Recém-recuperado da covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, o epidemiologista e coordenador do Centro de Contenção do vírus em São Paulo, David Uip, tem sofrido pressão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para revelar se fez uso da hidroxicloroquina no tratamento da doença.
Em entrevista coletiva nesta quarta-feira, Uip pediu ao presidente que respeite seu direito enquanto paciente de não revelar o que usou durante seu tratamento, afirmando que respeitou Bolsonaro quando ele preferiu não mostrar os resultados de seus exames para covid-19.
Na manhã desta quarta-feira, Bolsonaro postou em seu Twitter que "dois renomados médicos" recuperados da doença se recusaram a divulgar se usaram a hidroxicloroquina durante o tratamento, se referindo a David Uip e ao cardiologista Alexandre Kalil, do Hospital Israelita Albert Einstein, que pouco depois disse que consumiu a droga.
A postura do presidente motivou ataques virtuais de apoiadores de Bolsonaro aos dois médicos, em especial à Uip, por sua ligação com o governo de São Paulo, comandado por João Doria (PSDB), que protagoniza atritos com o chefe do Planalto durante a crise do coronavírus.
Segundo informou Uip, os ataques que recebeu serão levados à Justiça. "Tomarei providências legais por essa invasão à minha privacidade e à dos meus pacientes", disse o infectologista, ao afirmar que a privacidade de sua clínica particular também foi agredida.
Uip ainda lembrou que, durante reunião com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, foi ele quem recomendou ao governo que autorizasse o uso da hidroxicloroquina para pacientes internados com covid-19, sob receita médica e autorização formal do paciente. A recomendação foi acatada pelo ministério, que mudou o protocolo para o uso da substância.
Para o Estado, o infectologista informou que o uso do medicamento é permitido a todos os hospitais do sistema público e privado. Segundo o secretário estadual da Saúde, José Henrique Germann, o governo de São Paulo recebeu cerca de 200 mil comprimidos de hidroxicloroquina do Ministério da Saúde, redistribuídos aos hospitais públicos.
<b>Gabinete do ódio</b>
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que repudia os ataques do "gabinete do ódio em Brasília" aos médicos, técnicos e autoridades da saúde, em especial a David Uip, ao ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e ao médico cardiologista Roberto Kalil. "Nós precisamos de paz e não de confronto. Que país é esse onde o confronto através das redes sociais é feito para destruir as pessoas e a reputação?", disse o governador.
De acordo com Doria, "quem decide pelo uso desse medicamento (a hidroxicloroquina) não é o governador, são os médicos".
Na entrevista coletiva, Doria voltou a fazer referência ao presidente Jair Bolsonaro. "Não foi nenhum médico no Brasil que disse, por várias vezes, que a gravíssima crise do coronavírus era uma gripezinha ou um resfriadinho", disse o governador. "Portanto, respeito com os médicos do Brasil", finalizou.