A recuperação de ativos de risco mundo afora, atribuída à percepção de que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) não vai acelerar o passo do ajuste monetário, abriu espaço para uma queda firme do dólar no mercado doméstico de câmbio nesta sexta-feira, 13. Operadores relataram fluxo de recursos estrangeiros para a Bolsa brasileira, em dia marcado por valorização das commodities agrícolas e metálicas, e para renda fixa local, dado o diferencial de juros interno e externo.
Afora uma alta pontual na primeira hora de negócios, quando cravou R$ 5,15 na máxima, o dólar operou em queda por todo pregão. Em uma sequência de mínimas ao longo da tarde, chegou a romper o piso de R$ 5,05 e desceu até R$ 5,0475 (-1,81%).
No fim do dia, o dólar era cotado a R$ 5,0575, em baixa de 1,61% – o que levou a moeda a encerrar esta semana em leve queda (-0,35%), após ter subido 2,86% na semana passada. Com isso, os ganhos do dólar em maio agora são de 2,32%. Em 2022, a divisa acumula perdas de 9,30%.
Retomando dinâmica vista no primeiro trimestre, o real, que vinha apanhando mais que seus pares nos surtos de aversão ao risco, nesta sexta liderou os ganhos entre as divisas emergentes e de países exportadores de commodities. Profissionais do mercado afirmam que, após a forte reprecificação do real em abril, a divisa começa a encontrar dificuldades para se manter acima de R$ 5,10, dado o alto custo de manter posições compradas em dólar em razão da taxa de juros doméstica elevada.
O índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de divisas fortes – trabalhou em queda, na casa dos 104,500 pontos. O tombo poderia ter sido até maior não fosse a derrocada do iene, após o Banco do Japão sinalizar que vai manter a política monetária expansiva para tentar trazer a inflação para cerca de 2% no curto prazo.
Na quinta, o presidente do Banco Central americano, Jerome Powell, reiterou que o plano de voo da instituição é promover altas de 50 pontos-base na taxa básica dos EUA nas próximas duas reuniões, embora tenha ressaltado que pode "fazer mais ou menos" dependendo do desempenho da economia.
Nesta sexta, o presidente do Federal Reserve (Fed) de Minneapolis, Neel Kashkari, disse que o BC americano vai fazer tudo que for necessário para controlar a inflação, mas que tem esperança de que o aperto monetário não precise ser tão agressivo. A presidente do Fed de Cleveland, Loretta Mester, que na terça-feira causou bulício no mercado ao dizer que uma elevação da taxa americana em 75 pontos base não estava descartada, defendeu nesta sexta altas de 50 pontos-base na reunião do Fed em junho e julho. A decisão de acelerar ou diminuir o passo ficaria para setembro.
"Não nos parece essencialmente relevante essa discussão 50 pontos base versus 0,75 pontos base, mas o mercado tem essa tendência de se apegar a pontos focais", afirmam, em relatório, economistas do Banco Original, ressaltando que o índice de preços ao consumidor (CPI) nos EUA em abril, acima das expectativas, "conversa com mais juros" e que a velocidade do aperto passa pelo ajuste fino do Fed. "Olhando para nossa moeda e demais exportadores de commodities, podemos credenciar à desvalorização do yuan (moeda chinesa) boa parte da desvalorização do real e de seus pares nas últimas semanas. Notícias positivas por lá deveriam repercutir positivamente por aqui", afirmam os economistas do Original.
Para o gestor e sócio da Galapagos Capital, Sergio Zanini, o debate em torno de uma alta dos Fed Funds em 75 pontos base "deve voltar à mesa", dada a necessidade de desinflacionar a economia americana. "Vai ser uma pedra no sapato do mercado e impedir uma melhora mais substancial dos ativos", diz Zanini, que pinta um quadro de desaceleração da atividade global em ambiente de inflação ainda em níveis elevados nos próximos meses.
Além da perda de fôlego da economia americana, Zanini mostra preocupação com a China, em razão da política de tolerância zero com a covid-19, e com a Europa. Países da região, como a Itália, apresentam fragilidade fiscal e devem sofrer com a provável alta de juros pelo Banco Central Europeu (BCE) neste ano. "Os apertos monetários nos países desenvolvidos retiram liquidez global em um ambiente de desaceleração da economia, o que é muito negativo para ativos de risco", diz Zanini. "O ambiente é de dólar forte no mundo. O euro pode vir abaixo da paridade com o dólar nos próximos 12 meses."
Apesar do cenário global conturbado e da provável volta da questão fiscal doméstica ao radar dos mercados com a proximidade das eleições, Zanini acredita que o real não deve enfrentar uma rodada forte de depreciação. A moeda local conta com dois trunfos: perspectiva de manutenção de preços de commodities ainda em nível elevados, em razão de gargalos específicos de oferta, e taxa real de juros robusta, quando se compara a taxa Selic com a inflação projetada doze meses à frente.
"O risco maior para o real vai ser o segundo semestre, até a eleição e no pós-eleição, porque não se sabe qual vai ser o regime fiscal. Mas o Brasil deve se beneficiar da questão estrutural das commodities e do juro alto. O dólar deve ficar nesse patamar de R$ 5", diz Zanini, que também aponta o fato da China ter depreciado o yuan como motivo principal para a derrocada do real em abril e na primeira semana de maio.