As possíveis alterações nas leis previstas no texto da reforma trabalhista poderão aumentar o número de acidentes de trabalho no Brasil, mas não deverão afetar as leis que regem as relações do trabalhador que se acidenta em atividade. A reforma previdenciária, aprovada até o momento, não deve alterar nenhum ponto relacionado aos benefícios por incapacidade do segurado do Instituto Nacional do Segurado Social.
Na visão de especialistas a flexibilização da jornada de trabalho e a diminuição do intervalo intrajornada e o fortalecimento dos acordos individuais, colocam em risco a saúde e segurança do trabalhador, o que pode gerar um número maior de acidentes de trabalho no país.
“Com a regulamentação da terceirização nos termos atuais da reforma trabalhista, que não garante uma fiscalização efetiva, o mapeamento das condições de segurança e saúde do trabalhador ficaram mais difíceis”, avalia a advogada Lariane Rogéria Pinto Del-Vechio advogada das áreas trabalhista e previdenciária do Aith, Badari e Luchin Advogados.
O Brasil é um dos países onde se registra o maior número de acidentes de trabalho por ano em todo o mundo. De acordo com dados recentes, o país registra mais de 700 mil acidentes de trabalho por ano, e ocupa o quarto lugar no mundo nesse aspecto, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Fica atrás apenas de China, Índia e Indonésia.
O professor da pós-graduação da PUC-SP e doutor em Direito do Trabalho Ricardo Pereira de Freitas Guimarães acredita que a proposta de reforma trabalhista tem equívocos. “As medidas contrariam inúmeras convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a nossa própria legislação, pois cria possibilidade de parcelamento de férias, jornada excessiva, entre outras medidas. Por exemplo, no caso das horas extras, estudos comprovam que inúmeros acidentes de trabalho acontecem na extensão da jornada de trabalho. E parcelar férias vai contra o direito de descanso do empregado”, afirma.
Freitas destaca que as novas regras deixam claro que o Governo Federal fez uma opção pela economia e não pelo lado humano do trabalhador.
O acidente do trabalho é aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço do empregador e que provoca lesão corporal ou perturbação funcional que causa a morte, perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para a atividade laboral.
“Sua configuração se dá em acidentes sofridos no local e horário de trabalho, inclusive nos intervalos para refeição e descanso, fora do local de trabalho se sob execução ou a serviço do empregador. Além disso, são considerados acidentes a doença proveniente de contaminação no ambiente de trabalho, em viagem a serviço, no percurso residência x trabalho e até mesmo em uma agressão sofrida por um colega de trabalho. Doença de trabalho ou doença profissional que constem na relação elaboração pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social também serão consideradas acidente de trabalho. Exemplo disso é a perda da audição provocada por ruído”, afirma Marcella Mello Mazza advogada do escritório Baraldi Mélega Advogados.
Ocorrido o acidente do trabalho, caso seja necessário, conforme avaliação médica, o trabalhador poderá se afastar do trabalho por licença médica. “E, se essa licença for superior a 15 dias, passará a receber os benefícios previdenciários previstos na legislação para o caso concreto”, explica Fernanda Brandão, pós-graduada em Direito do Trabalho e advogada de Furtado e Pragmácio Filho Advogados Associados.
“O trabalhador poderá pleitear a reparação civil do empregador, que poderá ser condenado na Justiça do Trabalho, a indenizar o acidentado em danos morais e materiais, com pensão e/ou reparação dos gastos com tratamento médico”, observa Fernanda Brandão.
De acordo com a advogada especializada em Direito do Trabalho Mayra Vieira Dias, sócia do escritório Yamazaki, Calazans e Vieira Dias Advogados, o segurado do INSS que sofrer acidente de trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de 12 meses, da manutenção de seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente da percepção de auxílio-acidente. “E reconhecidos pela perícia médica do INSS a incapacidade para o trabalho e o nexo entre o trabalho e o agravo, serão devidas as prestações acidentárias a que o beneficiário tenha direito”, alerta.
Deveres da empresa
Os especialistas afirmam que é dever da empresa, em caso de acidente de trabalho do funcionário, a comunicação do acidente do trabalho à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência.
“E, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário-de-contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social. Deverão ser comunicados os acidentes ocorridos com o segurado empregado (exceto o doméstico), o trabalhador avulso, o segurado especial e o médico-residente”, orienta Mayra Dias.
Segundo Tassiana Oliveira advogada do escritório Stuchi Advogados, a empresa que não realizar esta comunicação poderá ser penalizada. “Caso a empresa não realize a comunicação do acidente, podem formalizá-la o próprio acidentado, seus dependentes, a entidade sindical competente, o médico que o assistiu ou qualquer autoridade pública, não prevalecendo nestes casos o prazo de apenas um dia útil. Nesta hipótese, a empresa permanecerá responsável pela falta de cumprimento da legislação. Caberá ao setor de benefícios do INSS comunicar a ocorrência ao setor de fiscalização, para a aplicação e cobrança da multa devida”, alerta.
Mayra Vieira ressalta que a empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador. “Constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho. E nos casos de negligência quanto às normas de segurança e saúde do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a previdência social proporá ação regressiva contra os responsáveis”, pontua a advogada.
Benefícios previdenciários
E caso a reforma trabalhista gere um maior número de acidentes, os cofres da Previdência Social também poderão ter prejuízo. O trabalhador que sofre acidente do trabalho tem direito aos seguintes benefícios previdenciários: auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou mesmo pensão por morte, para seus dependentes. “Esses benefícios passam a ser considerados benefícios acidentários”, diz Geancarlo Borges Caruso, do escritório Aith, Badari e Luchin.
O especialista destaca que para tenha direitos aos benefícios previdenciários decorrentes do acidente de trabalho é obrigatória a realização de perícia médica junto ao INSS.
“O perito analisará se a incapacidade é total, parcial, temporária ou permanente. De acordo com essa avaliação, o segurado pode ter direito a receber um benefício de auxílio-doença – para incapacidade laboral parcial e temporária; ou aposentadoria por invalidez – para incapacidade laboral total e permanente. Se a lesão for de tal forma incapacitante e não permitir a reabilitação, o segurado tem o direito a se aposentar por invalidez. Se, após a reabilitação, o trabalhador ficar com uma sequela que comprometa a sua funcionalidade, poderá requerer o auxílio-acidente, que será ser pago pela previdência social mesmo com o retorno do trabalhador às suas atividades. Na hipótese de falecimento, o INSS pagará aos dependentes do trabalhador o benefício da pensão por morte”, esclarece.
O auxílio-doença acidentário é um benefício pecuniário de prestação continuada e corresponde a 100% do valor do salário de benefício do segurado do INSS. “Esse benefício possui prazo indeterminado e está sujeito à revisão periódica, sendo pago mensalmente ao acidentado urbano ou rural, que sofreu acidente do trabalho ou doença advinda das condições de trabalho e apresenta incapacidade transitória para exercer seu labor, sendo requisito o afastamento do trabalhador pelo prazo mínimo de 15 dias. A incapacidade é total, porém provisória”, orienta o advogado especializado em Direito Previdenciário João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
Já o auxílio-acidente é uma “indenização”, ou seja, devido de forma indenizatória ao empregado – com exceção ao empregado doméstico – que sofreu acidente de qualquer natureza e teve sua capacidade laborativa diminuída, apresentando sequelas que o impeçam de exercer sua atividade. “Consiste no recebimento de quantia equivalente a 50% do seu salário de benefício, até que o empregado se aposente ou venha a óbito”, pontua Badari.
Alteração positiva
No último dia 9 de maio, a Comissão Especial da Reforma da Previdência concluiu a votação dos destaques ao relatório do deputado Arthur Maia (PPS-BA). Agora, o texto está liberado para ser levado ao plenário da Câmara. A expectativa é que a votação ocorra nos próximos dias, em dois turnos. A única alteração aprovada por todos os partidos que têm representação na comissão é a que mantém na Justiça estadual a competência para julgar casos relacionados a acidentes de trabalho e aposentadoria por invalidez.
João Badari considera positiva a aprovação desta proposta, pois encaminhar as questões de acidente de trabalho e aposentadoria por invalidez para a Justiça federal tornaria o processo mais moroso.
“O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) é o maior réu do País, e a Justiça federal ficaria ainda mais sobrecarregada com ações envolvendo questões acidentárias previdenciárias para decidir. Com isso, o processo iria ficar mais moroso. Foi um ponto positivo”.
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