O Natal de 2015 deve ter o pior desempenho para o comércio em pelo menos 12 anos. Desde 2004, as vendas sempre cresceram em relação ao ano anterior. Mas, desta vez, por causa da crise, a expectativa é que as vendas deem pela primeira vez marcha à ré. A perspectiva desse recuo atípico do consumo na principal data para o varejo já provoca estragos. A indústria ocupa hoje o menor nível de capacidade de produção das fábricas e o emprego temporário de fim de ano até agora não deslanchou.
Nas contas da Confederação Nacional do Comércio (CNC), o volume de vendas do varejo restrito, que não inclui veículos e materiais de construção, deve recuar 4,1% em dezembro em comparação com o mesmo mês de 2014. “O desempenho do Natal deve ser pior do que o resultado do ano acumulado até agosto (queda de 2,4%), medido pelo IBGE, e também do volume de vendas esperado para o ano todo (queda de 2,9%) pela CNC”, diz Fabio Bentes, economista da CNC e responsável pelas projeções.
Para chegar a esse número, ele considerou retração de 2,8% no Produto Interno Bruto (PIB) deste ano e inflação de 9,5%. Mas o quadro pode piorar se, por causa do reajuste dos combustíveis, a inflação bater na casa de 10% e, com isso, disparar mecanismos de indexação de preços na economia.
A projeção da CNC para o Natal é confirmada pelo assessor econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, Victor França. Ele acredita que o desempenho do varejo no segundo semestre será pior do que o primeiro, pois o desemprego deve bater mais forte, afetando o Natal.
Na cidade de São Paulo, a perspectiva é que o movimento de vendas do Natal seja o pior desde o início do Plano Real. A Associação Comercial de São Paulo (ACSP), ainda não fez projeção para o Natal, apenas para o Dia das Crianças, e espera uma queda de 5% em relação ao ano anterior. Como o desempenho do Dia das Crianças indica a tendência para o Natal, se essa estimativa se confirmar, a retração das vendas em dezembro será a maior desde 1994.
O Natal também deve superar o pior da série para a capital paulista, que foi o de 1999, quando Fernando Henrique Cardoso estava na presidência da República, e as vendas caíram 4,9% em relação ao ano anterior. “Exceto na parte política, a situação da economia hoje é muito parecida com a de 1999, sem superávit primário, juros elevados e câmbio nas alturas”, lembra o economista da ACSP, Emílio Alfieri.
Na opinião de Bentes, da CNC, a pá de cal nas vendas do Natal foi a alta do câmbio, que no ano acumula variação de quase 50%, e tem impacto sobre a inflação, que já está alta. Cálculos feitos pelo economista para uma cesta de 29 produtos e serviços mais consumidos no Natal, com base na prévia da inflação, o Índice de Preços ao Consumidor (IPCA-15), acumulada no ano até setembro, mostra que os preços subiram 8% no período.
“Se esse ritmo de alta for mantido até dezembro, o preço médio dessa cesta terá a maior variação da série iniciada em 2003, superando o pico de 7,4% da inflação do Natal, registrado em 2008”, diz o economista. Nesse cálculo não está incluído o reajuste recente da gasolina de 6% e a perspectiva de uma nova rodada de aumento de preço da energia elétrica.
O desdobramento da alta do câmbio nos preços deve afetar principalmente as vendas de eletroeletrônicos. No televisor, por exemplo, 80% dos componentes são importados. Por isso, entre os oito segmentos avaliados por Bentes, o de eletrodomésticos e móveis deve registrar a maior queda nas vendas em relação ao Natal de 2014. A retração prevista é de 16,3%.
A Lojas Cem, por exemplo, especializada em móveis e eletrodomésticos, projeta queda de 10% no faturamento do Natal em relação ao de 2014, descontada a inflação do período. “Será o pior Natal em dez anos”, diz o supervisor-geral, José Domingos Alves. Procuradas, Via Varejo, dona das bandeiras Casas Bahia e Ponto Frio, e Magazine Luiza não revelaram as projeções de vendas, porque são empresas com ações negociadas em Bolsa.
Para itens de informática e comunicações, que também têm boa fatia de componentes importados, as projeções não são favoráveis: a retração esperada pela CNC é de 5,5%. Só é esperado crescimento de vendas para os segmentos de perfumaria (2,2%) e de artigos de uso pessoal e doméstico (3,1%), pois são itens de baixo valor unitário, cuja venda não depende de financiamento.
“O Natal está nebuloso”, afirma Alfieri, da ACSP. Ele diz que os estoques no varejo não estão altos, mas os lojistas só compram volumes para o dia a dia, com medo do encalhe. O cenário incerto faz com que grandes redes evitem comentar as perspectivas para o fim de ano. Procuradas, Carrefour, Lojas Pernambucanas, GPA, Walmart, C&A e Drogasil também não informaram as projeções. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.