O julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a regra que eliminou o "voto de qualidade" no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) foi suspenso pela segunda vez, desta vez por um pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes. A primeira "pausa" foi em abril, quando o ministro Luís Roberto Barroso pediu mais tempo para estudar a ação.
Na ocasião, o relator do caso, Marco Aurélio Mello, já havia votado para derrubar a nova norma. A análise então foi retomada na sexta-feira, 18, com o voto de Barroso, que empatou o julgamento ao votar pela constitucionalidade da emenda que pôs fim à antiga regra de desempate no Carf. No mesmo dia, no entanto, Moraes pediu vista, e ainda não há data para a deliberação ser retomada.
A novidade, em vigor desde abril do ano passado, foi questionada em três ações no STF, uma delas de autoria da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Durante a tramitação no Congresso, uma emenda foi incluída no texto de uma medida provisória que tratava da negociação extrajudicial de créditos tributários existentes e constituídos. Na prática, o dispositivo mudou radicalmente a atuação do Carf, o que foi mantido pelo presidente Jair Bolsonaro na sanção do texto.
Segundo a lei, em caso de empate no julgamento de processo administrativo de determinação e exigência do crédito tributário, resolve-se em favor do contribuinte. Com isso, acaba o chamado "voto de qualidade", que, até então, permitia ao presidente de cada turma do Carf, sempre um representante da Fazenda Nacional, desempatar os julgamentos.
Relator do caso, o ministro Marco Aurélio Mello votou para derrubar o artigo que barra a aplicação do voto de qualidade nesses casos. A critica do ministro foi direcionada ao fato de a regra ter sido inserida durante as discussões da MP, mesmo sem relação direta entre o texto da medida e a inovação decidida pelos parlamentares – o que é conhecido como "jabuti".
"Não há conexão da matéria com o texto original. O cenário é de molde a reconhecer a crise legislativa há tempos existente na frágil democracia brasileira, marcada pela opção por atalhos à margem da Constituição Federal – o que, na quadra vivenciada, tem se mostrado regra, e não exceção", alertou Marco Aurélio.
Barroso, no entanto, divergiu do decano. O ministro reconheceu que o STF não admite a prática da inserção de "jabutis" nas matérias legislativas, mas avaliou que neste caso existiria "dúvida razoável" sobre a pertinência temática entre a MP e a emenda parlamentar. Por isso, para o ministro, a necessidade de se discutir a regra em si seria mais importante do que o debate sobre a norma ser ou não um "jabuti".
"A caracterização do que sejam acréscimos impertinentes ainda se encontra em construção, fora das zonas de certeza positiva e negativa. No caso presente, todavia, considero ainda mais relevantes as dúvidas quanto à constitucionalidade da admissão ampla do voto de qualidade nos julgamentos do CARF", disse Barroso para, no mérito, declarar a nova norma constitucional.
O ministro anotou que o voto de qualidade num órgão como o Carf gera uma distorção. "O que se tem é a prevalência do entendimento de um julgador (representante da Fazenda) em relação aos demais. Isso é particularmente sensível no caso do CARF, porque, diferentemente de outros órgãos de contencioso administrativo, a sua competência recai sobre controvérsias em que há um interesse direto da Administração Tributária", afirmou Barroso.
O ministro ainda propôs em seu voto que o STF fixe uma tese no julgamento. A proposta de Barroso define como constitucional a extinção do voto de qualidade do presidente das turmas julgadoras do Carf, significando o empate decisão favorável ao contribuinte. Nessa hipótese, no entanto, a Fazenda Pública poderá ajuizar ação para tentar restabelecer o lançamento tributário.