O noticiário político doméstico carregado, em meio à ampliação do espaço do Centrão no governo, e o ambiente externo menos propício ao risco fizeram o dólar interromper a sequência de dois pregões de queda para fechar em alta nesta quarta-feira, 22, com investidores recompondo posições defensivas.
Com máxima de R$ 5,2242, o dólar à vista encerrou a sessão negociado a R$ 5,2130, avanço de 0,41%. Com isso, a moeda americana acumula valorização de 1,74% na semana e de 4,82% em julho. O real ainda se recente de ter tido o pior desempenho entre as moedas emergentes na segunda-feira, dia 19, quando uma onda de aversão ao risco dominou os mercados e levou a divisa dos EUA a fechar em alta 2,64%.
Operadores e analistas atribuem parte da fraqueza da moeda brasileira ao clima de incertezas no campo político, em meio à perda de popularidade do presidente Jair Bolsonaro, alvejado pela CPI da Covid, e aos temores de antecipação do calendário eleitoral, com o governo abrindo a torneira do Orçamento.
Bolsonaro confirmou hoje a troca de cadeiras na Esplanada dos Ministérios, com o senador Ciro Nogueira (PP-PI), um dos próceres do Centrão, assumindo o Ministério da Casa Civil no lugar do general Luiz Eduardo Ramos – que pode assumir a Secretaria Geral da Presidência, hoje ocupada por Onyx Lorenzoni. Caberá a Onyx ocupar o Ministério do Emprego e Previdência, que será criado a partir do desmembramento do Ministério da Economia.
O ministro Paulo Guedes, da Economia, minimizou a perda da área de Emprego e Previdência, disse que a política econômica não muda e fez elogios tanto a Onyx quanto a Nogueira. Guedes também disse que já tem espaço no Orçamento para ampliação do Bolsa Família e voltou a defender a reforma do Imposto de Renda, com a taxação de lucros e dividendos.
Para Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da Treviso Corretora, após uma trégua com o recesso parlamentar, o noticiário em Brasília voltou a contaminar a formação da taxa de câmbio. "Quando o dólar tenta dar uma melhorada, aparecem novos fatos que geram instabilidade. Agora existe essa percepção de que o presidente está fragilizado e busca uma recomposição com o Centrão", afirma Galhardo. "Isso faz o mercado ficar muito arisco e buscar proteção no dólar enquanto não existe uma clareza do que vai acontecer".
Pela manhã, o dólar até chegou a operar em queda e descer até a mínima de R$ 5,1694, em meio a muita volatilidade vinda do exterior, enquanto investidores absorviam dados ruins da economia americana e as declarações da presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, que garantiu a continuidade dos estímulos monetários – o que tende a tirar força do euro.
Lá fora, o DXY – que mede a variação da moeda americana em relação a seis divisas fortes – chacoalhou bastante, mas passou a trabalhar em alta ao longo da tarde. Em relação a divisas emergentes, o desempenho do dólar foi misto, com leve baixa em relação ao peso mexicano e alta firme ante o rand sul-africano após o Banco Central do país manter a taxa básica de juros em 3,5% ao ano.
Para Rodrigo Friedrich, head de renda variável da Renova Invest, escritório plugado ao BTG Pactual, a despeito dos dados mais fracos da economia americana, o mercado segue muito assustado com a inflação e a possível reação do Fed. "Temos a safra de balanço nos Estados Unidos agora e, em todos os comentários de resultados de instituições financeiras, aparece essa preocupação com a inflação", diz Friedrich, que vê acredita em dólar na casa de R$ 5,30 no curto prazo.
Em nota a clientes, Richard Rytenband, economista e CEO da Convex Reserch Independente, afirma que uma "nova onda" de valorização do dólar "está em andamento" , em meio a um cenário de muita fragilidades da economia global e com a inflação alta nos Estados Unidos, o que pressiona o Fed.
Para Rytenband, o Brasil tem fragilidades, com o cenário político instável, taxas de juro ainda pouco atraentes, apesar do ciclo de aperto monetário, e provável reversão da dinâmica das contas externas, hoje favorável, com a retomada do crescimento econômico.