A indústria nacional ainda segue confiante de que o câmbio se sustentará no patamar de R$ 4 a R$ 3,80 neste ano, sustentando a expansão das exportações nacionais e a competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Entretanto, o setor está atento a um prolongamento do movimento de queda da moeda observado desde o início do mês. Desde o último dia de 2015, quando o dólar valia R$ 3,96, até a última sexta-feira, o real se valorizou 10,3% ante a moeda norte-americana.
“A oscilação do câmbio é grande, mas ainda não é matadora para a indústria”, afirma o diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Derex) da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Thomaz Zanotto. Para ele, um dólar a R$ 3,60 não atrapalharia as vendas externas, mas abaixo desse nível já acende a “luz amarela” para as receitas cambiais do setor. “A R$ 3, então, aí passamos para a vermelha”, ressaltou. Porém, o diretor da Fiesp acredita que é necessário esperar mais para ver se o movimento persiste ante de alguma providência de emergência contra um nível de câmbio mais baixo.
Apesar de defender um câmbio flutuante, o presidente da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fernando Figueiredo, avalia que um câmbio entre R$ 3,50 e R$ 4 é ideal para que o fabricante reduza o preço de seus produtos em dólar, aumente suas receitas cambiais e alavanque a produção interna. A indústria química viu, nos últimos 12 meses até janeiro na comparação com a mesma época imediatamente anterior, uma retração das vendas internas em 5,22% e no Consumo Aparente Nacional (CAN) de 6,4%. Mas, no mesmo período, teve crescimento do índice de exportações de produtos químicos de uso industrial, o que causou impacto direto na produção, com alta de 0,95% em igual intervalo. “O câmbio ajuda, mas mesmo assim são necessárias políticas de longo prazo, como melhorias em infraestrutura e logística”, afirmou.
Para o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), Antonio Jorge Camardelli, o câmbio atual não altera as projeções de vendas externas do setor para este ano. A entidade espera uma receita cambial de US$ 7,5 bilhões neste ano, o que representaria um aumento de 27,1% ante a cifra de 2015. “Acho que não deve ter alteração também porque, na média do acumulado do ano, o dólar não deve recuar tanto e deve se manter ainda em um patamar que nos é interessante. Além disso, há uma crise agora em todos os países, o que provocou uma necessidade de adaptação, o Brasil se obrigou a mudar seu cardápio e baixar o preço também”, declarou.
Uma dos maiores produtores de carne bovina do País, a Minerva Foods tem direcionado boa parte de sua produção ao mercado externo devido ao câmbio favorável. Tanto que em 2015, 70% da receita consolidada da companhia veio das exportações. “Um dólar a R$ 3,70 ainda é o suficiente para manter a competitividade do produto feito no Brasil e impulsionar as exportações”, afirmou o diretor-presidente da empresa, Fernando Galletti de Queiroz. O executivo também disse que a Minerva possui hedge para se proteger de variações cambiais e que não vê mais uma forte oscilação do câmbio no decorrer do ano.
Já o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, acredita que o dólar voltará ao patamar a R$ 3,80 em breve. “Em questões de fundamentos, não é lógico um câmbio a R$ 3,60. Essa queda nos parece apenas um episódio e espero que não se estabeleça em um novo patamar”, disse, respondendo também que o setor não tem um plano emergencial caso o dólar se estabeleça a níveis inferiores.
Segundo ele, as exportações da indústria de calçados estão crescendo, mas a entidade esperava um avanço maior nos dois primeiros anos por conta do câmbio favorável. Após uma receita 0,6% em fevereiro ante o mesmo mês de 2015, o setor fechou o bimestre com vendas de US$ 147 milhões, 2,3% menor ante o mesmo período de 2015.
Para o gerente-executivo de Políticas Econômicas da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, a queda de 10% do câmbio nesse início do ano é mais do que a rentabilidade das exportações da indústria nacional e o sinal amarelo já vigora para o setor, porque a inflação e os custos seguem altos. “Esse movimento pode atrapalhar a retomada e avanço do processo de substituição da importação”, destacou.
Segundo o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI), Rafael Cagnin, a indústria química, calçadista e vestuário já estão sentindo o processo de substituição de importações e tem registrado um viés de recuperação na atividade industrial nos últimos três meses. Klein, da Abicalçados, disse que houve a queda no volume das importações, mas “ainda não relevante para a produção industrial, devido a retração da demanda doméstica”, afirmou.