No Kremlin, um amplo plano de comunicação começou a ser implementado para usar a Copa do Mundo de 2018 como plataforma para mostrar ao mundo uma Rússia como potência e moderna. Enquanto eventos se proliferam às vésperas do sorteio dos grupos do Mundial, nesta sexta-feira, com jantares e lançamento do pôster oficial, nos bastidores executivos da Fifa e do governo se reúnem para tentar lidar com crises que se acumulam e que podem ameaçar o esforço do presidente e Vladimir Putin em usar a competição como instrumento de propaganda.
Um problema sério é a falta de dinheiro. Os estádios estão prontos, mas nem Moscou nem Zurique sabem dizer qual será a situação das finanças da Fifa depois do Mundial. Quando a entidade desembarcou no Brasil, há quatro anos, seus cofres estavam cheios. A bonança era de tal dimensão que os dirigentes decidiram modificar os planos para 2018 e abrir 20 novas vagas para multinacionais que quisessem ter seus nomes associados ao torneio de futebol, na condição de patrocinadores regionais. “O plano de marketing fracassou”, admitiu um ex-representante da Fifa, falando ao Estado na condição de anonimato. Até agora, apenas duas das 20 vagas foram preenchidas.
Quando o projeto de marketing foi lançado, em 2014, o que ninguém previa era o terremoto causado pelas prisões dos cartolas, em maio de 2015. O processo nos Estados Unidos contra dirigentes afastou muitos investidores e empresas norte-americanas passaram a tomar cuidado com qualquer tipo de relação com a Fifa.
Em 2015 e 2016, a Fifa registrou déficit de US$ 100 milhões e US$ 120 milhões, respectivamente. Só para pagar seus advogados para se defender diante dos escândalos de corrupção, gastou US$ 60 milhões.
A entidade ainda foi golpeada financeiramente pela ausência de algumas importantes seleções. Em 2018, estarão fora da Copa China e Catar, responsáveis por grande parte da injeção de recursos no esporte nos últimos dois anos. Ficarão em casa também Estados Unidos, Holanda e Itália, o que impede que televisões e empresas destes países injetem ainda mais recursos no torneio.
Se no ciclo anterior o lucro beirou a marca de US$ 500 milhões, a nova projeção aponta para queda do lucro para US$ 100 milhões até o fim de 2018, na melhor das hipóteses. A nova realidade obrigou a Fifa a desacelerar a expansão de seus planos. O prêmio que será distribuído aos países vai aumentar em 2018. Mas não na mesma proporção registrado nas últimas edições do Mundial. O crescimento, desta vez, será de apenas 12%, bem diferente do que ocorria nos últimos anos.
DOPING – Outra dor de cabeça é o doping. Richard McLaren, investigador independente da Wada, denunciou a existência de um sistema para encobrir o doping no futebol russo, com pelo menos 34 casos de jogadores. Até hoje a Fifa não deu seguimento às acusações e não abriu qualquer tipo de investigação.
O problema central, porém, não é o envolvimento apenas de atletas. As descobertas de McLaren apontam que Vitaly Mutko, ex-ministro russo de esportes e organizador da Copa do Mundo, era o chefe do plano de Estado para garantir que atletas pudessem se dopar sem risco de serem pegos. Desde então, no entanto, Mutko foi promovido pelo governo russo para vice-primeiro ministro. “Há um impasse político”, admitiu McLaren sobre o problema do doping na Rússia.
Uma operação de negação por parte de Moscou foi iniciada para abafar a crise. Stanislav Cherchesov, treinador russo, garantiu que a sua seleção está totalmente limpa. “Não temos nada a ver com isso e inspetores vêm com regularidade testar nossos jogadores”, comentou.
A Fifa modificou a sua posição sobre os russos. Depois de dizer que o doping não existia, a secretária-geral da entidade, Fatma Samoura, optou por afirmar apenas que o problema “não era generalizado” no futebol russo.