O governo pagou, indevidamente, nos últimos cinco anos, R$ 3 bilhões em aposentadoria a produtores rurais que são classificados como segurados especiais. Esse grupo, que inclui pescadores artesanais, seringueiros e extrativistas, recebeu o benefício sem ter direito a ele, segundo uma auditoria do Ministério da Transparência. Se esses pagamentos não forem suspensos, a conta, daqui para frente, ficará em R$ 1,2 bilhão por ano.
A conta das aposentadorias rurais sempre fica no vermelho porque o número de pessoas que recebem o benefício é maior do que o de trabalhadores que contribuem para o INSS. Em 2017, o déficit da Previdência rural ficou em R$ 110,7 bilhões – aumento de 7% em relação a 2016.
A partir do resultado da auditoria, o órgão deu um prazo de 30 dias para o INSS traçar um plano de ação à revisão dos benefícios. Os auditores cobram do instituto a suspensão dos benefícios irregulares, a apuração das responsabilidades pelas concessões e o ressarcimento dos valores.
Esse tipo de benefício previdenciário se enquadra na categoria de segurado especial, que tem tratamento diferente dos demais aposentados. Abrange 97 mil pessoas.
Entre as irregularidades apontadas pelos auditores estão o recebimento da aposentadoria por beneficiários que se mantinham trabalhando. Pelas regras, não pode receber o benefício integrante da família que possuir outra fonte de rendimento, exceto em casos específicos. Também há casos de pagamentos a donos de propriedade rural, o que também é irregular.
Enquanto o segurado comum do INSS recolhe contribuição previdenciária incidente sobre seus salários (de 8% a 11%), o segurado especial contribui com uma alíquota muito reduzida, de 2,1%, sobre o resultado da receita de sua produção. Além disso, o segurado comum precisa cumprir um número mínimo de contribuições mensais para fazer jus ao benefício previdenciário. Para o segurado especial, a exigência de contribuições é contada em número de meses em que houve exercício efetivo de atividade rural ou pesqueira, ainda que não sejam meses consecutivos.
A auditoria foi feita cruzando dados do sistema do INSS com banco de informações do Ministério do Trabalho.
“Tem muito mais o que cortar porque o grande problema da aposentadoria rural é a fraude. Muitas vezes, o INSS nega, o cara pega uma declaração do sindicato de que é trabalhador rural, mesmo não sendo, e o juiz dá o benefício”, disse Leonardo Rolim, consultor da Câmara.
Controle
Para os auditores, a falta de controles para a manutenção do benefício levou ao pagamento irregular. A recomendação é que essa verificação seja feita previamente à concessão do benefício e durante o seu período de pagamento.
O INSS respondeu que a confirmação de fraudes e irregularidades dependerá da análise de cada processo nas agências. “Cabe salientar que as situações inicialmente verificadas pela CGU não configuram, a priori, irregularidades, mas sim indícios, que devem ser verificados caso a caso”, afirmou, em nota. A autarquia destaca também que 40% de cerca de 70 mil benefícios foram concedidos por determinação judicial. Para revertê-los, é preciso uma decisão da Justiça.
A auditoria durou um ano e teve início em fevereiro de 2017, quando o debate em torno da reforma da Previdência estava em alta no País, depois do envio ao Congresso de uma proposta de mudanças nas regras. O projeto inicial do governo previa combate às fraudes com um aperto maior na concessão da aposentadoria rural, mas a proposta foi amplamente combatida no Congresso e, depois, abandonada.
No projeto da reforma da Previdência, o governo tentou criar uma contribuição obrigatória para os produtores rurais que trabalham em regime familiar, com uma alíquota inferior à dos demais contribuintes. A arrecadação seria pequena, mas a medida teria como efeito favorável um controle maior para evitar fraudes. A medida acabou sendo excluída do texto na tentativa do governo de aprovar uma versão mais enxuta. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.