Oswaldo de Oliveira pretende voltar a trabalhar como técnico em janeiro. O ex-técnico do Santos recusou propostas tão logo deixou o time da Vila Belmiro, em setembro. Oswaldo disse que ficou magoado e surpreso com a demissão. No Santos, ele enfrentou um problema que havia vivido no Botafogo: atraso de salários. “Nunca pagaram normalmente, sempre atrasou”, disse ele em entrevista exclusiva, por telefone, ao jornal O Estado de S. Paulo. Três meses de salário e a rescisão contratual ainda não foram pagos.
Descansando no Rio de Janeiro, o técnico falou das dificuldades do Botafogo, da sua preferência por trabalhar com jovens jogadores e do momento da seleção e do futebol brasileiro após a queda nas semifinais da Copa do Mundo e do recomeço de trabalho de Dunga à frente do time nacional. “A gente vem trocando filosofia, de treinador, há bastante tempo. Nem o ciclo da Copa de 4 anos é respeitado.” A seguir os principais trechos da entrevista publicada nesta segunda-feira.
ESTADÃO – O que o futebol brasileiro aprendeu ou deveria ter aprendido depois dos 7 a 1? Como você analisou as críticas ao futebol brasileiro?
Oswaldo – Aprendi com o Maracanazo de 1950 que as coisas têm que acontecer e se desenvolver para que todos tenham uma visão importante. Isso está acima de interpretar as coisas como lição. Quando o Brasil ganhou Copa das Confederações, todo mundo passou a considerar a seleção favorita a ganhar a Copa. Por motivos óbvios. Ganhou da Espanha com autoridade e jogando um futebol atual e competitivo. Só que passou um ano até a Copa e só aí sentimos como as coisas no futebol brasileiro são mal-arrumadas. A gente vem trocando filosofia, de treinador, há bastante tempo. Nem o ciclo da Copa de 4 anos é respeitado.
ESTADÃO – Mas a impressão que ficou pós-Copa é que a Alemanha jogou um outro futebol…
Oswaldo – Mas se pensarmos de forma racional, vamos chegar à conclusão que não. É só olhar a trajetória da Alemanha na Copa do Mundo. A Alemanha levou 120 minutos para ganhar da Argélia. E foi ameaçada o tempo todo. Claro que a Argélia nem se compara com o Brasil e que a Alemanha não entrou tão preparada como quando entrou contra o Brasil. O que eu quero dizer é que a gente não respeita o ciclo. Não era a diferença do futebol que a Alemanha joga, nossos jogadores jogam na Alemanha, na Itália, na Espanha, na França. Não é essa a diferença. A diferença é a maneira como nos preparamos tudo, além da carga emocional, que foi muito grande. Está muito cedo ainda. Eu estou te falando do Maracanazo. A gente ainda vai levar muito tempo para perceber tudo que aconteceu.
ESTADÃO – O Felipão também não teve um ciclo em 2002 e foi campeão do mundo.
Oswaldo – Mas aí ele tinha Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho, era um timaço. Por isso que eu digo: o futebol está passando por uma transição. É lógico o craque faz diferença, Cristiano Ronaldo e Messi pilotaram suas seleções e não ganharam de jogadores de um palmo abaixo deles. Os alemães é que ganharam, eles se reuniram em volta de uma filosofia de jogo.
ESTADÃO – Falando sobre categorias de base, tem técnico que não gosta de trabalhar com jogador jovens?
Oswaldo – É difícil falar dos outros, falo por mim, gosto de trabalhar com jogador bom, independentemente da idade. Gosto de trabalhar com jovem porque ele normalmente é mais acessível, tem mais vontade de apreender e se expõe mais que alguns jogadores que mais estabilizados. Ficou essa marca no meu trabalho. Quando um jogador jovem amadurece e passa na frente de outros é uma coisa empolgante porque você está descobrindo um valor. Ele iria fatalmente aparecer, mas como você tem essa forma de trabalho, e ele aparece antes do tempo previsto.
ESTADÃO – Você comandou o Botafogo por duas temporadas. Como o Botafogo chegou a situação de extrema crise financeira?
Oswaldo – Se não fosse o caso do Engenhão, a situação estaria como a da maioria dos clubes brasileiros. A dificuldade financeira é uma questão estrutural, mais longa. Acho que o Botafogo já tinha problemas financeiros. Quando perdeu o Engenhão tudo se agravou, porque toda a estrutura do futebol do Botafogo girava em torno do Engenhão. O estádio supria o Botafogo no aspecto financeiro, no marketing, e na estrutura do futebol. Isso agravou muito, que já era a situação ruim.
ESTADÃO – Como é treinar um time de Série A em que os jogadores não recebem salários? Você não recebia salários em dia…
Oswaldo – É muito difícil, mas depende muito do que você tem, por sorte tínhamos um grupo muito bom, muito maduro e foi fácil de convencê-los de que se nós não vencêssemos, se não fôssemos bem-sucedidos, a situação se agravaria muito mais. Parti desse princípio, tentei coordenar as coisas voltando para o objetivos que nós tínhamos (foi campeão carioca e conseguiu vaga na Libertadores). E o tempo todo os salários estavam atrasados.
ESTADÃO – Você também teve problema no Santos? Você ficou surpreso?
Oswaldo – Muito surpreso, claro, porque inclusive um dos argumentos do Santos para que eu fosse para lá era que no Botafogo eu tinha três meses de salários atrasados e isso no Santos não acontecia. Isso me surpreendeu muito, sim.
ESTADÃO – Você ficou quantos meses sem receber salários no Santos?
Oswaldo – Eu estou sem receber ainda, o Santos não me pagou três meses de salários de atrasados, mais a rescisão contratual (Oswaldo foi demitido dia 2 de setembro), ainda não recebi.
ESTADÃO – O atraso aconteceu nos meses que antecederam a demissão?
Oswaldo – Não, nunca pagaram normalmente, sempre atrasou. Nem o primeiro salário eu recebi em dia no Santos. Dava dois (meses), aí quando chegava no terceiro, eles pagavam um (mês), para você ter uma ideia, o último salário que eu recebi foi em maio e eu saí em setembro. Não falam nada, já pedi, já liguei, dizem que não têm dinheiro.
ESTADÃO – Você ficou revoltado, magoado com a maneira que saiu do clube?
Oswaldo – Magoado, sim, revoltado, não. Realmente foi surpreendente, o trabalho vinha sendo desenvolvido, todo mundo sabia que estava acontecendo. Fiquei muito magoado e muito surpreso.
ESTADÃO – Afinal, o que aconteceu com o Leandro Damião?
Oswaldo – Fiquei pouco tempo, não o conhecia bem, é um jogador que em suma sentiu demais o peso da transação, isso é que eu acho, foi muito badalado, só se falava nisso, havia a expectativa antes de ele estrear e coincidiu com o bom momento do Gabriel. É um jogador de grande aproveitamento no Inter, com passagem na seleção, e infelizmente até hoje não rendeu o que se esperava dele.
ESTADÃO – Depois que você saiu do Santos, você foi procurado por outras equipes?
Oswaldo – Imediatamente após me procuraram, mas eu preferi parar um pouco, agora tem acontecido sondagens, tem um clube japonês, um dos Emirados Árabes, mas eu só vou trabalhar mesmo em janeiro, a não ser que algo excepcional aconteça, eu preciso trabalhar já que o Santos não me paga…eu pago minhas contas… a luz, o gás, o telefone, a gasolina, o condomínio.
ESTADÃO – Você é cotado para assumir o Corinthians em 2015. Gostaria de voltar ao clube?
Oswaldo – Olha, o momento é inadequado para falar essas coisas, o Campeonato Brasileiro está em andamento, eu não acho legal falar desse assunto, tenho uma ligação com o Corinthians, gosto muito, mas isso não quer dizer que eu vá voltar ao Corinthians. O Mano está lá, está fazendo o trabalho, acho que não é adequado falar esse tipo de coisa.
ESTADÃO – 0 Qual Corinthians foi melhor: o seu, que ganhou o Mundial em 2000, ou o do Tite, em 2012?
Oswaldo – Eu não acompanhei de perto a trajetória do time de 2012 porque eu estava no Japão. Vi o Corinthians jogar e acho que é um time muito bom o do Tite, mas acho que os valores individuais do time de 2000 eram melhores.