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Em Nome do Céu, o preço do choque entre a fé e a violência

Assim que leu Pela Bandeira do Paraíso: Uma História de Fé e Violência, de Jon Krakauer (o autor de Na Natureza Selvagem e No Ar Rarefeito), Andrew Garfield sabia que, um dia, o livro seria transformado em filme ou série. É a história real do assassinato de Brenda Lafferty e sua filha bebê, Erica, em 1984, e uma investigação sobre fundamentalismo mórmon e sobre a origem e o desenvolvimento da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. "Eu fiquei fascinado com os temas, como a história era fascinante e aterrorizante", disse o ator durante painel da Associação de Críticos de Televisão, por videoconferência.

Corta para dez anos depois, quando Garfield recebeu um telefonema de Dustin Lance Black, vencedor do Oscar de roteiro por Milk – A Voz da Igualdade (2008), Ron Howard e Brian Grazer. Os três, depois de tentar fazer um filme com o material, acabaram optando por uma minissérie em sete episódios, Em Nome do Céu, que acabou de estrear no Star+. "Era o time perfeito", contou Garfield. "E, com Dustin sendo tão ligado ao tema principal, logo me convenci de que era um grupo incrível de pessoas que iriam honrar o que Krakauer escreveu e a história de Brenda e Erica Lafferty, destrinchando o que permitiu tamanho horror acontecer, quase como um passo a passo."

<b>EXPERIÊNCIA</b>

Dustin Lance Black sabia do que estava falando. Ele foi criado como mórmon e abandonou a igreja por discordar do tratamento dado a mulheres e pessoas LGBT, como ele. "Eu mentiria se dissesse que não trouxe a minha experiência para o roteiro e para a tela", revelou ele em entrevista com a participação do <b>Estadão</b>. "Mas tentei não incluir a minha história. Claro que foi útil ter crescido mórmon, especialmente quando fui visitar a família da Brenda, por quem me apaixonei. Eles acabaram me cedendo seus diários e suas cartas. Muitas informações vêm de suas próprias palavras."

Na série, os Lafferty são uma família proeminente na fictícia cidade de East Rockwell, Utah – o nome original foi alterado porque os investigadores do caso pediram para que suas identidades não fossem usadas. Assim, o detetive Jeb Pyre (Andrew Garfield), mórmon, é um personagem fictício. Pyre, junto com Bill Taba (Gil Birmingham), não mórmon, de origem paiute, um dos povos originários dos Estados Unidos, é responsável por examinar o assassinato brutal de Brenda Lafferty (Daisy Edgar-Jones, de Normal People) e sua filha bebê, Erica.

Pyre não é o primeiro religioso que Garfield interpreta. Ele fez um cristão adventista do sétimo dia que se recusa a matar na guerra em Até o Último Homem (2016), um padre jesuíta do século 17 em Silêncio (2016) e um televangelista em Os Olhos de Tammy Faye (2021). "É um mistério para mim por que fiz todos esses papéis", comentou o ator. "Acredito que a espiritualidade e a fé afetam o que fazemos enquanto estamos vivos. Então é a questão mais interessante que posso explorar como contador de histórias e na minha vida também."

Sua religião vai ajudá-lo nas investigações, mas Pyre também terá de lidar com o fato de que nem todos os mórmons são bons. Brenda, que nasceu em uma família mórmon mais liberal e gostava de cantar e atuar, conheceu Allen Lafferty (interpretado por Billy Howle) na universidade. Ela se mudou para Utah depois do casamento e começou a conviver com a família Lafferty, bem mais ortodoxa do que a sua. Muitas vezes, ela era vista como ousada demais. Em Nome do Céu mostra a radicalização de alguns dos irmãos de Allen, que abraçam o fundamentalismo.

"Eu sempre fico intrigado com histórias familiares", explicou o produtor Ron Howard. "Aqui se trata de uma família de pessoas destacadas que têm suas vidas transformadas de maneira trágica. E poderia acontecer com um monte de gente de fés diferentes, porque, no fundo, a série fala de como sistemas de crença humanos podem ser distorcidos e manipulados para justificar atos de opressão e violência."

<b>FUNDAMENTALISTAS</b>

Por isso, Em Nome do Céu não é apenas uma história sobre os mórmons, acredita Dustin Lance Black. "Eu espero que, quando as pessoas virem esses rapazes se tornando fundamentalistas, elas percebam que isso poderia acontecer com seu irmão ou vizinho", observou. "E que possam dizer a qualquer pessoa indo para o fundamentalismo de qualquer tipo: Não faça o que os Lafferty fizeram, aquelas regras não vão te salvar. Elas estão ultrapassadas. Temos mais conhecimento agora, então podemos ser melhores. Essa virada em direção ao fundamentalismo está acontecendo no mundo todo, e é muito perigosa."

Black, que além de roteirista e diretor é ativista, acredita que tudo é uma forma de narrativa. "Não acho que a maneira como certos ativistas agem, lançando granadas para o outro lado, resolva alguma coisa", concluiu. "Se você quer mudança, não mire na cabeça. Mire no coração. Compartilhar uma história pessoal para que possam entender não só no que você acredita, mas de que modo aquilo o afeta, pode mudar uma opinião. Por isso acredito nas histórias que contamos no cinema e na TV."

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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