O uso de emendas parlamentares para bancar eventos que celebram o Dia do Trabalho, em 1.º de Maio, é prática recorrente em São Paulo nos últimos cinco anos. No período, a Prefeitura liberou R$ 2,5 milhões a pedido de vereadores. Neste ano, foram autorizadas quatro indicações, no valor total de R$ 1,1 milhão.
Levantamento feito pelo <b>Estadão</b> com dados oficiais mostra que 17 emendas já foram autorizadas para pagar cachês de artistas, organizar exposições relativas ao tema ou custear serviços relacionados à montagem das estruturas necessárias para os eventos.
No domingo passado, a cantora Daniela Mercury fez apresentação na Praça Charles Miller, durante o 1.º de Maio pró-Lula das centrais sindicais. A 32 quilômetros, a Prefeitura patrocinou uma festa com apresentações musicais na Praça Jardim Myrna, no Grajaú, que teve a presença do prefeito Ricardo Nunes (MDB), do presidente da Câmara Municipal, Milton Leite (União Brasil), e do vereador Marcelo Messias (MDB), que também destinou recursos, via emenda parlamentar, para a comemoração.
Messias foi apresentado como o grande fiador da festa. Ao lado de Nunes e Leite, que também cumprimentaram o público, ele usou o microfone para avisar aos presentes que a "emenda era para eles". Já o prefeito se limitou a dizer que o dia era especial.
Em seguida, o deputado estadual Adalberto Freitas (PSDB), também do palco, pediu aos espectadores que gritassem "Marcelo, Marcelo", e foi acompanhado. Tratado pelos moradores da região como o "organizador da festa", Messias foi celebrado um dia após ter sido detido pela Polícia Militar por suposto desacato no local do evento. O pedido teria sido um ato de apoio e solidariedade. Messias não respondeu ao contato da reportagem.
Para o advogado especialista em direito eleitoral Alberto Rollo, ambos os casos deveriam ser apurados da mesma forma. "O recurso via emenda parlamentar deve ser empregado mediante interesse público. Se houve pedido de voto, a lei eleitoral deve ser aplicada, até mesmo com multa. E, se houve promoção pessoal, o caso pode ser de improbidade administrativa", disse.
A destinação de verba para o show de Daniela Mercury é a única investigada pela Controladoria-Geral do Município. O argumento é de que a apresentação teve caráter político-partidário. A cantora se apresentou após discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e levantou uma bandeira com o rosto do petista.
Ao <b>Estadão</b> o prefeito afirmou que a festa do trabalhador realizada no Grajaú não teve a mesma conotação político-partidária que o ato pró-Lula. Nunes também afirmou que foi por causa do caráter apartidário da festa do bairro da zona sul que ele apoiou o evento em 2019, quando, no cargo de vereador, destinou emenda ao evento.
<b>Cota</b>
Cada um dos 55 vereadores paulistanos pode indicar até R$ 4 milhões anuais em emendas. Em São Paulo, no entanto, o orçamento municipal não é impositivo – ou seja, não prevê que a Prefeitura seja obrigada a empenhar os recursos solicitados. Desde 2010, o Município já pagou mais de R$ 1,2 bilhão em emendas. Desse total, um terço foi destinado para bancar eventos culturais.
O vereador Alfredinho (PT), que repassou recursos para a infraestrutura da festa das centrais, afirmou que a destinação de emendas para eventos culturais é uma prática comum, seja para festas do trabalhador, juninas, aniversários de bairro ou eventos maiores, como a Marcha para Jesus. Em 2019, o evento religioso foi realizado na capital com emenda de R$ 1,1 milhão do vereador Gilberto Nascimento Júnior (PSC), com a presença do presidente Jair Bolsonaro.
Responsável pela emenda para o show de Daniela Mercury, o vereador Sidney Cruz (Solidariedade) disse que os principais eventos de São Paulo recebem verba via parlamentar. "É um ato legítimo, de interesse público. Mas é claro que nós, vereadores, não temos ingerência, controle sobre a fala dos artistas. No caso da Daniela, eu mesmo enviei ofício à Casa Civil para averiguar se houve desvio e pedi a glosa (bloqueio) do pagamento", afirmou. Na sexta, 6, a empresa que representa a artista pediu o cancelamento do contrato e do consequente pagamento, que seria de R$ 100 mil.
As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>