Há cerca de dez dias, o economista Nicola Tingas encarou um convite impossível de atender plenamente. A um grupo de empresários, ele precisou apresentar um cenário econômico para o Brasil, cheio de previsões e probabilidades de realização. O grau de certeza de Tingas, assim como o dos empresários, ficou diretamente proporcional à densidade do “nevoeiro”, nas palavras do especialista, que atualmente turva a visão de curto prazo de qualquer analista. O economista-chefe da Acrefi, associação de financeiras e instituições de crédito, argumenta que, nem nos anos 90 de transição entre pacotes monetários e choques cambiais, observou tamanha imprevisibilidade e incapacidade de traçar cenários econômicos.
A neblina que cega analistas e paralisa empreendedores é fruto da falta de confiança na retomada do crescimento econômico, na avaliação do economista. “O empresário não está confiante no que vê porque, na verdade, ele não está enxergando nada”, afirma.
“A falta de confiança é hoje o maior problema para a dinâmica da economia brasileira. Mais importante que a agenda fiscal”, afirma Tingas. “Claro que a questão fiscal, que ficou mais grave com o déficit no orçamento, é ponto central e uma questão de curto prazo. Mas a grande questão, a chave do problema, é a falta de confiança do empresário”, diz.
As pesquisas materializam em números a desconfiança do brasileiro acerca do futuro destacada pelo especialista. Qualquer uma das sondagens da Fundação Getúlio Vargas mostra uma inédita deterioração das expectativas dos empresários de todos setores. Em relação ao ano passado, todos indicadores caíram perto ou mais de 30%.
“Não me lembro de uma quebra de expectativas tão forte”, afirma Tingas. No primeiro relatório de mercado Focus divulgado em 2015, a mediana das expectativas para o crescimento do PIB era de 0,50% para este ano. No Focus divulgado nesta semana, estava em 2,85%. Também nesta semana, o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou a revisão de sua expectativa para o PIB brasileiro em 2015 de -1,5% para -3%.
O economista entende que a minirreforma ministerial dissipou parcialmente a incerteza. O novo arranjo político-partidário no governo, diz Tingas, foi um importante primeiro passo porque “aumentou a chance de o Congresso ajudar” no ajuste fiscal”. “O segundo passo é a aprovação dos vetos presidenciais”, afirma Tingas, sinalizando que ainda entende como possível essa vitória do governo.
A reprovação do veto que mais preocupa o governo é quanto ao reajuste dos servidores do Poder Judiciário. Caso seja reprovado, o impacto nas contas públicas será de R$ 36,2 bilhões até 2019, segundo a equipe econômica. Além disso, há o texto que atrela os benefícios do INSS o reajuste do salário mínimo, despesa extra de R$ 11 bilhões nos próximos quatro anos.
Se os vetos forem aprovados, o “nevoeiro vai começar a ficar menos denso”, na avaliação do economista da Acrefi. “A partir daí, teremos de ver um terceiro passo que é uma costura de uma meta fiscal crível e de como o orçamento de 2016 vai se resolver, seja cortando despesas ou com aumento de impostos”, diz Tingas. “Daí fica possível começar a discutir a agenda para reverter a crise de confiança”, afirma.
Na avaliação de Tingas, a redução da imprevisibilidade vai contribuir também no direcionamento dos preços dos ativos financeiros, na opinião de Tingas. “Hoje, os ativos estão sem um piso e sem um teto”, afirma. Caso a evolução dos fatos siga a linha do tempo que o economista consegue enxergar, será possível encerrar o ano com a percepção de que os preços nos mercados financeiros chegaram a um piso.
Em certa medida, Tingas está otimista. “O pior ano (para a economia brasileira) será 2015. O ano de 2016 será um grande vale, onde vão surgir oportunidades para inovar, comprar e vender empresas”, afirma.
Nos próximos meses, o economista entende que uma questão externa joga a favor do Brasil: o adiamento do aumento da taxa de juros nos Estados Unidos. Ele avalia que o Federal Reserve já entendeu que não é o banco central dos Estados Unidos. “É o banco central do mundo”, diz Tingas, argumentando que uma ação do BC americano afeta o fluxo financeiro de dezenas de países. Em razão disso, o economista acredita que o aperto monetário na maior economia do mundo vai ocorrer “com suavidade”. Sendo que a primeira alta, virá provavelmente “no ano que vem”.