A ruptura de um duto localizado no subsolo do Itaquerão deu início a uma sucessão de eventos que terminaram com a queda do guindaste que matou dois operários em novembro de 2013, durante as obras de construção do estádio do Corinthians, que foi um dos principais palcos da Copa do Mundo de 2014. Essa é a conclusão de laudo feito pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) sobre o acidente. A investigação levou quase dois anos para ser concluída e foi encomendada pelo Ministério do Trabalho.
Por meio da Lei de Acesso à Informação, a reportagem do jornal O Estado de S. Paulo obteve cópia do documento de 146 páginas assinado por seis engenheiros do instituto. O laudo aponta que, após a ruptura do duto de 1,20 metro de diâmetro, o solo afundou e houve sobrecarga de peso na parte posterior esquerda do guindaste. Na sequência, ocorreu uma inclinação maior do que o suportado pelo equipamento, o que acabou causando a queda.
O guindaste tombou no momento em que erguia a 38.ª e última peça metálica que faltava para finalizar a cobertura da arquibancada do Itaquerão. A queda da estrutura de 420 toneladas causou a morte do motorista Fábio Luiz Pereira, de 42 anos, e do montador Ronaldo Oliveira dos Santos, de 44.
No laudo, o IPT critica o fato de não ter sido feita avaliação sobre a tubulação enterrada de água pluviais existente no trajeto da máquina, nem se o duto suportaria a pressão do guindaste nas condições em que ele foi instalado. Esse avaliação deveria ter sido realizada pela Odebrecht, empreiteira responsável pela construção do estádio.
Análise do solo feita pelo IPT detectou também que, exatamente abaixo do ponto de maior afundamento do guindaste, a terra tinha uma mistura de restos de raízes, folhas e galhos de vegetação. “Esse material, que por si só constitui-se num colchão de baixa capacidade de suporte, não ofereceu apoio adequado para a compactação do aterro”, diz trecho do laudo.
De acordo com o IPT, o guindaste era operado sobre um terreno com brita e pó de pedra e desníveis, alguns superiores a dez centímetros, contrariando as recomendações do manual do fabricante, que determina que a máquina tem de se “mover sobre um terreno plano, estável e nivelado”.
Outro erro apontado no documento é de que não houve isolamento adequado da área durante as operações do guindaste. “A própria ocorrência de duas mortes, envolvendo pessoas que não tinham relação direta com a operação, demonstra que houve falhas na execução dos itens de prevenção.”
DEFESA – Procurada pela reportagem, a construtora Odebrecht afirmou que “estudos realizados por renomados especialistas descartaram a possibilidade de o solo e/ou o subsolo, incluindo as estruturas de drenagem, na área de operação do guindaste, ter sido a causa do acidente ocorrido durante as obras da Arena Corinthians”.
A Odebrecht também criticou o laudo feito pelo IPT. “Apresenta diversas inconsistências técnicas que serão oportunamente apresentadas. Além disso, ele é apenas mais um entre os demais estudos e evidências que estão sendo analisados pelas autoridades.”
A Locar, empresa responsável pela operação dos guindastes, é citada em vários momentos do laudo. Segundo o IPT, a Locar não levou em conta o Plano de Rigging (planejamento de içamento da peça) original sem comunicar esse fato com a Odebrecht.
A Locar também estaria operando o guindaste com um datalogger (espécie de caixa-preta) inoperante desde o mês de novembro de 2012. Ainda que não seja um equipamento de uso obrigatório pela legislação, o IPT alerta que, “se existe, é para ser bem utilizado”.
Em nota enviada à reportagem do jornal O Estado de S. Paulo pela assessoria, a empresa diz que “há dois laudos conclusivos que demonstram ter sido o solo a causa do desabamento”. A Locar alega que esses documentos “têm conteúdo e conclusões irrefutáveis e anulam argumentações em contrário”.