Só existe uma resposta diante da corrupção: levar os responsáveis aos tribunais e puni-los, seja quem for. O alerta é da ex-juíza e deputada europeia Eva Joly. A franco-norueguesa ganhou notoriedade por julgar a cúpula da petroleira Elf nos anos 90 e revelar como a estatal francesa havia irrigado com dinheiro da corrupção o sistema político do país. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Joly conta como lidou com o que foi chamado na época de “o maior escândalo de desvio de dinheiro do mundo ocidental”.
Para a ex-juíza, que chegou a ser candidata à presidência da França em 2012 pelo Partido Verde, o caso da Petrobras e o da Elf têm “enormes similaridades”. Durante a entrevista, mostrou que conhece o caso da Petrobras e os desafios do governo brasileiro.
Em 1996, ela iniciou um caso que abalaria o mundo político e judicial francês. Ao fim de oito anos de investigação, 42 pessoas foram acusadas de corrupção – inclusive ministros, o CEO da empresa e intermediários que desviaram 305 milhões nos anos do governo do socialista François Mitterrand (1988-1995). O CEO da Elf entre 1889 e 1993, Loïk Le Floch-Prigent, foi condenado a cinco anos de prisão e pagou multa de 375 mil. Dos 42 acusados, 30 cumpriram penas.
Ela é clara em seu alerta. “Não se iludam. O dinheiro desviado não foi usado só para pagar campanhas políticas. Acima de tudo, foi usado por políticos e executivos para se enriquecerem de forma ilícita. Para cada barril de petróleo vendido, parte jamais chegou ao povo”.
Questionada se corrupção em grande escala é sinal de crise no sistema político, a ex-juíza declara: “A corrupção é um crime. Isso precisa ficar claro”. “Não há explicações ou justificativas que possam ser usadas como motivação. Agora, a realidade é que a democracia brasileira estará ameaçada se não houver uma limpeza na Petrobras e no sistema político do País, depois do escândalo”.
Comparando com o caso Elf, o impacto de um escândalo de grande dimensão para a Petrobras, “é um desafio e representa um dano para a democracia”, diz Eva Joly. “A corrupção em larga escala tem um impacto que vai muito além de uma empresa. Ele impede, por exemplo, que novas forças políticas ou jovens possam competir nas eleições. Quando quem está no poder ganha dinheiro com o petróleo, eleições livres não existem na prática”, completa.
Petróleo
Eva Joly avalia que “a corrupção faz parte da história do setor” do petróleo. “Não era uma questão de saber se a propina era paga, mas como e quanto isso se dava. Um dos diretores com quem eu falei no caso Elf chegou a me contar que sua preocupação, em certo momento, não era acabar com a corrupção – mas simplesmente conseguir que ela fosse mantida em 2,5% do valor dos contratos. Ficou claro que era algo enraizado na empresa, assim como parece ser o caso da Petrobrás. Na Elf, o dinheiro da corrupção ainda irrigava políticos em dezenas de países, ditadores africanas e outros tantos. E isso não era algo exclusivo da Elf, pelo que me diziam já na época. O setor é dos mais corruptos”, diz a ex-juíza.
“No caso da Elf, o dinheiro era compartilhado entre políticos e chefes da empresa. Eles levaram uma grande parte”, afirma Joly sobre o destino do dinheiro do petróleo. “Não se iludam, o dinheiro não foi usado só para pagar campanhas, foi usado para enriquecer políticos e executivos. De cada barril de petróleo vendido, parte jamais chegou ao povo. Na França, apenas 5% do dinheiro desviado financiou partidos. O restante foi para os políticos. Eles compraram mansões, joias, propriedades. Quando o dinheiro vem da corrupção, não há limites.”
Para a Joly, se não houver uma “limpeza” e se não for explicado como o esquema funcionou, é a democracia que estará ameaçada. “A chefia da empresa e os envolvidos que sabiam e não fizeram nada precisam deixar seus cargos. Isso é o que vai preservar a democracia. Agora, a Justiça precisa tomar cuidado para não cair em armadilhas, como a questão da sentença de prisão. A Justiça precisa garantir que os culpados cumpram suas penas na cadeia, seja quem for. Esse é um sinal forte que a sociedade espera para restabelecer a credibilidade de um sistema.”
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.