A crise no setor de bares e restaurantes está por trás de um novo fenômeno que se prolifera principalmente na internet, por meio das redes sociais ou dos grupos de aplicativos de mensagens, como WhatsApp e Telegram. São os bazares de compra e venda, espécie de "feiras do rolo" virtuais, onde empresários negociam de tudo – desde equipamento, mobiliários e louças até pontos comerciais inteiros.
Esse mercado informal opera 24 horas por dia e a oferta abundante é em geral proveniente de restaurantes que fecharam as portas em decorrência dos impactos econômicos causados pela pandemia da covid-19.
No Facebook, existem hoje 150 comunidades dedicadas ao tema, em levantamento feito pela reportagem. Já no WhatsApp, são por volta de 30 grupos, que geralmente operam no limite de capacidade dos usuários, com 256 participantes.
Nos dois casos, o objetivo é fechar negócios de compra e venda diretamente entre donos de empreendimentos – o que está fechando vende para o que se mantém aberto, com descontos que podem chegar a 75%.
O dinheiro levantado com as pechinchas geralmente serve para abater dívidas acumuladas ao longo do processo de decadência do negócio, como passivos trabalhistas, dívidas contábeis ou débitos com fornecedores.
Segundo levantamento da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o setor tinha antes da pandemia 1 milhão de estabelecimentos em atividade. De março para cá, 300 mil fecharam as portas.
<b>Vende tudo</b>
Em geral, as histórias dos vendedores são parecidas com a de Meire Pedroza, que fechou as portas do seu restaurante em julho, depois de 19 anos em atividade na Vila Olímpia. Com o período de fechamento forçado dos restaurantes (que, em São Paulo, durou 104 dias, estendendo-se de março a julho) e a política de home office adotada pelas grandes empresas, a ex-empresária conta que mergulhou em dívidas e, sem conseguir acessar os programas de crédito do governo, não teve como manter a casa em funcionamento.
"Vender tudo no WhatsApp foi uma forma para levantar um caixa rápido", disse Meire. "Usei o dinheiro para quitar o aluguel atrasado e algumas rescisões de funcionários."
Ela conta que liquidou em feiras virtuais um patrimônio instalado de R$ 200 mil por R$ 40 mil. Colocou à venda todos os equipamentos e mobiliários do restaurante antes de entregar o ponto.
Com uma dívida ativa estimada em R$ 400 mil, Meire ainda procura uma forma de recomeçar a vida. "Arrumei um emprego de corretora imobiliária para tentar, devagar, pagar todo mundo. Mas é muito difícil prosseguir com essa dívida toda."
Outra ex-empresária do setor, Regina Nogueira não se preocupou em fazer um inventário do que colocou à venda, depois de fechar seu restaurante no bairro do Paraíso em outubro, onde permaneceu por 30 anos.
"Evito até falar disso porque já começo a chorar", disse ela, enquanto organizava o bazar com o que chama de "miudezas" do seu negócio, como talheres, pratos, mesas, cadeiras. "Fiz muita divulgação na internet e entrei em grupos de venda do WhatsApp. Recebi aqui no salão uns donos de pousadas, de outros restaurantes, que compraram algumas coisas. Não tenho esperança de encontrar um comprador para o ponto. Vou entregar o espaço para o proprietário o mais rápido possível."
Se a maioria dos vendedores opta por liquidar pontos ou equipamentos na internet para quitar dívidas atrasadas, a maioria dos compradores é formada por empresários que, apesar do revés econômico, conseguiram se manter capitalizados, seja com recursos próprios ou buscando empréstimo.
Tita Dias, dona do bar Canto Madalena, diz que tomou emprestado R$ 374 mil no mercado, pelo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).
Como a taxa de juros é considerada baixa (ela fechou a linha por 3,25% ao ano), Tita aproveitou o recurso como uma janela de oportunidade para modernizar seu empreendimento. "Achei de grande valia a possibilidade de adquirir bons produtos com preços bem inferiores aos de qualquer loja de usados."
Maria Tereza Dias, dona de um restaurante por quilo no Itaim, também está comprando no WhatsApp os equipamentos que considera mais baratos. "Minha situação não é boa, eu estou abrindo o restaurante para atender 25 clientes por dia. Mas comprei umas prateleiras que estavam muito em conta." As informações são do jornal <b>O Estado de S. Paulo.</b>