A Terra está esquentando mais rápido do que era previsto e se prepara para atingir 1,5ºC acima do nível pré-industrial entre 2030 e 2040, pelo menos dez anos antes do que era esperado. Com isso, haverá eventos climáticos extremos em mais frequência, como enchentes e ondas de calor. A mensagem foi dada nesta segunda-feira, 9, pelo Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC) da Organização das Nações Unidas.
O que se fará agora definirá o tamanho do impacto na vida de 7,6 bilhões de pessoas no planeta. Certo é que os efeitos do aquecimento virão. A redução sustentada nas emissões de dióxido de carbono (CO2) e outros gases de efeito estufa, no entanto, ainda pode limitar as ameaças dessas mudanças climáticas. Caso contrário, alguns dos efeitos diretos para países como o Brasil serão secas mais frequentes e a queda na capacidade de produção de alimentos.
Desde 1850, já avançamos ao menos 1,1ºC na média da temperatura global. Mais 0,4ºC de aumento vai produzir número maior de secas severas, ondas de calor, chuvas torrenciais, enchentes, tornados, incêndios florestais e reforçar a tendência de aumento do nível do mar. Todos esses efeitos já ocorrem em nível superior aos do passado.
A lista, no entanto, vai além e a frequência desses eventos extremos está diretamente ligada ao quanto nós veremos a Terra esquentar neste século. Ou seja, ainda resta uma "janela de oportunidade", cada vez menor, para tentar limitar o aquecimento abaixo de 2º C até 2100, como definido no Acordo de Paris em 2015 (pacto assinado por quase todos os países para conter o aquecimento do planeta). Mas a postura negacionista de algumas autoridades – como o presidente brasileiro Jair Bolsonaro e o ex-líder americano Donald Trump – tem sido apontada por especialistas como um dos principais obstáculos. "Já sabemos há décadas que o mundo está esquentando, mas o relatório nos diz que mudanças recentes no clima são disseminadas, rápidas e se intensificam, de maneira sem precedentes em milhares de anos", diz Ko Barrett, vice-presidente do painel. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que o documento é um "alerta vermelho" para a humanidade.
O caminho seguro é um só: limitar o gás carbônico na atmosfera, atingindo pelo menos zero líquido de emissões (saldo das emissões descontada a absorção do carbono), juntamente com grandes reduções em outras emissões de gases do efeito estufa. O Acordo de Paris prevê zerar emissões líquidas até 2050. O motor do aquecimento está na queima de combustíveis fósseis, como petróleo, gás e carvão mineral, por veículos a combustão e usinas termoelétricas, e a consequente produção de CO2. Mas não só: o metano (CH4) e o óxido nitroso (N2O), resultantes de atividades agropecuárias, compõem a trinca do efeito estufa. Some-se a isso a produção de aerossóis.
Os 234 cientistas de 66 países reunidos pelo IPCC produziram um relatório com mais de 14 mil referências citadas, com um total de 517 contribuições de outros autores. No documento, o Painel é taxativo. "É um fato estabelecido que a influência humana aqueceu o sistema climático e mudanças climáticas generalizadas e rápidas ocorreram", diz. A essas evidências científicas somam-se catástrofes causadas por eventos extremos atuais, como a onda de calor no Hemisfério Norte com temperaturas recordes em países como o Canadá. Na Turquia, isso chegou a um nível de 8°C superiores à média e um forte incêndio atingiu as florestas do país. Na Alemanha, enchentes devastaram cidades. Tudo isso em meio à pior crise sanitária dos últimos cem anos causada pela pandemia de covid-19.
Embora não seja objeto do relatório, diversas pesquisas também vêm apontando a relação entre desmatamento e alterações do equilíbrio ecológico com o surgimento de novas doenças. Danos ambientais, portanto, podem impor novas pandemias à humanidade.
<b>Cenários futuros</b>
A forma como as pessoas já percebem e como experimentarão tamanhas alterações no clima dependem de fatores regionais. Atualmente, o aquecimento em terra é maior do que a média global e é mais do que o dobro no Ártico, por exemplo. O IPCC apresenta de forma detalhada os cenários futuros para cada uma das grandes regiões do planeta. Com 1,5ºC ou até 3ºC acima dos níveis pré-industriais, regiões como o Hemisfério Norte o Ártico sofreriam impactos maiores do que outras áreas.
O relatório também projeta cenários futuros possíveis decorrentes do aumento da temperatura global em curto, médio e longo prazos. Entre os menos impactantes está o que diz que "a temperatura da superfície global continuará a aumentar até pelo menos meados do século em todos os cenários de emissões considerados" . Os mais graves incluem aumentos na frequência e na intensidade de extremos de calor, mudanças nas correntes marinhas, fortes precipitações, secas com efeitos na produção agrícola, aumento na proporção de ciclones tropicais intensos, e reduções na cobertura de neve e no permafrost (solo típico do Ártico). O novo relatório do IPCC aponta que muitas das mudanças observadas no clima não têm precedentes em milhares e centenas de milhares de anos. Algumas dessas alterações, como o aumento contínuo do nível do mar, já são irreversíveis em períodos também de centenas a milhares de anos. (Com agências internacionais)
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>