 19 abrigos na região oeste da cidade e atende 350 crianças. A menina acabou “adotada” pelo grupo.
A ONG começou em dezembro de 2015 com um grupo de nove mães cujos filhos são alunos de uma mesma escola particular, na região da Lapa. O grupo cresceu e hoje conta com 600 voluntárias.
“A M.J. nos conquistou pela sua doçura. Ela tinha tudo para ser uma criança triste, amarga, mas é exatamente o oposto”, contou Paula Martinez, uma das fundadoras da ONG. Uma amiga, diz ela, havia contado o caso de M.J. e pediu ajuda para a ONG com o objetivo de acolher a menina.
Paula conta que um dos hábitos que a menina perdeu foi o de limpar o quarto. “As assistentes sociais nos contaram que no primeiro dia ela levantou cedo, pegou a vassoura e foi varrendo o chão. Depois que foi explicado que ela não precisava fazer mais aquilo, ela contou que estava acostumada a viver assim. Muito triste”, lembrou.
A simpatia e o carinho de M.J. fez com que os voluntários fizessem mais do que habitualmente costumam fazer. A menina passou a ser levada a passeios nos finais de semana com as diretoras. “Hoje há uma espécie de rodízio para quem vai ficar com ela”, contou Paula.
As “tias” costumam levá-la para o cinema, shopping, parques de diversões e até para passar “um dia de princesa” em um salão de beleza. Os irmãos mais novos também acompanham a garota em algumas ocasiões.
Cuidados. Desde que chegou no abrigo, a garota passou por consultas médicas e odontológicas. Atualmente, está em tratamentos dentário, dermatológico e também psicológico. Tudo isso foi possível, de acordo com Paula, porque os médicos e demais profissionais se sensibilizaram com o caso e decidiram ajudá-la de diferentes maneira.
“Ela já se submeteu a várias consultas com os mais variados profissionais. Em duas ocasiões, houve internação para retirada das manchas que ficaram na pele. Pagamos apenas o hospital. Médico e anestesista não cobraram”, contou Isabella Britto, que também ajudou a fundar a ONG.
Além das queloides, M.J. tem outras marcas de ferimentos por todo o corpo. “As manchas diminuíram bastante, mas as queloides aumentaram com o decorrer do tempo. Apenas com cirurgia será possível diminuí-las. É um trauma que ela tem, porque traz de volta, tudo o que já passou”, afirmou Paula.
De acordo com Isabella, o início do tratamento psicológico revelou vários traumas. M.J. não conseguia, por exemplo, dormir direito. “Ela dizia que fechava os olhos e ouvia risadas da mãe afirmando que a menina iria apanhar todos os dias. E acreditava que praga de mãe pegava. Foi difícil para ela parar de pensar nessas coisas.”
Futuro. A Justiça ainda vai definir com quem a menina e os irmãos vão ficar. Caso nenhum parente tenha condições de recebê-los, diz a ONG, há a possibilidade de encaminhamento para adoção. Não há prazo para a decisão. Enquanto isso, a menina segue encantando a todos. “Tia, eu amo vocês”, é o que ela costuma dizer. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.