Economia

Dólar é dilema para camelô na porta do BC

A cerca de 50 passos da porta de entrada do Banco Central, onde se arbitra sobre os rumos da economia, uma antiga barraca que vende nozes, castanha, pistache e amêndoas é o espelho da crise: ilustra que a volatilidade do dólar não atrapalha apenas negócios em bolsas, do mercado de derivativos e grandes exportadores. Mexe também com a rotina de pequenos empresários, que não têm acesso aos instrumentos sofisticados do mercado financeiro para se proteger. Simplesmente deixam de comercializar em tempos mais arredios.

Durante os primeiros seis meses deste ano, o dono da Banca Brasília, Antonio Cunha, de 60 anos, suspendeu a venda de seus produtos. Alegou que o câmbio estava atrapalhando. Agora, avaliou que era hora de voltar à atividade. “O dólar, apesar de mais alto do que no começo do ano, está melhor porque está estável. Dá para ter plano de negócio”, explicou.

De janeiro a junho de 2015, o dólar subiu 16% e, nos últimos 12 meses, teve alta de 40%. Para se ter uma ideia, em 30 de dezembro de 2014, fechou a R$ 2,6550 e atingiu o pico do ano em 19 de março, quando chegou a R$ 3,2950. Na sexta-feira, o dólar estava cotado a R$ 3,1220. “Com aquela loucura do dólar, que ninguém sabia para onde ia, não tinha jeito de vender, não”, lembrou o comerciante.

Cunha abriu o quiosque há dez anos e, além de balas e doces, só trabalhava com frutas secas. Em dezembro do ano passado, começou a servir refeições, como seus vizinhos, para ampliar os ganhos e diversificar o negócio. O custo de um prato nessa região, em torno de R$ 15,00, costuma sair bem mais em conta do que nos restaurantes que lotam a rua atrás do BC e cujo o preço do quilo varia de R$ 42,00 a R$ 69,90.

Trata-se de um filão para atender trabalhadores terceirizados e servidores não tão abastados da região.
O dono da banca contou que no final do ano passado comprava o quilo de amêndoas por R$ 36,00, mas que o fornecedor já o alertara que o preço iria subir. “Então, passei a vender por R$ 45,00, para tentar me proteger”, explicou. Esse mecanismo tem sido um dos principais motivos para a alta da inflação atual – o que o BC tecnicamente denomina de “realinhamento dos preços domésticos aos internacionais”.

Mas prevenção não foi suficiente, pois, quando foi repor seu estoque, se espantou com o novo preço: R$ 48,00. “Ou seja, eu estava dando desconto de R$ 3,00 pelo quilo. A gente pode perder muito dinheiro numa dessas”, concluiu. Foi a gota dágua para suspender a venda das castanhas.

Recompor a mercadoria foi outro problema. Nozes e amêndoas chilenas ficaram mais caras por causa da alta do dólar, como também as brasileiríssimas castanha-do-pará e castanha de caju. A alta do dólar deixa produtos domésticos mais baratos e os fornecedores aproveitaram para fechar contratos de exportação. Com menos produto no mercado interno, o preço disparou. É a conhecida “lei da oferta e demanda”.

Quem acessa o mercado encontrou desde agosto de 2013 o chamado swap cambial para se proteger da oscilação: contrato negociado em reais, mas que acompanha a diferença da variação do dólar e dos juros. Quando questionado sobre se já tinha ouvido falar nesta proteção, Cunha sorriu e emendou: “Cambiais, né? Não sei o que é, não…” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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