A tentativa do governo de conter os preços dos combustíveis, com a aprovação da redução de impostos no Congresso Nacional, terá pouco efeito, mas custos elevados, avalia David Zylbersztajn, professor do Instituto de Energia da PUC-Rio e ex-diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Crítico de qualquer tipo de mecanismo de controle de preços, o especialista lembra que essa medida recai sobre o Tesouro, resultando em mais endividamento público ou no redirecionamento de gastos com outros fins.
A seguir, os principais trechos da entrevista ao Estadão.
<b>As medidas do governo conseguirão baixar os preços?</b>
Não é possível baixar o preço de alguma coisa sem ter custo para alguém. O governo está abrindo mão de impostos que teriam alguma outra destinação. De onde vem o dinheiro? Ou vamos gerar mais dívida, e isso vai gerar mais inflação, ou vamos tirar do orçamento de quem precisa. Só que, pela quantidade de volume de diesel e gasolina, o impacto para o consumidor vai ser muito baixo e, para as contas públicas, será estrondoso. O governo não tinha dinheiro para a ação de distribuição de absorventes para meninas e mulheres carentes. Disseram que não tinha dinheiro no Orçamento. A educação perdeu recursos, ciência e tecnologia perdeu mais um tanto, as estradas perderam recursos para restauração. Tudo isso somado é um troco em relação ao que se vai gastar para subsidiar combustíveis fósseis.
<b>Gastar com o controle de preços de combustíveis não vale a pena?</b>
Vamos priorizar quem anda de trem a R$ 7,00 a passagem ou quem anda de carro a R$ 7,00 o litro? Essa é a questão que temos de levar em consideração. O petróleo sempre foi um fetiche nacional, desde a fundação da Petrobrás.
<b>Por que o efeito para o consumidor é baixo?</b>
Basta haver mais um aumento qualquer, seja no câmbio, seja no preço do barril, para que essa redução desapareça.
<b>Empresas do setor defendem a medida de redução de impostos, alegando que reduziria a burocracia do setor. Esse aspecto é positivo?</b>
Seria, se fosse para a economia como um todo. Não seria uma coisa artificial. Uma reforma tributária bem-feita é transparente e é para todo mundo.
<b>Qualquer mecanismo de suavização de preços é ruim?</b>
Alguém esperava uma inflação de 10%? E o trigo? E a farinha? Vamos fazer a mesma coisa? Vamos criar fundos de estabilização da volatilidade? A economia não funciona assim. De repente se criou uma figura de estabilidade e previsibilidade (para os combustíveis) que não existe pra nenhum segmento. Seria lindo se pudesse fazer (para toda a economia), mas, numa economia de mercado, isso não funciona. Pelo contrário, no congelamento de preços tínhamos a maior previsibilidade do mundo, mas pagávamos a conta depois, ou tirando dinheiro da saúde, da segurança, da educação, ou em termos (de expansão) da dívida pública.
<b>A guerra na Ucrânia não é uma situação excepcional?</b>
De 2011 a 2014, tivemos o barril do petróleo bem mais alto do que temos hoje, a preços corrigidos. Convivemos com o barril a mais de US$ 100 por quatro anos, e ninguém no Congresso se mobilizou. Atribuo boa parte disso ao fato de estarmos a sete meses da eleição. E aí usam o pretexto da guerra. O preço já vinha subindo havia bastante tempo, a Petrobras é que vinha comprimindo, não reajustava havia quase 60 dias. A evolução maior não aconteceu depois da guerra. Espero que a guerra não demore muito, em termos humanitários, mas, em termos econômicos, do petróleo em si, não vejo muitos problemas. Cada vez mais vamos tendo ajustes em relação ao que representa a Rússia no mercado mundial. Temos uma capacidade de adaptação, em relação ao petróleo, muito rápida. Depois que ajustou, não faz diferença, a guerra pode demorar um mês, dois meses ou três meses. No gás natural é diferente. A guerra, francamente, não é argumento. Não existe, no curto prazo, risco de falta de petróleo, a menos que a guerra se expanda. As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>