O Ministério Público Federal em Mato Grosso (MPF/MT) instaurou um inquérito civil para apurar possíveis irregularidades na mobilização da Força Nacional de Segurança Pública no entorno da hidrelétrica São Manoel, por conta de manifestações de indígenas da etnia Munduruku.
Uma portaria do Ministério da Justiça e Segurança Pública, assinada no último dia 13 e publicada só nesta terça-feira, 17, autorizou o uso de agentes da Força Nacional para “prevenir quaisquer ocorrências que possam por em risco a segurança dos envolvidos, a ordem pública, a continuidade das obras de conclusão da Usina Hidrelétrica (UHE) de São Manoel”, localizada entre os Estados de Mato Grosso e Pará.
Os procuradores querem saber se os agentes teriam “perseguido” os indígenas em suas manifestações. Os índios protestam contra a concessionária de São Manoel, devido ao cumprimento de ações de compensação socioambiental ligadas à construção da usina.
O envio da Força Nacional ocorreu após um pedido realizado pela usina São Manoel. O apoio está previsto para ocorrer até 31 de dezembro de 2017.
O Ibama liberou a licença de operação da hidrelétrica no dia 5 de setembro. Na terça-feira, 10, a Empresa de Energia São Manoel (EESM), que pertence à chinesa Three Gorges, à portuguesa EDP e à estatal Furnas, do Grupo Eletrobras, enviou uma carta à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), comunicando a agência sobre “risco iminente” de invasão da usina. No mesmo dia, a reportagem questionou a concessionária sobre o assunto, mas não obteve resposta da empresa.
Por meio de nota, o MPF informou que a Força Nacional destacou efetivo para a cidade de Alta Floresta (MT) e monitorou o deslocamento dos indígenas da área do entorno do canteiro até a cidade e que estava preparada para retirá-los do Museu de História Natural. O órgão público estadual é o local onde as urnas funerárias sagradas dos índios Munduruku estão guardadas e onde estes planejavam fazer os rituais tradicionais, segundo o MPF.
Os indígenas informaram que não conseguiram concluir os rituais e que estão ali porque ainda definirão o local de depósito das urnas funerárias. Eles reivindicam compromissos da concessionária quanto à nova localização onde as urnas serão depositadas e alegam que o reservatório de São Manoel inundou áreas sagradas de seus povos.
Por meio do inquérito civil público instaurado, o MPF informou que vai verificar “se a atuação da Força Nacional se deu nos estritos limites da Portaria do Ministério da Justiça”.
Orçada em mais de R$ 2 bilhões, a hidrelétrica foi leiloada em dezembro de 2013, depois de três anos de polêmicas em seu processo de licenciamento. A própria Empresa de Pesquisa Energética (EPE), estatal responsável pelos estudos da usina, admitiu que São Manoel traria uma série de impactos aos povos indígenas da região, muitos deles considerados irreversíveis para os milhares de índios da etnia mundurucu. Mesmo assim, o governo tomou a decisão de avançar com o projeto.
Em julho deste ano, o canteiro de obras da usina chegou a ser ocupado por um grupo de mais de 200 indígenas, em protesto por conta de uma série de reivindicações, entre elas a devolução de urnas funerárias de parentes enterrados há anos na região afetada pela usina.