Uma piora dos ativos de risco e o fortalecimento da moeda norte-americana no exterior, na esteira de discurso duro de dirigente do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos), fizeram o dólar reduzir bastante o ritmo de queda ao longo da tarde desta terça-feira, 12, e tocar pontualmente o terreno positivo. Mas o sinal de baixa acabou prevalecendo e a divisa emendou o segundo pregão seguido de perdas ante o real. Operadores voltaram a relatar entrada de fluxo estrangeiro, dada a atratividade das taxas de juros locais, e fechamento de câmbio por exportadores.
Os negócios no mercado de câmbio foram pautados nesta terça-feira pelas especulações em torno do grau e da intensidade do ajuste monetário nos Estados Unidos, em meio ao prolongamento da guerra na Ucrânia e a dúvidas sobre o ritmo de crescimento e inflação na China, que enfrenta novo surto de covid-19.
Pela manhã, na esteira da divulgação do índice de inflação ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) nos EUA em março, o apetite ao risco falou mais alto e empurrou o dólar à vista para a mínima da sessão, a R$ 4,6229 (-1,44%). O CPI subiu 1,2% em março, ligeiramente acima das expectativas (1,1%), levando a variação anual a 8,5%, a maior desde 1981. Mas o mercado se apegou a leitura de 0,3% do núcleo (que exclui energia e alimentos), abaixo do consenso (0,5%). Seria um sinal de que o processo inflacionário estaria no pico e, portanto, começaria a arrefecer.
Nas mesas de operação, comentou-se que o mercado se posicionou de forma muito defensiva à espera do CPI e, dado o alívio do núcleo, tratou de ajustar posições. O real também estaria sendo favorecido pela alta dos preços das commodities, que se recuperaram após flexibilização do <i>lockdown</i> em Xangai. Além disso, o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, pediu "senso de urgência" para implementar medidas de estímulo à economia já anunciadas pelo governo.
A festa dos ativos de risco começou a azedar ao longo da tarde, à medida que investidores digeriam discurso da diretora do Federal Reserve Lael Brainard. Indicada a vice-presidente do BC americano e outrora vista como "dovish", Brainard agora adota uma postura mais dura. Embora tenha afirmado que a desaceleração do núcleo do CPI é "digna de nota", a dirigente ressaltou que a inflação continua "muito elevada". O BC americano vai promover um "aperto monetário metódico, com uma série de altas de juros", e pode bater o martelo sobre a redução do balanço (a partir de junho) no encontro do Fed em maio (dias 3 e 4).
"O mercado viu no núcleo do CPI uma luz no fim do túnel, de que a inflação tenha atingido o teto. Mas a inflação ainda é muito alta nos Estados Unidos, no patamar de 8%. A Brainard reforçou a postura que o Fed mostrou na ata na semana passada, de subir os juros de forma mais rápida e começar a reduzir o balanço patrimonial", afirma Nicolas Giacometti, especialista de Renda Fixa da Blue 3.
Lá fora, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a seis divisas fortes – tocou nova máxima à tarde, aos 100,332 pontos. As divisas emergentes pares do real, como o peso mexicano e o rand sul-africano, desaceleraram os ganhos frente à moeda americana. Por aqui, o dólar à vista chegou a tocar o terreno positivo, na casa de R$ 4,69, mas logo em seguida voltou a cair. No fim do dia, era cotado a R$ 4,6767, em baixa de 0,29% – o que leva as perdas em abril para 1,77%. No ano, a desvalorização acumulada é agora de 16,13%.
O operador Hideaki Iha, da Fair Corretora, notou entrada de fluxo estrangeiro pela manhã, além de operações de exportadores. Isso teria levado à zeragem de posições no mercado futuro e potencializado a queda da moeda americana após a divulgação do CPI nos EUA. "O dólar não era para ter caído tanto pela manhã, mas acabou entrando fluxo e houve zeragem. O diferencial de juros (interno e externo) continua muito alto e não dá para carregar posição comprada (que ganha com a alta do dólar)", diz Iha. "Ao longo da tarde, o dólar se alinhou mais à tendência lá fora, operando perto de R$ 4,68".
Giacommeti, da Blue3, vê continuidade do fluxo de estrangeiros para o Brasil, tendo em vista a atratividade de operações de carry trade. O diferencial de juros deve continuar elevado mesmo que o Fed acelere o ritmo de alta de juros, dado que o Banco Central brasileiro ainda deve elevar a taxa Selic.
A leitura acima das expectativas do IPCA de março (1,62%), na sexta-feira, e a fala da segunda-feira do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, dando conta de que está "analisando a surpresa no IPCA para ver se muda a tendência", alimentaram a expectativa de que o BC não vai encerrar o ciclo de aperto monetário, com uma alta final da Selic em 1 ponto porcentual, para 12,75%, em maio, como sinalizado anteriormente.