O depoimento do deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP) no inquérito que apura a organização e o financiamento de atos antidemocráticos, prestado na semana passada, trouxe aos investigadores informações sobre bastidores da campanha eleitoral e do primeiro ano de governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Embora a investigação se debruce sobre manifestações recentes contra autoridades e instituições democráticas, o relato do parlamentar, hoje rompido com o Planalto, conta detalhes dos tempos em que teve trânsito livre entre aliados e apoiadores bolsonaristas.
A versão dá conta da fritura do ex-ministro da Secretaria de Governo, general Carlos Alberto dos Santos Cruz, atribuída à resistência do militar em contratar blogueiros na Secretaria de Comunicação, e do papel do empresário Otávio Oscar Fakhoury como articulador e financiador de encontros para definir estratégias de divulgação na campanha presidencial e debater os 100 primeiros dias do governo Bolsonaro.
"Otávio é um dos financiadores do (site) Crítica Nacional e amigo de Eduardo Bolsonaro, Carlos Bolsonaro e do próprio Presidente da República", diz um trecho do termo de declaração de Frota. "Oscar Fakhoury financiou e organizou encontros, por volta de 06/04/2018, envolvendo integrantes do grupo acima mencionado com objetivo de estabelecer estratégia de divulgação na campanha presidencial, além de outro encontro organizado para debater os primeiros dias do governo Bolsonaro".
Questionado sobre como teve conhecimento dos encontros, Frota afirmou que os integrantes do grupo divulgaram fotos dessas reuniões em hotel.
Ligado à ala influenciada pelo guru Olavo de Carvalho, Fakhoury administra grupos de brigadas bolsolavistas no WhatsApp, financia páginas de apoio ao governo e manifestações a favor do presidente. Recentemente, anunciou que pretende criar uma rede de comunicação conservadora de direita no País, com direito à emissora de TV e rádio. Segundo ele, o projeto chegou a ser discutido com o Secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, em razão da expertise do secretário, e, se necessário, vai buscar financiamento no sistema bancário, inclusive no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Desde abril, o empresário é investigado no inquérito sigiloso sobre a organização e o financiamento de atos contra a democracia, em curso no Supremo Tribunal Federal. Durante as apurações, chegou a ser alvo de buscas determinadas pelo ministro Alexandre de Moraes na Operação Lume. Na ocasião, os advogados João Vinícius Manssur e William Iliadis Janssen, que representam Fakhoury, divulgaram uma nota reforçando que ele nega qualquer ato ilícito. Fakhoury já admitiu publicamente ter financiado manifestações pró-Bolsonaro e pró-impeachment de Dilma Rousseff, mas rechaça envolvimento em fake news ou atos antidemocráticos.
Na semana passada, Fakhoury divulgou uma carta aberta ao presidente Jair Bolsonaro criticando a indicação do desembargador Kássio Nunes Marques para a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria antecipada do ministro Celso de Mello. No texto, nega ter se aproximado do governo para pedir favores ou cargos.
"Nunca precisei de nenhum favor do governo e, se precisasse, não pediria. Nunca tive e nem nunca pretendi ter cargos no governo. Meus pedidos nunca foram pessoais, mas sim aqueles a que todo o cidadão tem direito", diz a carta. "Pedi que o governo trabalhasse a favor do cidadão e de sua liberdade; que protegesse o indivíduo e as famílias da tirania da burocracia estatal por meio da estrita defesa dos princípios do direito e das garantias fundamentais listadas na Constituição Federal. Pedi também que o governo cumprisse suas promessas de campanha – claro que levando em conta o que é possível e o que não é possível de ser atingido nesse mandato – mas sempre mostrando os melhores esforços, de forma a manter a esperança e o engajamento da sua base de apoio", cobrou o empresário.