A bateria de mais de 2,7 mil testes para o novo coronavírus em jogadores dos 60 clubes das Séries A, B e C do Campeonato Brasileiro nos últimos dias revelou um dado a ser comemorado pelos médicos. De todos os exames colhidos a partir de amostras de sangue, cerca de 16% dos atletas já apresentaram soroprevalência, isto é, adquiriram anticorpos e estão por enquanto imunes. O mapeamento mostrou ainda que nenhum dos mais de cem contagiados teve contato com a covid-19 durante os jogos.
Quem tem acompanhado esses dados é o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Clóvis Arns da Cunha, escolhido pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) como consultor para monitorar os dados da pandemia nos torneios nacionais. Na avaliação dele, o número de 15,8% de jogadores contagiados e recuperados é positivo pois demonstra uma segurança maior para a disputa da competição e serve também como um dado interessante para o aprofundamento dos estudos médicos.
"O atleta tem contato com o vírus, mas o sistema imunológico dele tem competência suficiente para ele ter uma imunidade. A medicina só não sabe por quanto tempo essa proteção vale. Vamos ter de acompanhar esses jogadores para conseguir responder", disse o infectologista ao <b>Estadão</b>. Por mais que os demais atletas ainda possam se contaminar (84,2% do total), o médico avalia que com o tempo a quantidade de jogadores com soroprevalência vai aumentar e permitir até mesmo a diminuição da quantidade de testes.
De todos os casos positivos, somente um atleta teve sintomas. Um jogador do CSA apresentou tosse leve por dois dias. Os demais jogadores não tiveram alteração alguma. "Está sendo muito seguro disputar o Campeonato Brasileiro. Fora isso, nossas análises têm rendido informações interessantes para nossos estudos", afirmou o médico. Uma das vertentes em análise pelos infectologistas é que um estudo feito pela Prefeitura de São Paulo com alunos da rede pública mostrou uma coincidência com os dados do Brasileirão: novamente 16% dos examinados tiveram contato com o vírus e se recuperaram.
Apesar de algumas partidas terem sido adiadas pela elevada quantidade de casos nos elencos, os médicos têm a certeza de que não houve transmissão do vírus durante as partidas. O mais provável é os jogadores terem sido contaminados em outros ambientes, como hotéis, viagens ou restaurantes. A afirmação foi comprovada a partir de um estudo detalhado justamente sobre o CSA, time que teve 21 casos positivos da doença e o único a registrar atletas com sintomas.
A comissão médica da CBF se debruçou sobre dois jogos disputados pelo CSA no início de agosto, contra o CRB, pelo Campeonato Alagoano, e depois diante do Guarani, pela Série B do Brasileiro. O estudo procurou identificar se houve casos positivos encontrados nos dois adversários, porém não identificou transmissão.
Para embasar essa análise, os médicos recorreram até mesmo ao aparelho do GPS utilizado por todos os jogadores embaixo da camisa. O equipamento indica informações completas de distância e localização. Assim, foi possível até mesmo conferir se um atleta com suspeita de contaminação teve contato prolongado durante a partida com um outro adversário. O trabalho indicou que não houve qualquer transmissão.
Segundo o presidente da SBI, os estudos médicos existentes mostram que durante as partidas o risco de contágio é menor. A covid-19 costuma a ser propagada com mais eficiência em contatos sem máscara em que as pessoas permaneçam por 15 minutos ou mais em uma distância de até um metro entre si. "No futebol, as pessoas têm contato com o adversário por alguns instantes. Isso pode ser outra razão para a segurança do jogo", explicou Cunha.
O levantamento da CBF e de SBI detalhou até mesmo a quantidade de jogadores com soroprevalência em cada uma das diferentes divisões. Na Série A o dado foi de 14,4%, na Série B de 15% e na C, de 18%. A média geral entre todos os atletas dos 60 clubes das três principais divisões é de 15,8%.
O <b>Estadão</b> apurou que, com esses números em mãos, a CBF avalia até mesmo reduzir a quantidade de testes em breve. Atualmente as coletas bancadas pela entidade são feitas duas vezes por semana, pois os times têm entrado em campo às quartas e aos domingos. Há o plano de já nas próximas semanas passar a se fazer os exames somente uma vez por semana, independentemente da quantidade de partidas que o time terá.