Na semana em que a Câmara dos Deputados se prepara para votar mudanças no regramento para atividades de advocacia, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) se uniram para subscrever uma nota contra o projeto de lei pautado em regime de urgência no plenário.
No documento, tornado público nesta quarta-feira, 16, as entidades argumentam que os efeitos práticos da proposta de autoria do deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) seriam a blindagem de crimes cometidos por advogados. "Carta branca para a prática de lavagem de dinheiro, algo jamais visto no Brasil ou no exterior", dizem as associações.
O texto altera o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para incluir disposições sobre a atividade privativa de advogado, a fiscalização, a competência, as prerrogativas, as sociedades de advogados, o advogado associado, os honorários advocatícios e os limites de impedimentos ao exercício da advocacia.
Entre as mudanças propostas, estão a exigência de provas periciadas e validadas pelo Poder Judiciário para autorizar o cumprimento de mandados de busca e apreensão em escritórios de advocacia ou a homologação de acordos de colaboração premiada que envolvam advogados. Pela norma, mero indício, depoimento ou colaboração premiada não bastam para justificar a medida cautelar ou a formalização da delação.
Outra regra transfere ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil competência privativa para analisar e decidir sobre a regularidade da prestação do serviço jurídico pelo advogado, em processo disciplinar próprio e resguardado o sigilo – o que, na avaliação da Conamp e da ANPR, abre margem para dificultar investigações envolvendo lavagem de dinheiro via contratos simulados com bancas de advocacia.
"A criação de uma casta de privilegiados e blindados para a prática de crimes não encontra amparo na Constituição da República e nas leis de nosso país ou estrangeiras, assim como nos tratados internacionais. O advogado é indispensável à democracia e à Justiça. Este papel, no entanto, não pode se constituir em salvo conduto para o cometimento de atos ilícitos, nem significar tratamento diferenciado quando se trata de ato criminoso", afirmam a Conamp e a ANPR.
Na justificativa do projeto de lei, o deputado Paulo Abi-Ackel diz que o reforço das prerrogativas dos advogados tem o escopo de proteger a sociedade civil de atos de arbítrio estatal.
A votação foi marcada menos de três meses após um desdobramento da Operação Lava Jato tornar réus advogados suspeitos de envolvimento em um esquema de tráfico de influência que, segundo o Ministério Público Federal, desviou R$ 151 milhões do Sistema S (Fecomércio, Sesc e Senac) do Rio.