Após anos de impasse entre a Prefeitura de São Paulo e a Eletropaulo, a gestão do prefeito João Doria (PSDB) fechou um acordo no qual a concessionária de energia elétrica e as empresas de telecomunicação ficarão encarregadas de enterrar 52 quilômetros de fios de transmissão que cruzam o céu da cidade e remover 2.019 postes das calçadas da capital paulista.
Em sua primeira fase, o novo plano de enterramento de fios de São Paulo, batizado por Doria de Cidade Linda Redes Aéreas, vai limpar 117 ruas de sete distritos paulistanos da região central: Consolação, Bela Vista, República, Santa Cecília, Jardim Paulista, Bom Retiro e Brás. Na maioria das vias, a Eletropaulo já enterrou sua fiação, mas restaram os cabos de telefonia, TV e internet e os postes. A previsão é concluir esse trecho até julho do ano que vem.
O cronograma de execução da rede subterrânea envolve 12 conjuntos de ruas, começando pela Rua José Paulino, no Bom Retiro, e terminando na Alameda Santos, no Jardim Paulista. Os dutos com os cabos de telecomunicações e de empresas municipais, como da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), ficarão na mesma galeria já usada pela rede elétrica.
As empresas de telefonia e internet, que hoje pagam aluguel para usar os postes da Eletropaulo, vão bancar as obras de enterramento. O custo total ainda está sendo calculado. Já a concessionária de energia deve gastar R$ 6 milhões para retirar os postes e reparar as calçadas. Segundo a gestão Doria, não haverá custos para a Prefeitura.
“Esse é o primeiro passo de uma maratona. Conseguimos superar os problemas que haviam e, por meio do diálogo, conseguimos encontrar viabilidade técnica e econômica para esse projeto, que vai mudar a cara da região e auxiliar na requalificação do centro”, disse Marcos Penido, secretário municipal de Serviços e Obras.
A meta estipulada pela gestão Doria é enterrar 100 km de fios por ano na cidade. A medida, uma das promessas de campanha do tucano, envolve uma longa batalha administrativa e jurídica entre a Prefeitura e a Eletropaulo. A concessionária de energia é responsável por 44 mil km de fios em sua área de concessão na Grande São Paulo, dos quais só 3 mil km são subterrâneos, e 1,2 milhão de postes.
Em 2005, o então prefeito José Serra (PSDB) sancionou uma lei obrigando as concessionárias a enterrarem todos os cabos da cidade. Dez anos depois, o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) publicou uma portaria exigindo que 250 km de fios fossem retirados dos postes a cada ano, medida que foi suspensa por uma liminar da Justiça a pedido do sindicato das empresas do setor. Segundo a Eletropaulo, a meta custaria R$ 100 bilhões e levaria 33 anos para ser cumprida, com impacto na conta de luz dos clientes.
Agora, segundo o presidente da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp), João Moura, o trabalho será “gradativo” e o cronograma das próximas fases, negociado com a Prefeitura. Ele disse que as empresas devem incluir na primeira etapa um trecho de quase 7 km na Vila Olímpia, centro comercial e empresarial da zona sul.
“Esses 59 km são o ponto de partida. Essas ruas vão ficar como já é hoje na Faria Lima e no Largo da Batata, onde fizemos todo enterramento em 2012, ou ao redor do estádio do Corinthians, onde as obras viárias já foram feitas com o cabeamento subterrâneo”, disse.
Em uma das ruas da primeira fase do programa, a Ribeiro Lima, no Bom Retiro, o emaranhado de fios dá na vista. “Recentemente pipocou tudo, ficamos um dia e meio sem luz. Até fizeram a manutenção, mas os fios ficaram assim”, diz Adriana Almeida, de 47 anos, proprietária de um café, apontando para o poste. Sem energia, o estabelecimento manteve as portas fechadas. O prejuízo calculado por ela, entre vendas que deixaram de ser feitas e salgados que acabaram indo para o lixo, foi de R$ 2,5 mil.
Adriana vê a proposta com ponderação. Para ela, o enterramento deve ser bem estudado pela Prefeitura antes da sua instalação, para evitar que surjam outros problemas. “Aqui na frente há um buraco que sempre abre quando chove, já ficou do tamanho de uma cratera. A Prefeitura fecha, o buraco abre”, exemplifica. “É preciso resolver a estrutura da rua antes. Já pensou se abrem tudo e não conseguem fechar?”
Não raro, pedestres param na Rua São Domingos, na Bela Vista, no centro, para fotografar um fio com mais de 30 pares de sapato pendurados. “Uma hora isso vai ceder ou dar um curto. É um perigo”, reclama a cabeleireira Marinalva Santos, de 45 anos, dona de um salão na rua.
Segundo Marinalva, é comum andar por ali em meio a fios caídos, muitos deles após casos de furtos de cobre. “Você nunca sabe se é de alta tensão ou se não oferece risco. Fica todo mundo com medo”, diz a cabeleireira, que aprova o enterramento previsto para a rua. “Hoje é feio, perigoso e atrapalha árvore de crescer.”
“A ideia é fantástica”, concorda Valdir Damaceno, de 54 anos, dono de um bar na São Domingos. No início do ano, conta, um caminhão passou pela rua e, alto demais, saiu arrastando os fios com ele. Foram três dias para consertar. “É bom que, embaixo do chão, evita futuros problemas.”
Fora da primeira etapa do projeto, a Rua Albion, na Lapa, zona oeste, está em uma região castigada na época de chuva – em outubro de 2016, um homem de 23 anos morreu eletrocutado durante um temporal que atingiu São Paulo, derrubou árvores e arrebentou a fiação. “Aqui, estoura transformador direto”, afirma Sidney Rocha, de 61 anos, funcionário de um estacionamento. “Quando chove, dá medo porque as árvores caem e podem sair derrubando tudo e pegar na gente.”
Transtorno inevitável
Embora seja uma demanda antiga da cidade, o enterramento de fios na capital paulista vai causar transtornos para os paulistanos. As empresas de telecomunicação afirmam que a substituição da rede aérea pela subterrânea não deixará ninguém sem sinal de internet, mas as valas que serão abertas em ruas e calçadas vai atrapalhar o trânsito de veículos e pedestres.
“É uma cirurgia na cidade que tem de ser feita com muita calma porque não podemos interromper os serviços e criar problemas para a população. Esse tipo de perturbação será praticamente zero. Por outro lado, haverá o transtorno da obra na rua, que é inevitável”, disse João Moura, presidente da Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp).
Como a primeira fase do projeto está focada na região central da capital, onde se concentram comércios e empresas, o início da maior parte das obras será em janeiro, depois do período de festas e de fechamento de balanço das firmas, de acordo com o presidente da Telcomp.
“São obras em regiões muitos densas, em residências, comércios, escritórios e tráfego. Não queremos prejudicar a atividade de ninguém. Por isso vamos fazer com toda cautela possível”, afirmou Moura.
O enterramento dos cabos de energia e telecomunicações dá mais segurança às redes, deixando-as menos expostas a intempéries como chuvas e vendavais, e acidentes. Sem falar, ainda, da vantagem estética que a medida proporciona.
Na Rua José Paulino, no Bom Retiro, famosa pelas lojas de roupa, a fiação já fica sob o solo, o que é comemorado por comerciantes. “Ficou muito bom. A manutenção é rápida e dificilmente fico sem luz”, diz a lojista Luana Pereira, de 32 anos. “É muito melhor, tanto em termos de aparência quanto de segurança.” Já o franqueador de sorvetes naturais Márcio Morgado, de 38 anos, que trabalha na Lapa, área que está fora da primeira fase do plano, torce para que o projeto chegue à sua região. “Quando os fios forem enterrados vai ficar perfeito.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.