Os presidentes do Brasil, Jair Bolsonaro, e da Argentina, Alberto Fernández, participarão de uma videoconferência nesta segunda-feira, 30. Será a primeira vez que os dois terão um encontro, mesmo que virtual, desde a eleição do argentino, em outubro do ano passado. O gesto tem sido considerado por diplomatas brasileiros como um primeiro passo para a reaproximação entre os dois países, tradicionais parceiros comerciais, após Bolsonaro manter uma relação conflituosa com o vizinho.
Candidato ligado ao "kirchnerismo", Fernández visitou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em plena campanha pela Casa Rosada. O episódio foi considerado inaceitável por Bolsonaro, que desde então acirrou as críticas ao argentino. O brasileiro chegou a lamentar o resultado da eleição e se recusou a cumprimentar o colega.
Desde então, não houve contatos oficiais. De acordo com diplomatas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, no entanto, sinais de afastamento entre Fernández e sua vice-presidente, Cristina Kirchner, abriram espaço para uma reaproximação neste momento.
Com a pandemia e a consequente desaceleração econômica no país, que causou a maior saída de empresas multinacionais da Argentina desde a crise de 2002, Fernández passou a moderar seu discurso e tem se afastado da cartilha de Cristina, para tentar salvar a economia.
Segundo a assessoria de imprensa da presidência da Argentina, durante a reunião "Fernández e Bolsonaro buscarão continuar fortalecendo as múltiplas agendas comuns que compõem a relação bilateral em busca de uma maior integração".
O comunicado também afirma que "o diálogo é fruto do trabalho sustentado de coordenação política que os dois países vêm desenvolvendo nos últimos meses e que resultou no crescimento do comércio bilateral, a ponto de o Brasil mais uma vez se posicionar como o principal parceiro comercial da Argentina". De acordo com fontes no governo argentino, a iniciativa de estabelecer a relação partiu da Casa Rosada.
Oficialmente, o motivo da videoconferência é o 35.º aniversário do encontro dos ex-presidentes Raúl Alfonsín e José Sarney, em Foz de Iguaçu. A reunião ocorreu em 30 de novembro de 1985, e ficou marcada como o dia da amizade Argentino-Brasileira. Mas o primeiro bate-papo virtual entre Bolsonaro e Fernández significa mais do que isso.
Tanto Bolsonaro quanto Fernández estarão em suas residências oficiais, Palácio da Alvorada e o de Olivos, respectivamente, durante a videoconferência. No ano passado, essa comemoração não foi realizada com participação dos presidentes.
Na avaliação de diplomatas brasileiros, o que virá daqui para a frente dependerá de como for a conversa. Um deles lembrou que a relação entre os dois países sempre foi de idas e vindas, "dramática, como um tango".
<b>Tentativas</b>
A relação entre Bolsonaro e Fernández começou com troca de farpas e críticas de ambos os lados. Em fevereiro, o novo embaixador da Argentina no Brasil, o empresário e ex-candidato a presidente Daniel Scioli, tentou contornar a situação. Em entrevista ao Estadão, Scioli disse que estava no Brasil para "facilitar, unir, procurar pontos de convergência e acordos que resultem em influência positiva na agenda comum que temos".
Scioli afirmou na ocasião que iria "prevalecer a responsabilidade e os interesses comuns", e que era preciso "respeitar a vontade do povo". O embaixador e o chanceler argentino, Felipe Solá, começaram a promover uma tentativa de reunião entre os dois presidentes.
Um primeiro encontro entre os dois depois das trocas de farpas que começaram durante a campanha de Fernández, no ano passado, foi proposto por Bolsonaro a Felipe Solá, durante reunião em Brasília. A ideia de Bolsonaro era a de aproveitar que ambos estariam em Montevidéu para a posse do presidente eleito do Uruguai.
Fernández e Bolsonaro iriam se encontrar em março, em Montevidéu, no Uruguai, para a posse do presidente uruguaio Luis Lacalle Pou. Às vésperas do evento, Fernández adiou o encontro. "Lamentavelmente não poderei viajar este dia, é o discurso na abertura das sessões ordinárias (do Congresso Nacional). Se não posso viajar neste dia, irei no dia seguinte", disse Fernández.
Desde então, Bolsonaro e Fernández voltaram a falar frases de efeito um contra o outro. Em março, Fernández disse que "as declarações e ações de Bolsonaro levam a pensar que o país pode entrar numa mesma espiral que a Itália", dando a entender que a postura do presidente brasileiro em relação à pandemia poderia levar a muitas mortes.
Em setembro, o presidente argentino disse que Bolsonaro e sua família estão "muito preocupados comigo e com a Argentina".
Em outubro, Bolsonaro voltou a atacar a Argentina. "Existe um modelo econômico que conseguiu o impossível: Argentina sem carne, Venezuela sem petróleo, Cuba sem açúcar", afirmou o presidente. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>