No ano em que completa 10 anos, a política de conteúdo local no setor de óleo e gás no Brasil é alvo de pressões da indústria para alterar exigências contidas nas licitações de áreas de exploração no País. O Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), que reúne as principais empresas do setor, lança na segunda-feira, 25, um estudo em que propõe ao governo a mudança da atual política, focada na aplicação de multas para empresas que não cumprem exigências mínimas, para incentivos tributários e melhores condições de financiamento às empresas que fomentarem a cadeia local de equipamentos e serviços.
Com estimativa de movimentar até 2020 mais de US$ 412 bilhões, a indústria de bens e serviços de óleo e gás esbarra na falta de competitividade no preço e no prazo. Nos últimos três anos, o descumprimento das regras gerou multas de R$ 315 milhões, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP). Somente no último ano foram R$ 278 milhões em multas aplicadas pela agência reguladora. A maior parte é questionada judicialmente, sobretudo pela Petrobras, responsável por 42% do total de multas aplicadas.
À espera de novo leilão de concessões, em outubro, o IBP considera que é o momento para “aprimorar” a política de conteúdo local com foco no “incremento da capacidade e competitividade internacional”. A avaliação integra um estudo que será lançado na segunda-feira, 25, na sede do instituto, no Rio. O documento propõe que a política de conteúdo local deveria priorizar incentivos às empresas – com desonerações, subsídios e regimes aduaneiros especiais.
“Esses incentivos devem ser aplicados em caráter temporário, com sinalização clara de vigência e de gradativa redução, além de indicadores que balizem a conquista de objetivos traçados”, sugere o estudo obtido pelo Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado. Como exemplo, o estudo sugere que sejam concedidos créditos tributários para compensar investimentos em educação, além de isenção de impostos para formação de clusters, desonerações para ganho de capital em investimento de risco, e melhores condições de financiamento.
O documento considera que o País tem de priorizar setores da indústria e buscar a consolidação do conteúdo local na fase de produção, para só então ampliar as exigências em outras etapas da indústria. Atualmente, as empresas assinam compromissos de conteúdo local em todas as etapas do desenvolvimento de campos, com percentuais definidos já na fase de leilões – antes mesmo de saber se há ou não possibilidade de exploração comercial das áreas.
O IBP ouviu 75 executivos de petroleiras, empresas fornecedoras, consultores e também agentes governamentais para compor o mapeamento das oportunidades de conteúdo local. O estudo avalia que o País deveria priorizar as áreas de afretamento de sondas e unidades de produção, serviços de manutenção e logística offshore. Em seguida, seria necessário a criação de clusters – zonas econômicas com integração de empresas de diferentes etapas da cadeia – para fomentar o desenvolvimento de tecnologia de fabricação de equipamentos submarinos e integração de módulos.
Segundo o levantamento, os setores responderiam sozinhos por 72% dos postos de trabalho, mais de 80% do faturamento e 85% do investimento total realizado pelas empresas. As áreas também têm grande potencial de competitividade internacional, com foco na costa ocidental da África e mercados que mantenham aquecida a demanda de produtos offshore mesmo após o pico da demanda nacional. “É possível desenhar um quadro de ambições para a cadeia fornecedora que coloque o país em um patamar de competitividade global nos próximos 15 anos”, analisa o documento.
Apesar da pressão da indústria, que já obteve sinais favoráveis da ANP e do próprio Ministério de Minas e Energia (MME) por revisões da legislação atual, o governo mantém posição firme pelo atual modelo regulatório e de conteúdo local. Uma das idealizadoras da atual política, a presidente Dilma Rousseff reforçou na última semana a determinação em manter os percentuais e condições exigidos para o próximo leilão.
“O que a gente está fazendo é vendo na tabela itens em que o conteúdo não se aplica, por mudanças tecnológicas por exemplo. Queremos uma tabela mais clara e transparente. São pequenas mudanças que estão sendo feitas para aprimorar a tabela. Na essência, a política de conteúdo local não muda”, reforçou o diretor da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP), Florival Carvalho.