Após dois meses de negociações, a Câmara dos Deputados concluiu na noite desta terça-feira, em plenário, a análise da medida provisória (MP) que cria um novo Refis. Na votação, parlamentares aprovaram oito emendas alterando as regras de adesão ao programa. A matéria foi enviada para análise do Senado Federal, que precisa aprovar o texto e enviá-lo para sanção presidencial antes de 11 de outubro, quando a MP perde a validade.
As mudanças, se chanceladas pelo Senado e sancionadas pelo presidente Michel Temer, devem reduzir a arrecadação do governo com o programa de parcelamento tributário. O líder do governo na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), afirmou que Temer deve vetar algumas dessas alterações. De acordo com o parlamentar paraibano, a maioria das emendas aprovadas contrariou acordo fechado entre Executivo e Legislativo sobre o texto da MP.
Uma das alterações aprovadas foi para isentar contribuintes que aderirem ao programa do pagamento de encargos legais e honorários advocatícios. O texto-base da MP previa desconto de apenas 25% nos valores desses encargos. Emenda apresentada pelo PP, porém, elevou para 100% o desconto. A isenção tem objetivo de atingir procuradores, que recebem parte da arrecadação do governo com encargos e honorários.
Apesar da mudança em relação aos encargos, deputados mantiveram descontos nas multas e juros que contribuintes terão de pagar para aderir ao Refis. Para as multas, os descontos serão os seguintes: até 70%, para pagamento à vista; 50%, para pagamento parcelado em 145 meses; e 25%, quando parcelar em 175 meses. No caso dos juros, os descontos previstos são, respectivamente, de 90%, 80% e 50%. O prazo de adesão também permaneceu até 31 de outubro.
Simples Nacional. Deputados também aprovaram emenda para permitir que empresas que participam do Simples Nacional possam aderir ao Refis. O líder do governo disse, contudo, que a medida é inconstitucional e, por isso, deve ser vetada. Isso porque o Simples é um regime tributário simplificado para micro e pequenas empresas que permite recolhimento de todos os tributos federais, estaduais e municipais em uma única guia e que tem um regime específico para parcelamento de dívidas.
Parlamentares aprovaram também um destaque para retirar da MP o trecho que permitia parcelamento de dívidas junto à Procuradoria-Geral da União (PGU). Na avaliação de procuradores, isso poderia permitir suspeitos de corrupção parcelarem e terem descontos ao devolverem à União dinheiro desviado dos cofres públicos. O trecho foi incluído durante a análise da proposta em uma comissão mista do Congresso, mas acabou retirado ontem no plenário da Câmara após a imprensa divulgar a brecha.
Outro destaque aprovado acabou com o chamado “voto de qualidade” no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Atualmente, quando há empate nos julgamentos do Carf, o voto de desempate deve ser do presidente da turma em que o caso está sendo julgado. Esse representante é indicado pelo Ministério da Fazenda. Com a proposta aprovada pela Câmara, em caso de empate, a decisão deverá ser sempre favorável ao contribuinte.
Igrejas. Deputados aprovaram também duas emendas favoráveis a igrejas. A primeira prevê perdão de dívidas tributárias com a Receita Federal de igrejas, entidades religiosas e instituições de ensino vocacional sem fins lucrativos. A remissão vale para débitos inscritos ou não na Dívida Ativa da União, inclusive aqueles objeto de parcelamentos anteriores ou que são alvo de discussão administrativa ou judicial.
A segunda emenda favorável às igrejas estabeleceu isenção de cobrança de tributos da União incidentes sobre patrimônio, renda ou serviços para igrejas e instituições de ensino vocacional. A isenção valerá por cinco anos para entidades que exerçam atividade de assistência social, sem fins lucrativos.
Na votação, deputados aprovaram ainda emenda relacionada ao Proies, programa que permitia instituições de ensino superior a converterem 90% das suas dívidas com a União em bolsas do ProUni. Os outros 10% poderiam ser parcelados em até 15 anos. A emenda aprovada pela Câmara estabeleceu que o valor das bolsas concedidas pelas instituições que excederam o valor do débito parcelado poderá ser transformado em crédito tributário a favor da entidade.
Políticos. Durante a votação, deputados rejeitaram, por 205 votos a 164, emenda que visava proibir políticos, funcionários públicos e suas empresas de aderirem ao Refis. Com a rejeição, eles poderão aderir ao programa para parcelarem suas dívidas tributárias e previdenciárias, assim como seus cônjuges, parentes até segundo grau e sócios. Na primeira versão do programa, no primeiro semestre deste ano, esse público não pôde aderir ao Refis.
A emenda chegou a ser rejeitada de forma simbólica, mas deputados do PSOL, PSB e PV pediram votação nominal, orientaram voto contra a emenda e, consequentemente, contra a proibição os seguintes partidos: PMDB, PP, PSDB, PSD, PR, DEM, PRB, PDT, Solidariedade, PSC, PPS, PEN. A liderança do governo também se posicionou contra a emenda. “Daqui a pouco só em ser político já vai ser crime”, disse Aguinaldo Ribeiro..
Em julho, o Estadão/Broadcast mostrou que deputados e senadores deviam naquele mês R$ 532,9 milhões à União, de acordo com dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. O valor inclui dívidas inscritas nos CPFs dos parlamentares, débitos nos quais eles são corresponsáveis ou fiadores e o endividamento de empresas das quais são sócios ou diretores.
Os R$ 532,9 milhões em dívida dos parlamentares consideram apenas as dívidas em aberto, ou seja, o endividamento classificado como “irregular” pela PGFN. Isso porque deputados e senadores já foram beneficiados por parcelamentos passados. O total de débitos ligados a deputados e senadores inscritos em Refis anteriores – ou seja, que estão sendo pagos e se encontram em situação “regular” – é de R$ 299 milhões.