O projeto de lei que pune discriminação salarial contra mulheres virou uma "batata quente" na Câmara. Com a sinalização de que vetaria o texto aprovado pelo Congresso mesmo diante do risco de ser "massacrado" nas redes sociais, o governo de Jair Bolsonaro encontrou uma alternativa para evitar ter de decidir sobre o tema e devolveu o texto aos deputados sob o argumento de problemas regimentais.
A bancada feminina na Câmara está agora diante de um dilema: apoiar o texto do Senado, mais brando do que o aprovado pelos deputados, ou retomar a proposta original, sob o alto risco de que nenhum deles seja sancionado por Bolsonaro.
O requerimento de urgência (uma espécie de fura-fila da ordem de votações dos projetos) foi aprovado na sessão de ontem. O mecanismo permite que a proposta passe à frente e seja votada a qualquer tempo no plenário, mas não há ainda acordo sobre quando o texto será efetivamente pautado pelo presidente da Casa, Arthur Lira (Progressistas-AL), um aliado que tem evitado criar constrangimentos para Bolsonaro.
A maior sinalização disso é o fato de que a deputada Margarete Coelho (PP-PI), aliada de Lira, não será mais a relatora da proposta. Advogada e jurista, ela tem ganhado protagonismo na condução de pautas importantes na Casa, uma posição que gerou incômodo entre parlamentares. Na quarta-feira, a relatoria foi cedida à deputada Marina Santos (Solidariedade-PI). Ao <b>Estadão/Broadcast</b>, Marina disse que ainda está colhendo informações sobre a proposta e sobre a posição do governo a respeito dela.
Nos bastidores, a reportagem apurou que algumas deputadas não quiseram assumir a relatoria sob o temor de terem de ceder em um projeto caro às mulheres para, no fim, morrer na praia com um veto presidencial.
O texto da Câmara determina que a empresa pague à empregada prejudicada uma multa de cinco vezes o valor da diferença salarial em relação ao homem que ocupa a mesma função ao longo de todo o período do contrato de trabalho. No Senado, porém, foi incluída a expressão "até" antes da multa, o que dá margem à Justiça para definir penalidades menores, conforme o porte e a situação econômica da empresa.
<b>Sanção</b>
A sinalização que as deputadas receberam é que somente o texto do Senado tem chances de ser sancionado. Mas o governo também quer a garantia de que mulheres prejudicadas por empresas no passado não possam buscar os direitos que seriam garantidos pela nova lei. Isso é algo que nem o texto da Câmara, nem o do Senado poderia assegurar e, nesse cenário, demandaria a apresentação de outro projeto, o que levaria a potencial conquista feminina à estaca zero e desmoralizaria a bancada feminina no Congresso.
Coordenadora da bancada feminina, a deputada Celina Leão (PP-DF) disse haver acordo entre os líderes para aprovar o texto do Senado e defendeu o pragmatismo nas discussões. "Não temos condição jurídica de mexer mais no projeto. O acordo de líderes é pelo texto do Senado, que permite ao juiz ter um olhar subjetivo sobre cada caso ao definir a multa", afirmou a parlamentar .
"É claro que o texto da Câmara seria melhor para nós mulheres, mas a única possibilidade de sanção presidencial é com o texto do Senado, embora não haja garantia de que ele será sancionado. Não adianta jogar para a plateia", disse.
Após a aprovação pelo Congresso, Bolsonaro lançou uma "enquete" para decidir se sancionava ou não a lei. Ele pediu a seus seguidores que sugerissem, nas redes sociais, o que ele deveria fazer. O presidente disse que, se sancionasse, ficaria "quase impossível" uma mulher conseguir emprego, sem apresentar dados ou estudos que corroborem essa visão, e ressaltou o custo que a iniciativa poderia gerar aos empresários.
Por outro lado, também disse que poderia virar alvo de uma "campanha das mulheres" e seria "massacrado" caso decidisse pelo veto.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>