Neste dia 1º de maio, data comemorativa do Dia do Trabalho, os trabalhadores brasileiros vivem a expectativa de uma nova legislação que pode ser aprovada pelo Congresso Nacional e mudar as relações entre funcionários e empresas. A reforma trabalhista, já aprovada na Câmara dos Deputados e que, agora, será avaliada no Senado, tem como sua espinha dorsal a flexibilização dos direitos trabalhistas e a prevalência do “negociado sobre o legislado”.
Especialistas em Direito do Trabalho divergem sobre os efeitos da reforma. Enquanto alguns defendem que a reforma e a flexibilização vão precarizar e retirar direitos, outros acreditam que a modernização da lei é necessária e em muitos pontos as negociações coletivas poderão favorecer o trabalhador.
As mudanças propostas na reforma trabalhista, aprovadas na Câmara dos Deputados na madrugada do último dia 27 de março, afetam o cotidiano das relações trabalhistas, pois alteram pontos como férias, jornada de trabalho, remuneração, além de implantar e regulamentar novas modalidades de trabalho, como o trabalho remoto (home office) e o trabalho intermitente.
O texto também prevê que a negociação entre empresas e trabalhadores prevalecerá sobre a lei em pontos como parcelamento das férias, flexibilização da jornada, participação nos lucros e resultados, intervalo, plano de cargos e salários, banco de horas, remuneração por produtividade e trabalho remoto.
Na avaliação do advogado Paulo Lemgruber, do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, os sindicatos e as empresas poderão estabelecer, pela via da negociação coletiva, condições de trabalho diferentes daquelas previstas em lei. “E essas condições poderão ser não necessariamente num patamar melhor para os trabalhadores, em matéria de parcelamento de férias, cumprimento da jornada de trabalho, participação nos lucros e resultados, tempo de deslocamento até o local de trabalho, intervalo intrajornada, prazo de validade dos acordos e convenções coletivas, adesão ao Programa Seguro Emprego, plano de cargos e salários, regulamento empresarial, banco de horas, trabalho remoto, remuneração por produtividade e registro da jornada de trabalho”, alerta.
A novidade, segundo o advogado, será permitir que “direitos trabalhistas previstos na legislação atual – não apenas na CLT, pois há leis esparsas – possam ser substituídos ou até suprimidos, mediante negociação coletiva entre empresas e sindicatos”.
Já na visão do especialista em Direito e Processo do Trabalho, Danilo Pieri Pereira, sócio do Baraldi Mélega Advogados, a atualização das leis trabalhistas é importante para auxiliar no crescimento econômico.
“Embora as mudanças tendam a enfrentar resistências por parte daqueles que entendem que a septuagenária CLT, norma criada na Era Vargas, deva ser mantida indefinidamente, a atualização legislativa se faz extremamente importante para contemplar o trabalho à distância e o fenômeno da terceirização, dentre outros. Resta aguardar a indicação de todas as alterações sugeridas e torcer para que a tão sonhada modernização das leis trabalhistas impulsione o país rumo ao crescimento”.
Pereira também acredita que o negociado sobre o legislado é uma tendência mundial e é necessário em um país com dimensões continentais como o Brasil. “A mesma legislação pode não se mostrar tão forte no Acre, por exemplo, como em São Paulo. Isso já foi reconhecido pelo constituinte de 1988, quando foi previsto, entre os direitos sociais, o reconhecimento da negociação sindical (artigo 7º, inciso XXVI da Constituição da República). O que a lei faz agora é apenas reforçar este aspecto, a fim de que as diferentes realidades sociais de cada região do país possam ser observadas para cada segmento da economia”, pontua.
Lado humano
O professor da pós-graduação da PUC-SP e doutor em Direito do Trabalho Ricardo Pereira de Freitas Guimarães acredita que a proposta tem vários equívocos. “As medidas contrariam inúmeras convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e nossa própria legislação, pois cria possibilidade de parcelamento de férias, jornada excessiva, entre outras medidas que prejudicam o empregado. Por exemplo, no caso das horas extras, estudos comprovam que inúmeros acidentes de trabalho acontecem na extensão da jornada de trabalho. E parcelar férias vai contra o direito de descanso do empregado”, afirma.
Freitas destaca que as novas regras deixam claro que o Governo Federal fez uma opção pela economia e não pelo lado humano do trabalhador. “Agora, pelo texto do projeto, o acordo prevalece sobre a legislação, o que é muito perigoso, pois não temos uma boa representividade sindical no país. Nós temos feudos que controlam a arrecadação do imposto sindical. Temos que mudar nossa cultura e apostar na pluralidade sindical, só assim o negociado sobre o legislado daria certo no Brasil”, pontua.
Danilo Pieri acredita, entretanto, que o negociado pelo legislado poderá favorecer os trabalhadores e trabalhadoras em diversas situações. “Existem algumas categorias e trabalhadores que poderão se beneficiar desta nova medida. Por exemplo, um funcionário que almoça na própria fábrica e consegue fazer sua refeição tranquilamente em meia hora, poderá sair meia hora mais cedo do expediente. Lógico que cada caso deverá ser analisado com critério e bom senso”, explica.
Para o advogado João Gabriel Lopes, sócio do escritório Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, a reforma representa um tiro no próprio pé para o governo. “Com a flexibilização das regras a rotatividade será maior, os salários serão menores, o que acaba prejudicando a Previdência”.
Lopes acredita que a prevalência do negociado sobre o legislado pode ser prejudicial porque, em muitas situações, o empregado ficará a cargo do empregador. “A hora do almoço pode ser reduzida e quem trabalha em casa não vai receber horas extras, o que é injusto”, afirma.
Férias
Um dos pontos mais discutidos na reforma é o parcelamento férias em até três vezes anuais, sendo que uma das frações não pode ser inferior a duas semanas. Atualmente, segundo os especialistas, somente em casos excepcionais as férias podem ser fracionadas em dois períodos e, quando isto ocorrer, um dos dois períodos não poderá ser inferior a dez dias corridos. “A ideia da legislação em vigor é proteger a saúde física e mental, ao garantir período de repouso contínuo que permita o verdadeiro descanso da rotina de trabalho”, defende Paulo Lemgruber.
Se aprovada a reforma trabalhista, os sindicatos e as empresas poderão acordar pelo parcelamento das férias dos trabalhadores em até três vezes. “Assim, para os trabalhadores que fazem jus a 30 dias de férias, um dos períodos terá que ter a duração de, pelo menos, 15 dias, podendo as frações remanescentes serem fixadas de acordo com o que as partes dispuserem em negociação coletiva, como, por exemplo, um período de seis dias e outro de nove dias”, observa o advogado.
Ruslan Stuchi, advogado trabalhista e sócio do Stuchi Advogados, revela que os valores relativos às férias deverão ser pagos proporcionalmente em cada um desses períodos gozados. “E as férias não podem começar nos dois dias antes de um feriado ou do dia de descanso na semana”.
A advogada especializada em Direito do Trabalho Mayra Vieira Dias, sócia do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados, destaca que a jornada de trabalho também poderá ser negociada. “Hoje, a jornada padrão é de 8 horas diárias e 44 horas semanais, totalizando 220 horas mensais podendo haver até duas horas extras por dia. Com a reforma aprovada, as horas extras poderão ser negociadas livremente entre o trabalhador e o empregador, inclusive com a livre negociação coletiva, poderá remanejar a jornada de 44 horas semanais livremente entre os dias da semana”, diz.
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