Com atraso de 31 horas, a 20.ª Conferência das Partes sobre Mudança Climática (COP-20), de Lima, terminou na madrugada de ontem com a aprovação do conjunto de decisões essenciais para a negociação do novo acordo em novembro de 2015, em Paris. Reformado “cirurgicamente” para se adequar às exigências dos países emergentes e em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, o documento superou impasses e obteve consenso imediato dos 195 países à 1h20 (4h20, no horário de Brasília).
“Vamos fazer de Paris um grande sucesso”, afirmou o presidente da COP-20 e ministro do Meio Ambiente do Peru, Manuel Pulgar-Vidal, ao se referir a um possível acordo multilateral para dar ao mundo a chance de chegar ao fim deste século com o aumento de até 2°C em sua temperatura média. Sem o acordo, os termômetros subirão bem mais, conforme alertaram os estudos do Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC).
“Todos sabemos o que se passou em Copenhague (na fracassada tentativa de chegar ao acordo climático, em 2009). Graças a seus esforços, o fantasma de Copenhague está mais longe, e o sucesso de Paris, mais perto”, disse o ministro francês de Relações Exteriores, Laurent Fabius, que presidirá a COP-21.
Na tarde de sábado, Pulgar havia chamado para si a responsabilidade de elaborar um novo texto de decisão de Lima mais palatável ao bloco emergente e em desenvolvimento, sem gerar maior atrito com o mundo desenvolvido. Ele havia fracassado, horas antes, em sua tentativa de aprovar uma versão anterior, considerada “desequilibrada” e desprovida dos elementos basilares para uma negociação climática justa em 2015 pelo bloco em desenvolvimento.
Todas as delegações estavam cientes de que o sucesso da COP de Paris dependia do documento de Lima. O acordo climático de Paris, se não cair nas mesmas armadilhas de Copenhague, substituirá o Protocolo de Kioto em 2020. O documento de Lima, ao final, traçou as bases sobre as quais os países apresentarão, ao longo do primeiro semestre, seus compromissos de redução de emissões e de adaptação à mudança climática. Trata-se da espinha dorsal do acordo de Paris, a partir do qual serão decididas as obrigações adicionais.
“Em Lima foi fechado o acordo antes do acordo (definitivo)”, afirmou o especialista britânico Michael Jacobs, conselheiro sênior do New Climate Economy e professor da London School of Economics.
Princípios
Nas negociações, os emergentes do Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China) e os membros do G77 (grupo dos países em desenvolvimento e dos mais pobres) fizeram valer suas posições em favor de dois princípios caros. O primeiro é a necessidade de os compromissos dos países mais ricos abrangerem também os meios de financiamento, de capacitação e de transferência de tecnologia para os mais pobres cumprirem metas. Essa premissa consta da Convenção do Clima, de 1992.
Países em desenvolvimento e pobres se mobilizaram para sublinhar esse tópico no documento e para impedir que a versão anterior, com menção frouxa a esse conceito, fosse aprovada. Europeus e americanos preferiam vê-lo apagado, mas acabaram acatando, no final.
O principal negociador brasileiro, embaixador José Antônio Marcondes Carvalho, considerou insuficiente a ênfase a esse princípio. “Não fomos tão longe na decisão de hoje (ontem). Mas aceitamos o compromisso proposto e continuaremos a trabalhar por um acordo robusto e ambicioso com base na Convenção do Clima”, afirmou.
O outro princípio registrado com ênfase foi o da “responsabilidade comum, mas diferenciada”. Definido em 2011, na COP de Durban, ele prevê que os países desenvolvidos terão de assumir obrigações adicionais mais ambiciosas de redução de emissões de gases, compatíveis com o fato de estarem despejando gases na atmosfera desde meados do século 18. Emergentes – mesmo os campões de emissões China e Índia – e os países em desenvolvimento e pobres teriam uma carga menor.
Informações
O documento também trouxe de forma mais específica a obrigação de os países apresentarem informações precisas sobre seus compromissos iniciais, a serem registrados ao longo do primeiro semestre de 2015 – entre eles, o ano-base para a comparação de seus compromissos de redução de emissões, essencial para uma noção mais clara de seus efeitos sobre a contenção do aquecimento.
Novas rodadas já estão agendadas para Genebra, em fevereiro, e Bonn, em junho. Os países desenvolvidos deverão apresentar seus compromissos até março. Os demais, até junho. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.