Sem receber o repasse obrigatório do governo do Estado desde que foi criado, há 13 anos, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) da capital paulista sofre com a falta de viaturas e de profissionais e tem deixado de atender 41% das ocorrências recebidas. O quadro fez o Ministério Público Estadual (MPE) entrar com ação civil pública na Justiça, no dia 2, pedindo que o Estado seja obrigado a participar do custeio do serviço, conforme prevê norma federal. O governo diz que ainda não foi notificado.
Segundo portaria do Ministério da Saúde, o financiamento do Samu deve ser compartilhado pela União, que deve arcar com 50% das despesas; pelo Estado, que tem de contribuir com 25%; e pelo município, responsável pelos outros 25%. Na cidade de São Paulo, no entanto, o governo federal investe R$ 42 milhões por ano no serviço e a Prefeitura entra com R$ 32 milhões – cerca de R$ 11 milhões a mais do que o previsto na portaria. O governo do Estado não repassa nada.
E os valores não incluem os gastos com folha de pagamento, pagos integralmente pelo Município. Segundo a Promotoria, a falta de repasse estadual é a principal causa dos problemas do Samu verificados em inquérito aberto em 2014.
A investigação do MPE verificou que o porcentual de ocorrências abertas não atendidas pelo Samu passou de 27%, em janeiro de 2015, para 41% em maio deste ano. O tempo de espera para o atendimento é outro problema. Nos casos mais graves, a ambulância demora de 12 a 50 minutos para chegar ao paciente. Em situações menos graves, a espera passa de 1h30. As zonas leste e norte são as que registram a maior demora.
“O serviço só vai melhorar com mais investimento. Colocar duas ou três ambulâncias a mais não vai resolver o problema. Se não ficar claro que a responsabilidade é tanto do Estado quanto do Município, essa medida vai ser só um paliativo”, diz Dora Martin Strilicherk, promotora da Saúde Pública responsável pela ação.
No documento, o MPE destaca que “para a redução do tempo de atendimento, seriam necessários, no mínimo, mais 50 viaturas e 750 servidores, pois a carência da frota e de recursos humanos (enfermeiros, médicos e motoristas), agravada pela extensão do território da cidade de São Paulo, são obstáculos à prestação eficiente de serviço de saúde de urgência”. Hoje, o serviço tem 220 carros e 2,6 mil funcionários.
PGE
Antes de ingressar com a ação, a promotora diz ter tentado firmar um acordo com o governo do Estado para que o repasse da verba estadual ao Samu fosse iniciado, sem sucesso. Procurada, a Secretaria Estadual da Saúde informou que a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) seria responsável por se pronunciar sobre o caso por envolver decisão judicial. O órgão informou que ainda não foi citado e, “assim que isso ocorrer, analisará a decisão e definirá qual providência adotará”.
Segundo a promotora, durante o inquérito o governo do Estado alegou que não participava do custeio do Samu por já investir no serviço de resgate do Corpo de Bombeiros, argumento não aceito pela Promotoria. “O serviço de resgate só tem 50 viaturas e 6 médicos, e atende quase que somente traumas”, afirma Dora. Ela diz que apenas dois Estados brasileiros não contribuem para o custeio do Samu: São Paulo e Rondônia.
Também procurada para comentar as falhas no Samu, a Secretaria Municipal da Saúde disse que nem todo chamado requer atendimento e o aumento de ocorrências não atendidas também está associado ao crescimento do número de chamados de baixa gravidade, que apenas passam pela triagem e são resolvidos pela central de regulação médica. Informou ainda que o tempo de resposta médio para as ocorrências mais graves, classificadas como prioridade 1, é de 12 minutos.
Juiz dá 30 dias para a integração com os bombeiros
Um primeiro pedido feito em caráter de urgência pela Promotoria na ação civil pública já foi acolhido pela Justiça no dia 6 deste mês. Nele, o MPE pede ao Estado que promova medidas de integração entre os serviços de resgate do Corpo de Bombeiros e do Samu. Isso porque, na investigação, a Promotoria verificou que, embora os dois serviços façam atendimentos de urgência na capital, os sistemas de ambos não se comunicam. E há chamados de socorro duplicados.
O juiz Valentino Aparecido de Andrade, da 10ª Vara da Fazenda Pública, dá 30 dias para que o Estado proceda “adequada interação entre os serviços do resgate e do Samu, que compreenda o compartilhamento dos serviços de comunicação e de atendimento em local de ocorrências médicas”, sob pena de multa diária de R$ 100 mil. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.