O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o empresário Joesley Batista e outros dois delatores do Grupo J&F percam a imunidade penal prevista no acordo de colaboração. O motivo é a omissão de fatos descobertos em gravação entregue pelos delatores. A indicação de Janot converge com a avaliação feita por ministros da Corte de que os benefícios concedidos aos empresários merecem ser rediscutidos, embora façam a ressalva de que as informações obtidas a partir do acordo poderão continuar a ser aproveitadas em processos.
A imunidade aos irmãos Batista é alvo de questionamento desde maio, quando a delação foi divulgada. Janot tem defendido o acordo com a justificativa de que não havia outra opção. Porém, o cenário mudou na segunda-feira, quando o procurador-geral abriu um procedimento após analisar gravação em que Joesley fala sobre suposta orientação de Marcelo Miller, ex-procurador, aos delatores.
Para tomar a decisão sobre a revisão, Janot ainda irá ouvir os três delatores da J&F que aparecem na conversa gravada e o próprio Miller e analisar informações do escritório de advocacia Trech, Rossi e Watanabe – onde o procurador chegou a trabalhar após ser exonerado do Ministério Público. Janot concedeu inicialmente até amanhã para que os esclarecimentos sejam prestados. A intenção é resolver a situação o quanto antes para que a questão seja resolvida nos dez dias que ainda possui à frente do cargo de procurador-geral.
Depois que a PGR encaminhar ao Supremo sua avaliação sobre o que deve ser feito com o acordo, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF, terá de decidir se analisa o caso sozinho ou leva para debate em plenário. No caso JBS e em outras polêmicas no curso da operação, a opção do ministro tem sido por compartilhar com o colegiado o tema para que o plenário dê a palavra final.
Revisão. Em caráter reservado, ministros já discutem a possibilidade de a Corte rever o acordo de colaboração da JBS. Na avaliação de ao menos três magistrados, no entanto, uma eventual revisão, com o fim dos benefícios a delatores do grupo, não necessariamente levaria à anulação das provas.
“Acho que as provas que subsistem autonomamente podem ser aproveitadas. E a prova testemunhal dele não pode valer, mas os documentos que subsistem por si sós, eles têm de ter vida própria”, disse o ministro Luiz Fux.
O ministro defendeu ontem, em dura manifestação na Corte, a prisão de Joesley e do executivo Ricardo Saud. “De sorte que eu deixo ao MP a opção de fazer com que esses participantes desta cadeia criminosa que confessaram diversas corrupções, que eles passassem do exílio nova-iorquino para o exílio da Papuda”, afirmou, ao mencionar o complexo penitenciário no Distrito Federal. “Gostaria de sugerir isso aqui em meu nome pessoal e, eventualmente, daqueles que concordam com a minha indignação.”
Além dele, o decano do STF, Celso de Mello, e o ministro Marco Aurélio Mello também compartilham a opinião de que, mesmo com uma revisão do acordo de delação, as provas obtidas a partir da colaboração poderão ser utilizadas. “A lei sobre organizações criminosas dispõe que, na eventualidade de uma revisão do acordo de colaboração premiada, ainda que o fato seja imputável ao agente colaborador, em havendo a rescisão, as provas coligidas a partir do depoimento em relação a terceiras pessoas, vale dizer, em relação aos delatados, elas são válidas”, disse Celso de Mello.
Durante a conversa gravada, os interlocutores falam sobre “dissolver o Supremo” da mesma forma que, nas palavras de Joesley Batista, a Odebrecht “moeu” o Legislativo. “Não há nada em relação aos ministros do Supremo. Vai investigar o quê? Nós não estamos sob suspeita. Felizmente não estamos, porque o Supremo é a última trincheira da cidadania”, comentou Marco Aurélio. Em defesa de Janot, ele considerou “louvável” a atuação do procurador-geral da República.
Fachin recebeu ligações de apoio de pelo menos três colegas nos últimos dias. Um deles disse ao relator que todas as decisões dele têm sido fiéis ao que está colocado nos autos.
Em agenda oficial em Paris, o ministro Gilmar Mendes voltou a disparar contra Janot. “Eu imagino que o procurador-geral pensou em fazer um grand finale, oferecer várias denúncias, inclusive a última contra o presidente da República. Mas acho que ele conseguiu coroar dignamente o encerramento de sua gestão com esse episódio Joesley”, ironizou. “Ele fez jus a tudo o que plantou ao longo de todos esses anos, e essa será a marca que nós vamos guardar dele, o procurador-geral da delação Joesley, desse contrato com criminosos, dessa fita.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.