Alunos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) tiveram as notas relativas ao primeiro semestre zeradas pelos docentes. Os estudantes atingidos foram principalmente os que aderiram ao estado de greve e à ocupação que durou 59 dias. O ato gerou indignação tanto de alunos a favor da greve como contrários a ela por causa da falta de reposicionamento das aulas perdidas. Alguns afirmaram também que receberam cartas com ameaças.
Os estudantes das instituições que não participaram da greve e os que fizeram provas online dadas por docentes não tiveram as notas zeradas.
Segundo relatos de alunos, professores chegaram a avisar que, se fossem impedidos de aplicar a prova em sala de aula, dariam zero de nota – como no caso do Instituto de Química.
Uma aluna que não quis se identificar por medo de represálias da própria instituição disse que 40 dos 60 matriculados na sua turma reprovaram com a nota.
“Eu nunca tinha sido reprovada em nenhuma matéria, e agora é isso. As provas online são contra a constituição, até em cursos a distância é necessário ir presencialmente realizar a prova”, afirmou, em referência aos que foram prejudicados por se negarem a fazer.
Alunos afirmam que o fato é uma medida de punição. “Desde o começo da greve, os docentes nunca aceitaram o movimento por ferir os privilégios que eles têm aqui dentro. Ficaram feridos e se sentiram desafiados”, declarou um estudante que também preferiu não se identificar, por ter recebido ameaças via redes sociais. “Foi uma resposta política em não reconhecer e continuar com as aulas e provas a revelia dos estudantes.”
“Quando um estudante tira zero, significa que ele foi, fez a prova, errou tudo, não sabia nada porque não se preparou. Já o estudante que não fez a prova, conceitualmente, não merece tirar zero”, comparou o aluno.
Em nota, a Unicamp afirmou que, segundo levantamento da Diretoria Acadêmica (DAC), o sistema de notas não registra nenhuma turma de QG 100 (Química) com reprovação por nota zero e que o calendário letivo ficou aberto até as 23h59 desta terça-feira, 19. O calendário prevê um prazo adicional para retificação das notas inseridas até 22 de agosto.
Dos 24 institutos da universidade, 18 estão em greve.
Os cursos com maior incidência da pontuação zerada foram nas áreas de Física, Química e Engenharia. Até o momento, o caso foi relatado à Ouvidoria da Unicamp. Uma reunião com a reitoria foi agendada para debater sobre o calendário da graduação para que as aulas sejam repostas e as avaliações aplicadas.
Também será colocada em pauta a retirada de quatro sindicâncias que foram abertas e um processo contra um aluno acusado de apagar a lousa como forma de manifestação em sala de aula.
Os alunos que não fazem parte da greve, mesmo sendo prejudicados com a paralisação das aulas e a obtenção de notas baixas, são categóricos em não concordarem com a medida dos docentes, como relatou Flávia Tartari, de 26 anos, aluna de licenciatura em Matemática.
“Estou no último semestre, tenho matérias pendentes devido à greve, as provas foram canceladas, pedi reingresso e dependo das notas para fechar o curso e do jeito que está fica bem difícil”, disse Flávia. “Preciso de nota para me formar. Mas acho que poderiam ter outras formas de avaliação, como listas de exercícios, provas em casa, não zerar os alunos sem dar uma opção.”
Ameaças
Na última sexta-feira, 15, cartas com teor de ameaça foram destinadas a alunos grevistas. Um estudante que mora na residência universitária recebeu na noite de sexta-feira por baixo da porta da sala. No sábado, 16, outra carta apareceu na caixa de correio de outro aluno, também de moradia estudantil.
Foi realizado um boletim de ocorrência online, e a advogada do Diretório Central dos Estudantes está cuidando do caso. A Unicamp afirmou que soube das ameaças apenas por meio da imprensa.
Vídeo
Um vídeo divulgado recentemente via redes sociais – no qual aparece um funcionário que trabalhava em uma obra dentro do Câmpus Universitário – denuncia atos contrários dos grevistas.
O trabalhador aparece questionando duas alunas sobre o sumiço de materiais da obra, sobre a sujeira deixada – como garrafas de bebida e preservativos – e a dificuldade em acessar a área de trabalho.
A reportagem percorreu algumas das obras do câmpus e questionou alguns dos trabalhadores sobre a ciência dos sumiços de materiais, mas eles desconhecem o ocorrido. A Unicamp também afirmou que não tem ciência do suposto sumiço.