O adiamento dos Jogos de Tóquio também trouxe dor de cabeça para os atletas. Os veteranos são os que terão maior problema para reajustar calendário e até os planos de vida, principalmente em razão da proximidade da aposentadoria. O caso mais emblemático é o do velocista Justin Gatlin.
O norte-americano pretendia se aposentar neste ano, após disputar uma Olimpíada pela quarta vez na carreira. Agora terá que adiar seu plano de despedida para 2021, quando terá 39 anos. Mas a mudança na data dos Jogos não parece desanimar o campeão olímpico dos 100 metros em Atenas-2004.
"O objetivo é competir nas Olimpíadas de 2021. Eu acho que muita gente pensa que o tempo está contra mim ou os atletas mais velhos nessa situação e isso está longe da verdade. Eu acredito que sim que posso vencer uma medalha de ouro em 2021", diz o americano, medalhista de prata nos 100m no Rio-2016.
Allyson Felix, outra representante do atletismo dos EUA, tem problema semelhante. Após dar a luz a sua filha em dezembro de 2018, ela estabeleceu os Jogos de Tóquio, até então marcados para 2020, como sua competição final. Em 2021, ela terá 35 anos e, mantido os planos de disputar sua quinta Olimpíada, terá que enfrentar mais uma temporada de vida dupla, de mãe e de atleta.
Outra mamãe que tenta estender sua carreira como esportista é Serena Williams. Ela evita apontar uma data para sua despedida das quadras. Porém, aos 38 anos, sabe que precisará manter o alto nível por mais tempo para chegar com chances de brilhar em Tóquio. E, como já tem um ouro olímpico no currículo, obtido em Londres-2012, a busca não será apenas pelo pódio, mas pelo degrau mais alto.
Com futuros indefinidos também estão Tiger Woods e Pau Gasol. Lenda do golfe, o primeiro busca sua primeira participação nos Jogos Olímpicos. Neste ano, chegou a estar na disputada zona de classificação olímpica, mas uma lesão nas costas vinha atrapalhando seu rendimento. O adiamento, portanto, pode significar tanto mais tempo de recuperação quanto a possibilidade do crescimento dos rivais do seu próprio país. Em 2021, Woods terá 45 anos.
Assim como Woods, Gasol conquistou quase tudo em sua carreira. Falta apenas o ouro olímpico para completar a coleção, que já tem duas pratas e um bronze com a seleção espanhola. Convivendo com lesões e processos de recuperação física, o atleta de 39 anos está cada vez mais perto da aposentadoria. Agora terá um incentivo extra para disputar ao menos mais uma temporada na NBA.
BRASILEIROS – O adiamento também afetou o planejamento dos atletas nacionais. Uma das mais atingidas diretamente foi a meio de rede Fabiana Claudino. Seu objetivo para este ano era se afastar das quadras após os Jogos para realizar o sonho de se tornar mãe. O plano está sendo reavaliado no momento.
"Eu estava pensando que esse seria meu último ano olímpico. Até porque tenho o grande sonho de ser de mãe. Querendo ou não, preciso sentar para me organizar, preciso conversar com a minha família, com o meu esposo, para a gente tomar a melhor decisão", diz a atleta da seleção brasileira de vôlei.
O velejador Robert Scheidt, referência do Brasil na modalidade, também precisou ajustar seus planos de vida. O dono de cinco medalhas olímpicas parou após o Rio-2016. Mas decidiu retomar os treinos e competições em 2019 justamente para disputar sua sétima Olimpíada. Nos Jogos de 2021, terá 47 anos e competindo novamente na classe Laser, que exige melhor preparo físico.
Apesar da mudança de planos de disputar a sua última Olimpíada em 2020, Scheidt disse encarar positivamente o adiamento. "Infelizmente, o mundo está vivendo um momento muito triste e a saúde é a prioridade. Considerando a preservação da saúde dos atletas e todos os envolvidos. Considerando a possibilidade de se preparar de maneira igualitária, já que alguns ainda conseguem treinar e outros não. E considerando outras implicações, como processos seletivos, o COI optou pelo caminho certo."
O ciclista Henrique Avancini, especialista no mountain bike, não ficou muito feliz com o adiamento dos Jogos, mas não por conta de uma possível aposentadoria. O atleta de 30 anos queria que o esporte exercesse seu "papel social" para inspirar as pessoas em meio à pandemia do novo coronavírus.
"Qual é o papel de impacto social do atleta e do esporte? Não somos a classe que sempre fala de superação? Que conta histórias de recomeço, de garra, de fé e resiliência?", questionou o ciclista, nas redes sociais. "Se eu posso ser entretenimento, inspiração e uma razão para acreditar no recomeço, por que eu não me sacrificaria? O mundo inteiro precisa lutar, se adaptar e seguir adiante. Nesses últimos três dias, pela primeira vez na vida tive uma ponta de vergonha por ser atleta. Que eu e meus companheiros esportistas possamos refletir nesses tempos sobre qual o nossa responsabilidade social."