Previsões do governo de São Paulo indicam que as três universidades públicas paulistas perderão pelo menos R$ 1,2 bilhão este ano por causa da pandemia de coronavírus, o que representa 11% a menos no orçamento. Já no mês passado, os recursos recebidos do Estado pelas Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp) não foram suficientes nem sequer para pagar seus professores e funcionários. Elas passaram a usar seus parcos fundos de reserva.
As instituições são financiadas por 9,57% do ICMS no Estado. Como as pessoas estão comprando pouco, a arrecadação diminuiu e as universidades temem entrar em mais uma grave crise financeira – justamente quando tinham acabado de equilibrar as contas. Os reitores de USP, Unesp e Unicamp pedem mais recursos ao governo de João Doria, mas o Estadão apurou que ainda não há previsão de qualquer ajuda às universidades.
As três juntas têm 180 mil alunos e estão entre as mais importantes universidades do País. Durante a pandemia, conseguiram manter 90% das aulas teóricas online e deram incentivo aos pesquisadores para abrir seus laboratórios para trabalhos relacionados à covid-19. Foram cientistas da USP que sequenciaram o genoma dos dois primeiros casos de coronavírus no Brasil em tempo recorde, por exemplo.
Com seus orçamentos ainda sustentam hospitais universitários, que têm atendido pacientes de coronavírus. O caso da Unicamp é o mais preocupante porque ela mantém cinco hospitais, um deles de referência, que atende 6,5 milhões de pessoas na região de Campinas. Os recursos do SUS representam só 30% dos custos, segundo a reitoria. Assim como no Hospital Universitário da USP (HU), os funcionários estão na folha de pagamento da instituição, além de materiais, infraestrutura.
"A situação está muito crítica, as contas não fecham", diz o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel. O Estado pediu que as universidades enxugassem suas despesas durante a pandemia e, assim, foram suspensos concursos para contratação – até os que já estavam em andamento.
A Unesp, que não contratava profissionais desde 2014 porque enfrentou uma grave crise financeira nos últimos anos, tinha finalmente previsto recursos este ano para chamar 100 novos professores e 70 funcionários técnico-administrativos. Eles iriam para cursos de Educação Física, Odontologia e Microbiologia, entre outros. Tudo foi suspenso.
"Isso afeta muito. O governo do Estado está falando muito em valorização da ciência, seria interessante manter o reconhecimento às universidades", diz o reitor da Unesp, Sandro Valentini, sobre a possibilidade de recursos extras. As universidades pedem ao Estado uma fatia dos R$ 6 bilhões que foram destinados pelo governo federal para o enfrentamento ao coronavírus e que podem ser usados para compensar perdas. Outro R$ 1 bilhão precisa ir para ações de saúde e assistência social.
Além das contratações, foram suspensos pagamentos de vale-transporte e adiados os recolhimentos de FGTS e investimentos em obras civis. As instituições fizeram ainda reestruturação de contratos de serviços terceirizados e economia em limpeza e eletricidade. As três universidades juntas conseguiram reduzir cerca de R$ 300 milhões.
Para se ter uma ideia da situação atual, em maio, o repasse do governo para a USP foi de R$ 328 milhões, mas a folha de pagamento é de cerca de R$ 400 milhões. São 5 mil docentes e 13 mil funcionários. Isso significa um comprometimento de 122% do orçamento com pessoal. Na Unicamp, foi de 125% e na Unesp, de 118%.
Elas precisaram usar seus fundos de reserva, que hoje têm R$ 220 milhões (Unesp), R$ 400 milhões (Unicamp) e R$ 700 milhões (USP). Mas, pela despesa que as universidades têm com salários, esses valores não duram mais que dois meses.
<b>Pesquisas</b>
As três instituições enfrentaram a maior crise financeira da história há cerca de três anos. A USP fez um inédito plano de demissão voluntária, algo impensável há pouco tempo. A Unesp deixou até de pagar o 13.º dos professores. Depois de diversos planos de redução de custos, elas conseguiram se reerguer e puderam voltar a investir. Em janeiro deste ano, o comprometimento do orçamento com folha de pagamento estava em 75%, considerado muito positivo. E aí veio a pandemia.
"A nossa área administrativa está a todo tempo estudando cenários, que mudam muito. Nossa preocupação é que vamos viver uma crise econômica e não estamos conseguindo lidar com ela como País", diz o reitor da USP, Vahan Agopyan.
Além das despesas com pessoal e manutenção da universidade, ele se preocupa com a queda do investimento em pesquisas, que vem da indústria e de agências de fomento, e na USP chega a R$ 1,5 bilhão. "Já temos visto agências internacionais reduzirem investimento por precaução. Os valores podem diminuir drasticamente", diz. "Aí a universidade deixa de fazer a sua função fundamental, que é pesquisa, o que forma profissionais que possam vencer desafios." /
<b>Governo diz que avalia demandas</b>
O governo do Estado de São Paulo informou, por meio de nota, que "acompanha o comportamento da arrecadação pública com extremo rigor para avaliação das demandas setoriais de acordo com a capacidade orçamentária futura." O orçamento que estava previsto para as universidades antes da pandemia era de R$ 10 bilhões. A previsão agora é que a USP perca R$ 632 milhões, a Unesp, R$ 296 milhões e a Unicamp, R$ 277 milhões.
Os reitores das universidades estaduais paulistas têm tido reuniões com representantes do governo, entre eles o vice-governador, Rodrigo Garcia, e a secretária de Desenvolvimento Econômico, Patricia Ellen.
No fim de maio, o governador João Doria (PSDB) criou uma nova secretaria, a de Orçamento, Gestão e Projetos do Estado, com Mauro Ricardo Costa como titular, que agora também entrou nas conversas com as universidades. Costa esteva recentemente na Prefeitura, já foi do governo de José Serra e ainda de Beto Richa, no Paraná, onde fez um polêmico ajuste fiscal.
O Estadão apurou com técnicos do governo que não há planos traçados para repasses extras para as universidades diante da falta de recurso. A previsão de perda de arrecadação este ano está estimada em cerca de R$ 20 bilhões. A ajuda do governo federal para enfrentamento ao coronavírus para São Paulo será de R$ 7,69 bilhões, repassados em quatro parcelas. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>