Estadão

Morre Ismênia Coaracy, a pintora do movimento

Das figuras disformes alongadas às abstrações, o universo onírico de Ismênia Coaracy sempre foi movimentado. Em suas telas, uma espécie de noite veloz dava pé para figuras soturnas que transmitem a sensação de se estar em um sonho agitado. Coaracy não só incorporou a abstração em sua obra, como a ressignificou, como notou a crítica Aracy Amaral.

A artista morreu nesta terça-feira, 31, em São Paulo, aos 103 anos, informou a galeria Mapa em comunicado à imprensa. Ela faria 104 em dezembro e deixou um legado sólido, sendo referência para artistas como Jonathas Andrade, que expôs em Veneza, como ressaltou o curador Saulo di Tarso.

Amaral deu a letra, quando escreveu que "Encontramo-nos diante de uma pintora que fala em voz alta, no mesmo nível do mundo que a rodeia, não mais no refúgio dos sonhos, mas colocando esse mesmo item, o inconsciente, a par com a realidade de cada dia.", definiu a crítica. Discreta, a Coaracy foi autodidata e, no final dos anos 1950, integrou o Grupo Guanabara, que tinha entre seus membros o pintor Arcângelo Ianelli (que faria 100 anos no próximo mês de julho).

Já nos anos 1960, teve sua primeira individual na cidade de São Paulo, estudou história da arte e escultura. Foi uma década promissora para sua carreira. Em 1962, Coaracy estreou na 7º Bienal Internacional de Arte de São Paulo com trabalhos abstratos e experiências com colagens. De veia expressionista, o movimento é uma questão de primeiro plano em suas pinturas, sejam os retratos e suas personagens ou abstrações de fato.

O crítico José Roberto Teixeira Leite considerava notável o cromatismo da pintora, marcado por fortes pinceladas, cores intensas, que incorporam à atmosfera o místico, sendo Ismênia uma das principais representantes do realismo fantástico nas artes visuais brasileiras.

"Chega ela assim a um realismo fantástico, numa trajetória tranquila, e a matéria procurada com empenho antes cede lugar às cores e às formas mais vastas", classificou Amaral. Multifacetada, a artista manteve um espírito curioso e era adepta de experimentações, como as que fez com o filme Super-8 na década de 1970, além de trabalhos como ilustradora, para jornais e revistas, entre eles o antigo Suplemento Literário, do <b>Estadão</b>.

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