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Prova difícil e impacto da pandemia afastam candidatos de vestibulares

Não é só o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que tem registrado queda significativa de inscritos. Tradicionais vestibulares de universidades paulistas – como a Fuvest, da USP, o da Unicamp e o da Unesp – também perdem candidatos nos últimos anos. Uma explicação para esse fato é o próprio teste federal, que passou a ser usado por essas instituições na oferta de parte das vagas. Outros fatores são os impactos da pandemia, que trouxe déficits de aprendizagem e desestímulo para muitos jovens, sobretudo os mais pobres, que veem nas provas desafio inalcançável, e decidem nem tentar. A necessidade de trabalhar também deixa o sonho do diploma mais distante.

Nas universidades estaduais de Campinas (Unicamp) e Paulista (Unesp), o total de concorrentes é o menor desde 2012: 61,6 mil e 67,5 mil, respectivamente. Já o total de candidatos na Universidade de São Paulo (USP) atingiu o menor índice em 2021, com 110,7 mil inscritos. Neste ano, a Fuvest, cuja 1.ª fase será realizada hoje, registrou ligeiro aumento, de quase 4 mil vestibulandos, mas ainda distante dos 172 mil registrados em 2013.

"É um grande quebra-cabeça, com várias peças", avalia o coordenador do Curso Anglo, Madson Molina. "Difícil falar de pandemia e não citar também o cenário econômico. Tem muitos alunos que abandonaram o projeto do ensino superior porque tinham de trabalhar. Um jovem que naturalmente seguiria para o ensino superior, mas precisou ir direto para o mercado de trabalho", avalia ele, que também vê impacto da transição etária no Estado, com a diminuição da quantidade de adolescentes.

A abrangência do Enem, outro dos motivos destacados por Molina, facilitou e barateou a vida dos vestibulandos. Antes, era preciso fazer várias provas, geralmente com poucos dias de diferença, pagar várias taxas de matrícula e até viajar para tentar a sorte em mais de uma instituição. Agora, apenas com a nota do exame federal é possível concorrer no País todo.

"Acaba sendo uma estratégia dos candidatos de se dedicarem a uma prova de amplitude nacional e não perderem recursos de tempo com provas regionais, que não sabem se terão bom desempenho", ressalta Gustavo Monaco, diretor executivo da Fuvest.

<b>EXIGÊNCIA. </b>Além disso, o nível de exigência das provas paulistas assusta Lívia Cabral, de 17 anos, que mira uma vaga em Medicina. Ela fez a Unicamp e achou o teste mais difícil do que nos anos anteriores – agora conta as horas para a Fuvest. "A dificuldade elevada não acompanha o nosso ritmo de pandemia em EAD (ensino a distância)", diz.

Com acesso à internet e computador próprio, a jovem ainda conseguia acompanhar as aulas remotas na pandemia. Mas, segundo o Instituto Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE), 28,2 milhões de brasileiros de 10 anos ou mais não usavam a internet em 2021, sendo 3,6 milhões deles estudantes.

Rayssa Campos, da mesma idade, colega de Lívia no COC de Araraquara, no interior paulista, desistiu das universidades estaduais e prefere focar no Enem e em cursos privados. "Medicina nestas faculdades (USP, Unicamp e Unesp) é desumano, você tem de praticamente gabaritar a prova", opina a jovem, que diz não ter como ficar quatro ou cinco anos em um pré-vestibular.

"A Fuvest é difícil mesmo. Ela precisa ser difícil, porque o número de interessados é bastante grande. Se fazemos uma prova muito fácil, isso tem um impacto complicado, que é um número elevado de empates, o que deixa tudo ainda mais complexo", justifica Monaco.

Diretor da Comissão Permanente para o Vestibular da Unicamp (Comvest), José Alves atribui à covid e ao longo período de escolas fechadas grande parte da redução de inscritos. "Isso levou estudantes a ficarem mais desestimulados, é um processo seletivo exigente. Muitos candidatos talvez tenham se sentido pouco preparados para poder enfrentar uma maratona, como essa no caso da Unicamp", destaca.

Segundo Alves, foi justamente a carreira de Medicina, uma das mais disputadas na maioria dos processos seletivos, a principal responsável pela queda de inscritos deste ano. Para a entrada em 2023, a relação candidato/vaga para este curso é de 294.

Embora alta, essa taxa na edição anterior era de 325 por vaga, ou seja, são 30 estudantes a menos na disputa por uma cadeira. Mas mesmo com a alta cobrança de conteúdos e a possibilidade de fazer a prova perto de casa, a baiana Mariana Neri, de 16 anos, decidiu viajar para São Paulo, com uma amiga, com o objetivo de encarar a Fuvest. "O Enem dá poucas vagas para entrar na USP. Acredito que fazendo o vestibular tenho mais chances, por ter mais vagas", aposta.

Para 2023, a USP oferece oferecerá 11.147 vagas. Desse total 8.230 destinadas para seleção por meio da Fuvest e 2.917 vagas, pelo Enem. "De qualquer forma, a gente também passeia e conhece a cidade", brinca Mariana, que também pretende se formar como médica na universidade paulista.

A ligeira alta de inscritos nesta edição é fruto de uma série de novas ações conduzidas pela fundação. Dentre elas, destacam-se a presença mais forte nas redes sociais e a visita de ex-alunos da USP vindos da rede pública às escolas que frequentaram para incentivar a inscrição dos adolescentes. "Começamos essa movimentação e intensificamos, sobretudo na 2.ª metade de setembro, porque percebemos impacto bastante positivo no número de inscrições que entravam nos dias seguintes das escolas visitadas", conta Monaco.

<b>VAGA NO EXTERIOR.</b> Se na maior parte dos casos a baixa renda das famílias é um obstáculo determinante no caminho de jovens pobres até a universidade, do outro lado a perspectiva de ir para fora do País atrai estudantes de escolas particulares de São Paulo.

Lucas Faro, de 17 anos, é um deles. Aluno do colégio Pentágono, o jovem até se inscreveu na Fuvest, mas "apenas por fazer", em suas palavras. A meta dele é ser aceito em uma universidade dos EUA ou do Canadá, onde pretende se especializar na área de Economia e Ciência Política. Para se dedicar aos planos no exterior – o processo de admissão envolve também entrevistas e o envio de cartas -, ele abriu mão das provas de Unicamp e Unesp.

O Enem também se tornou uma porta de acesso a instituições de ensino superior no exterior. Por meio de acordos com o governo brasileiro, 51 instituições de ensino portuguesas aceitam a prova no processo de admissão, entre elas as universidades de Coimbra, do Porto e de Lisboa.

Vice-diretor de Inovações Pedagógicas do Pentágono, Bruno Alvarez acena que há ainda o movimento de ficar em São Paulo, mas optar por uma instituição de ponta na rede privada. Entre os nomes mais citados por especialistas estão as faculdades Einstein, FGV, Insper e ESPM. "Já ouvi muito um discurso de preferir uma universidade particular na capital do que ir para Unicamp, Unesp, ou até a USP de Ribeirão Preto", conta.

As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>

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