No último dia de 2021, o governo federal resolveu reduzir o incentivo tributário dado aos fabricantes de concentrados de refrigerantes produzidos na Zona Franca de Manaus. Decreto do presidente Jair Bolsonaro publicado no Diário Oficial de desta sexta-feira, 31, diminui o crédito que os grandes fabricantes de refrigerantes podem acumular ao vender o xarope produzido em Manaus (AM) para engarrafadores instalados em outros Estados.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CERVBRASIL), o decreto reduz as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) relativas aos extratos concentrados para elaboração de refrigerantes. Quanto menor é a alíquota, menor é o crédito que pode ser usado pelos gigantes de refrigerantes, como Ambev, Heineken e Coca-Cola.
Nesse caso, quanto maior a alíquota do IPI, mais vantagens os fabricantes têm para gerar créditos de um imposto que não é pago e que são utilizados para abater outros tributos. A redução do IPI significa, na prática, que as indústrias de refrigerantes terão menos "créditos" do tributo. Ou seja, pagarão mais impostos, como os demais fabricantes de bebidas.
"Entendemos que este é o caminho a ser percorrido para estabelecer um ambiente concorrencial justo e saudável no setor de bebidas brasileiro. Há muito ainda a fazer, mas é um começo", disse Paulo Petroni, presidente da CERVBRASIL. A entidade, que representa cervejarias que não têm produção na Zona Franca, trava uma guerra com para acabar com esses incentivos por considerar extremamente lesivo à concorrência.
Procurados pelo <i>Estadão/Broadcast</i>, a Receita Federal e o Ministério da Economia não responderam o pedido de informações sobre o impacto da medida e o seu alcance. O decreto traz tabela do IPI incidentes em vários produtos. A Receita faz todos os anos uma atualização da Tabela de Incidência do IPI. Este ano foram alterados muitos decretos, inclusive o 10.523, que trata de concentrados.
Advogados da CERVBRASIL ainda estão analisando o impacto das mudanças. As novas alíquotas entram em vigor a partir de 1º de abril de 2022. Até lá, muita articulação política deve acontecer para tentar barrar a redução no benefício.
O presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Indústria Brasileira de Bebidas, deputado Fausto Pinato (PP-SP), afirmou, em nota, que o decreto é um pequeno passo na direção da correção de uma das maiores distorções concorrenciais que o sistema tributário Brasileiro carrega.
"Infelizmente, não resolve, pois o grande problema são os ilícitos tributários, que podem até aumentar. Já devemos ter um contencioso relacionado na casa de R$ 30 bilhões", relatou o deputado. Ele questiona a decisão de a Receita fixar um período de noventena para a redução das alíquotas.
Para o economista e consultor do setor, Antônio Corrêa de Lacerda, esse modelo de tributação faz com que haja um paraíso fiscal dentro do próprio Brasil. Lacerda tem estudado o tema e calcula que irregularidades no pagamento de tributos geraram até 2020 um contencioso total de R$ 20 bilhões no Brasil, além de mais de US$ 5 bilhões nos Estados Unidos.
<b>Política</b>
Por interesses políticos no Amazonas, o presidente Jair Bolsonaro havia dobrado o benefício durante o seu governo, quando a tendência seria uma queda num cenário de restrição fiscal. Lacerda diz que o que chama a atenção no caso brasileiro e, particularmente no mercado de bebidas frias, é a prática do uso de artifícios da Zona Franca de Manaus para turbinar benefícios e o lucro de poucas e grandes empresas, inclusive por meio de fraudes tributárias.