A 49 dias do início dos Jogos Olímpicos, o Rio de Janeiro decretou estado de calamidade pública em razão de sua grave crise financeira. A medida inédita foi acertada durante jantar realizado anteontem (16) no Palácio do Jaburu, em Brasília, com o presidente em exercício Michel Temer, o governador do Rio, Francisco Dornelles, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi.
A medida foi discutida com Temer como caminho para justificar o socorro financeiro da União sem necessidade de cumprimento das exigências do Ministério da Fazenda. Com dificuldades em cumprir obrigações assumidas para realização do evento esportivo, o governo do Estado pleiteia emergencialmente pelo menos R$ 3 bilhões.
O governo fluminense não detalhou as consequências práticas do decreto. Segundo Dornelles, a decisão abre caminho para que o Rio tome “medidas duras na área financeira”. Questionado se fornecedores deixarão de receber, disse que “não se pretende dar calote”.
A intenção do governador é chamar atenção das autoridades federais para as dificuldades enfrentadas pelo Estado nas áreas de saúde, segurança e também na obtenção de financiamento para obra do metrô.
A crise financeira do Rio já resultou no fechamento de algumas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e outras estão negando atendimento. O atraso no pagamento dos funcionários fez o Hemorio (banco de sangue estadual) suspender a coleta de sangue em abril e o Instituto Médico Legal (IML) deixar de receber corpos em sua unidade principal, no centro, em 7 de junho, por falta de condições de trabalho. A Polícia Civil também restringiu o uso de combustível: um terço da frota de viaturas teve o abastecimento diário cortado.
Efeitos
Líder do PSDB na Assembleia Legislativa, o ex-vice-governador do Estado Luiz Paulo Corrêa da Rocha disse que, na prática, a calamidade pública financeira desobriga o Estado a cumprir exigências legais, como limite de endividamento e gastos mínimos em serviços essenciais, e impede a União de suspender repasses para o Rio, mesmo que esteja inadimplente. Também permite a captação emergencial de recursos, a suspensão unilateral de contratos e a realização de contratos curtos e emergenciais, sem licitação.
“(A medida) serve para proteger os gestores em caso de descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal”, disse o economista Mauro Osório, presidente do Instituto Municipal de Urbanismo Pereira Passos (IPP), lembrando que o decreto permite à União repassar recursos ao Rio na frente de outros Estados. “Estão usando a Olimpíada como pretexto para montar uma engenharia financeira para o Rio sobreviver a este ano.”
O ponto central da crise é a combinação de gastos crescentes com pessoal com a recessão econômica, que fez derreter as receitas tributárias. O Rio sofre mais, por duas particularidades: a dependência dos royalties de petróleo, cuja remuneração encolheu por causa da queda na cotação internacional; e a dificuldade de cortar muito os investimentos públicos diante da urgência de entregar obras para a Olimpíada.
Liberação de recursos
A União estuda a edição de medidas provisórias para dar agilidade à obtenção de recursos. O estado crítico das finanças seria uma das justificativas para a ajuda ao Rio por meio de Medidas Provisórias, além da proximidade da Olimpíada.
O Rio não conseguiu aval do Tesouro para fechar empréstimo de R$ 990 milhões do BNDES, dos quais R$ 500 milhões seriam usados para conclusão do trecho principal da linha 4 do metrô, entre a Barra da Tijuca (zona oeste) e Ipanema (zona sul),um dos compromissos assumidos para sediar os Jogos Olímpicos. Sem a contratação do financiamento, as obras poderiam parar, às vésperas da Olimpíada, pois o consórcio da Linha 4 do Metrô teria recursos em caixa apenas até meados deste mês.