Alto número de casos de covid no Brasil impede atletas de competir fora do País

Estava tudo preparado para Guilherme Abel entrar na pista. Os meses de intensos treinos físicos e mentais poderiam culminar numa boa performance nas provas de patinação de velocidade em Ibagué, na Colômbia. O brasileiro era favorito ao pódio e à vaga nos Jogos Pan-Americanos Juniores. Mas sua participação no torneio qualificatório foi impedida por uma decisão do presidente colombiano, Iván Duque Márquez, que vetou a entrada de brasileiros por conta do alto número de casos de covid-19 no País.

Em anúncio nas redes sociais, o presidente impediu a entrada de voos partindo do Brasil e vice-versa até o dia 27 deste mês, citando como motivação a cepa nova do coronavírus encontrada em Manaus. A medida atingiu em cheio os planos de Guilherme Abel, de outros cinco atletas e de uma treinadora. Os patinadores iriam tentar buscar a vaga na primeira edição do Pan-Americano dedicado aos juvenis, que será disputado também na Colômbia, na cidade de Cali, em setembro.

"Iríamos viajar no dia 4 deste mês. As passagens já estavam compradas, o hotel estava reservado. E no dia 28 de janeiro, recebemos a notícia de que a fronteira ia fechar. Foi aquele desespero. O que fazemos?", diz Abel, ao lembrar da decisão do presidente colombiano. "Tentamos ir no mesmo dia porque a fronteira fecharia só a meia-noite, mas o voo disponível poderia chegar depois do horário e aí não sei se ficaríamos presos no aeroporto."

O fechamento da fronteira entre a Colômbia e o Brasil acabou com a preparação que já durava mais de um ano, atravessando até os períodos mais difíceis da pandemia. "Minha cabeça ficou a mil. Não estava acreditando. Nunca me senti tão preparado, tão bem fisicamente e mentalmente. Estávamos fazendo uma preparação extraordinária. Tudo estava alinhado, dentro do planejado."

A competição teve início no dia 10 e Abel e seus colegas não puderam tentar a provável vaga no Pan da Juventude. Aos 18 anos, o patinador brasiliense é um dos destaques da modalidade, sendo o primeiro colocado do ranking juvenil tanto nas provas de velocidade quanto nas de fundo. Em sua última competição antes da pandemia, em dezembro de 2019, foi o quarto colocado nos 100 metros no Sul-Americano, em prova que contava também com atletas adultos.

A esperança agora é que a Panam Sports, responsável pela organização do Pan, garanta a vaga aos brasileiros mesmo sem a disputa do qualificatório. "Fomos alijados por uma decisão do governo da Colômbia. Estamos tentando uma gestão interna com a Panam. Pedimos também ajuda ao COB, que nos atendeu", disse ao <b>Estadão</b> o presidente da Confederação Brasileira de Hóquei e Patinação, Moacyr Neuenschwander Junior.

O COB enviou ofício à Panam pedindo uma solução para o caso brasileiro. "O Comitê Olímpico do Brasil monitora a situação das seletivas para os Jogos Pan-americanos Jr. Cali-2021 junto ao Comitê Organizador da competição para que a preparação dos atletas brasileiros e a participação do país no evento não sejam prejudicadas", registrou a entidade, em comunicado enviado à reportagem.

Agora Abel e os demais patinadores brasileiros tentam remarcar suas passagens aéreas possivelmente para a disputa do próprio Pan Júnior, entre 9 e 19 de setembro, caso a demanda brasileira seja atendida pela Panam. A viagem de ida e volta custou R$ 6 mil a cada atleta. Somente Abel teve apoio de patrocinador. Quanto à hospedagem, as reservas foram apenas canceladas, sem maiores prejuízos aos atletas.

Os prejuízos maiores foram os esportivos mesmo. "A preparação precisou ser muito cirúrgica porque o qualificatório passou por quatro adiamentos. Então, tive que manter o foco nos treinos, na alimentação, no sono. Passei quatro meses só treinando em casa por causa da pandemia", lembra o jovem atleta.

O problema enfrentado pela patinação pode se repetir com a equipe brasileira de boliche, que também busca vaga no Pan Júnior. O qualificatório começa no dia 11 de abril, em Cali. Até lá o veto de 30 dias do presidente colombiano a brasileiros já estará encerrado. Mas a preocupação é que o impedimento seja ampliado em razão do número de casos de covid-19 no Brasil, segundo país com mais mortes no mundo e o primeiro da América do Sul, com quase 240 mil óbitos causados pelo coronavírus.

Mesmo que a entrada de brasileiros seja liberada até abril, há o temor de uma quarentena ao desembarcar na Colômbia. "Há o risco de uma imposição de quarentena na chegada. Com os atletas trancados no quarto de hotel por 10 ou 14 dias, vai ser difícil. Vai atrapalhar toda a preparação deles", afirmou Guy Igliori Machado, presidente da Confederação Brasileira de Boliche.

O time de boliche conta com quatro jovens esportistas, entre 15 e 19 anos, sendo dois garotos e duas garotas. O grupo que pretende viajar para a Colômbia tem ainda um técnico e um chefe da delegação. Por precaução, as passagens ainda não foram compradas.

As decisões recentes do governo colombiano também afetaram o levantamento de peso. O Pré-Olímpico da modalidade seria disputado em Cali em março, porém foi adiado. A federação colombiana cogita sediar a competição classificatória para a Olimpíada de Tóquio em maio.

As restrições impostas a viajantes brasileiros atrapalhou também os planos da seleção masculina de polo aquático. Ainda em janeiro, a delegação brasileira foi pega de surpresa quando já estava no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, e não pôde embarcar para a Alemanha.

O time nacional faria sua preparação final em solo alemão para a disputa do Pré-Olímpico na Holanda. Mas, para chegar na Europa, teria que passar por Portugal, país que proibiu voos do Brasil. Os portugueses também alegaram preocupação com a nova cepa do coronavírus que circula no País.

A delegação brasileira só conseguiu embarcar para a Europa após atuação do COB e da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA) junto ao governo holandês, que liberou uma carta de entrada para os brasileiros. O grupo embarcou enfim no dia 8, com escala na França, sem poder realizar a pré-temporada na Alemanha, como havia planejado.

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