Influenciadora digital, com uma multidão de seguidores aficionados por suas dicas de aeróbica, alimentação e moda fitness, Sylwia Zajac, uma popstar das redes sociais que bombou na web de Varsóvia para o mundo, leva uma vida aparentemente exemplar nas primeiras sequências de Sweat. O segundo longa-metragem do diretor sueco (radicado na Polônia) Magnus von Horn estreou na sexta no Brasil online, via Mubi, após arrebatar vários prêmios mundo afora. A palavra "aparência" é o termo central para entender a personagem encarnada por Magdalena Kolesnik nesse drama existencial que foi chancelado com a logo de Cannes, em 2020, mas não teve como ser exibido na Croisette, pelo adiamento da edição presencial do evento do ano passado, por causa da pandemia.
Em seu mundo de faz de conta, regado a suor (que, em inglês, é o tal "Sweat", do título), Sylwia faz parecer que sua alma está tão saudável quanto seu físico, talhado pela cartilha do "saúde é o que interessa, o resto não tem pressa", em horas e horas de malhação e em refeições sem glúten. Mas a lógica do "assim é, assim lhe parece" não é tão cartesiana no dia a dia dela. Sylwia tem um coração devastado, que reflete uma certa solidão universal, inerente ao isolamento crescente (mesmo anterior à covid-19) em uma sociedade que cultua o corpo.
"Ser solitário é uma condição tratada como tabu, mas, não necessariamente, é um problema, pois pode ser uma opção. O problema aqui é o fato de Sylwia ser uma pessoa que quer ser autêntica em suas performances. Mas ela não é uma atriz.
Nós, atrizes, podemos ter várias abordagens para uma performance, oferecendo essa tal autenticidade. Não é o caso de uma influenciadora digital como Sylwia. Ela é alguém que está na Polônia, uma sociedade mais racional que, embora esteja no centro da Europa, parece estar distante do continente", diz Magdalena ao <b>Estadão</b>, em entrevista via Zoom, tentando entender o drama da protagonista de um longa laureado com o prêmio de melhor filme nos festivais de Trieste e de Chicago.
<b>Angústia</b>
Filme esse que parte da percepção da angústia de uma mulher que é "amada" por milhões de pessoas que seguem e curtem suas postagens, mas não fazem ideia alguma de seus conflitos com sua mãe e com seus demais familiares.
"Os sentimentos não transbordam nas cenas em que ela se exercita. Essas cenas estão lá para traduzir seu universo e dar dinamismo visual à narrativa. As emoções explodem quando ela enfrenta o fã stalker que a segue, que se masturba diante dela. Nas reações dela, vemos o que se passa em seu âmago para além do que ela mostra", diz Magnus von Horn ao <b>Estadão</b>.
Egresso de uma série de curtas-metragens, o diretor estreou em longas em 2015, com The Here After, rodado em sua Suécia natal, e fez Sweat inspirado por uma percepção de uma polarização moral e política na Polônia, onde estudou cinema na prestigiada Escola de Lodz. "Eu passei 16 anos em solo polonês e encontrei, com meu olhar de estrangeiro, uma nação dividida entre as marcas do regime comunista do passado e o presente", diz o realizador, que leva o público às lágrimas numa cena em que Sywlvia é abordada por uma seguidora mais interessada em poder desabafar uma perda pessoal do que em fazer uma selfie com sua musa.
"Estamos discutindo a necessidade que as pessoas têm de se conectar e compartilhar vivências. Meu produtor brincou que um filme é um post que leva quatro anos para chegar às redes sociais. Nessa brincadeira, eu percebo uma questão sobre as formas de conexão que buscamos. E o quanto, a partir delas, tentamos ser mais verdadeiros com o que sentimos."
Elogiado em todos os festivais por onde passou, incluindo a Mostra de São Paulo de 2020, Sweat acabou encontrando um lar na Mubi em vez de chegar ao circuito exibidor. "Tirando a França, onde os cinemas seguem muito concorridos, não há muita gente frequentando salas neste momento de pandemia, o que é uma situação difícil, mas reveladora da importância que os streamings têm ao darem aos cineastas uma chance de seguir em frente, de continuar criando", elogia Magnus.
"Acredito que, no futuro, saber previamente onde o filme virá a ser exibido há de influenciar a feitura dos longas-metragens, dramaturgicamente. O meio vai interferir no que estamos criando."
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>